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<P>Campos de possibilidade, liminaridade e deriva: Trajetórias de adolescentes em conflito </P>
<Part>
<H2>com a lei na Grande Vitória </H2>
<Sect>
<H4>Amílcar Cardoso Vilaça de Freitas </H4>
<P>Professor do IFSul </P>
<P>Neste artigo trabalhamos visões de adolescentes em conflito com a lei sobre as próprias trajetórias. Os relatos foram colhidos em entrevistas em unidades de internação da Grande Vitória. Acreditamos que o período de internação se constitui como um período de liminaridade. Quatro trajetórias são exploradas em detalhe neste texto, com o objetivo de compreender como elas são projetadas. Exploram-se metamorfoses vivenciadas, em meio à situação de deriva, compreendendo as mudanças nos campos de possibilidade. A situação favorece a construção de projetos, mas permite visualizar a interferência de fatores que os jovens não controlam. Palavras-chave: vida no crime, adolescência em conflito com a lei, deriva, campo de possibilidade, liminaridade </P>
<Sect>
<H4>Introdução </H4>
<P>In Fields of Possibility, Liminarity and Drift: Trajectories of Juvenile Delinquents in the Vitória Metropolitan Area, we discuss visions of juvenile delinquents on their own trajectories. The stories were collected in interviews in centers for internment in the Vitória Metropolitan Area. Four trajectories are explored in detail in this paper. The main goal is to comprehend how they make projects for their lives. We believe the situation of internment is one of liminarity. Thus, it is explored the metamorphosis they have lived in a situation of drift, in order to comprehend the fields of possibilities. This situation may help to build projects, but also allows to see the interference of elements that they do not control. Keywords: crime life, juvenile delinquency, drift, fields of possibility, liminarity </P>
<P>Recebido em: 12/04/2018 Aprovado em: 18/10/2018 </P>
<P>
<Figure>
<ImageData></ImageData>
E</Figure>
ste artigo é fruto de uma pesquisa com adolescentes em conflito com a lei, internados na Região Metropolitana da Grande Vitória (RMGV), no Espírito Santo. A pesquisa, na qual foram entrevistados 45 jovens, foi realizada em duas unidades de internação para adolescentes. O objetivo geral da pesquisa foi ouvir relatos dos próprios adolescentes sobre suas perspectivas de vida. Sendo assim, a principal metodologia foi entrevistar os adolescentes. </P>
<P>Ressaltamos que as gerências das unidades de internação foram bastante receptivas à realização da pesquisa. Foi permitido, inclusive, que os pesquisadores acompanhassem o cotidiano dos jovens das unidades nas oficinas e nas atividades de escolarização. </P>
<P>Cabe referir que os envolvidos aceitaram participar da pesquisa por meio de autorização formal. Num primeiro momento, os funcionários das unidades indicaram alguns adolescentes a serem entrevistados. Sendo assim, o primeiro contato que tínhamos com muitos adolescentes era </P>
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<ImageData></ImageData>
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<P>DILEMAS: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social – Rio de Janeiro – Vol. 12 – no 1 – JAN-ABR 2019 – pp. 170-194 </P>
<P>por meio de uma entrevista formal. No entanto, como era possível acompanhar o cotidiano da unidade, passamos também a nos apresentar diretamente aos adolescentes, explicar os propósitos da pesquisa e solicitar uma primeira entrevista. Houve um interlocutor que ouviu falar da pesquisa por outros internos e solicitou, por iniciativa própria, participar da pesquisa e responder à entrevista. </P>
<P>Caso o sujeito envolvido aceitasse participar do trabalho, o pesquisador ficava isolado com o entrevistado, fazendo-lhe as perguntas e, mediante novo consentimento, a conversa era gravada. Poucos se recusaram a participar, embora alguns tenham se recusado a serem gravados. Esse momento constituía-se o primeiro contato entre pesquisador e entrevistados, de forma que o pesquisador pudesse não só apresentar a si e os objetivos da pesquisa, como também colher informações iniciais sobre as trajetórias dos adolescentes. Essas informações eram aprofundadas em conversas posteriores, que, na maioria das vezes, seguiam um roteiro mais informal de conversa e ocorriam enquanto os adolescentes desempenhavam atividades na sua rotina dentro da unidade, como as oficinas de artesanato, as idas à biblioteca ou os momentos de confecção do jornal mural. Dessa forma, poderíamos analisar respostas posteriores, tendo como referência as informações que já haviam sido colhidas inicialmente. </P>
<P>As unidades envolvidas neste trabalho contavam com cerca de cem adolescentes, sendo que uma delas é uma unidade provisória, o que indica que os adolescentes que recebessem a medida de internação seriam transferidos para a outra unidade onde o trabalho de campo também ocorria. Acompanhamos a rotina das duas unidades por um período de dezoito meses, de julho de 2013 a dezembro de 2014. O trabalho de campo na unidade provisória se estendeu apenas em 2013, quando os adolescentes que foram entrevistados ali já haviam sido transferidos para outra unidade. No final de 2014, a maior parte dos entrevistados havia recuperado a liberdade, portanto, a pesquisa foi encerrada. O número de entrevistados limitou-se a 45 por dois motivos: o primeiro é a saturação dos dados, uma vez que as histórias não apresentavam mais novidades; o segundo é o fato de tentar aprofundar conversas e a necessidade de o pesquisador manter em mente, durante o trabalho de campo, uma quantidade de informações sobre cada um dos participantes da pesquisa que pudesse ser novamente discutida. Através dessas técnicas é que se foram constituindo os relatos sobre as trajetórias que aqui apresentamos. </P>
<P>Todos os entrevistados eram do sexo masculino e tinham entre 17 e 21 anos incompletos. Todos eles tinham sido sentenciados a uma medida socioeducativa de internação1, a mais grave medida de responsabilização que pode ser atribuída a um menor de 18 anos de idade. Em geral, eles foram responsabilizados por um roubo ou homicídio. Atos infracionais não-violentos – incluindo o tráfico de drogas – não costumam gerar penas de internação, exceto quando realizados de maneira reincidente. Contudo, os entrevistados estavam articulados com as quadrilhas varejistas de drogas ilícitas em seus bairros de origem e a maioria participava ativamente delas. Todos os entrevistados vinham de bairros populares e morros da RMGV. Suas trajetórias dentro da “vida no crime” já estavam bem consolidadas e, na maioria dos casos, tinham se iniciado entre os 10 e 12 anos de idade. Assim, nas entrevistas, foi possível captar, apesar da pouca idade dos interlocutores, processos avançados de rotulação (BECKER, 2008; CICOUREL, 1995; LEMERT, 1972; MATZA, 1999) criminal. </P>
<P>Para compreendermos a problemática que desejamos desenvolver neste artigo, que envolve as projeções dos adolescentes entrevistados sobre a própria trajetória de vida, remetemos a uma pergunta que compunha o questionário, em especial à resposta de um dos entrevistados. Após ter captado uma primeira versão dessas trajetórias e de algumas das questões que as envolviam, concluíam-se as entrevistas iniciais pedindo que os entrevistados imaginassem a vida perfeita. Tentamos dar o mínimo de pistas sobre quais seriam os critérios para determinar uma vida perfeita, mas depois de aproximadamente 40 minutos de conversa, a inteiração entre pesquisador e entrevistado já estava bastante avançada. De toda forma, por vezes, os adolescentes tinham dúvidas sobre o que seria essa vida. A resposta de um dos adolescentes em particular causou grande impacto: </P>
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<LBody>E me conta aí, se você pudesse escolher uma vida assim pra você, qualquer tipo de vida, como é que ia ser? (Entrevistador) </LBody>
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<LBody>Normal ou uma vida doida? (Entrevistado, Interlocutor 012) </LBody>
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<P>Desejamos chamar atenção para a encruzilhada que esse jovem apresentou para sua própria trajetória de vida, a qual se revelou presente em quase todos os depoimentos. Tomamos essa declaração como ponto de partida para o debate feito nesta publicação, buscando compreender como esses jovens relembram suas trajetórias e projetam seus futuros, em meio a essa separação entre “vida normal” e “vida doida”. </P>
<P>Para compreender melhor essa situação, mobilizamos o conceito de deriva (MATZA, 1999). Apontamos que esses adolescentes, tanto pela entrada na vida adulta, como pela privação de liberdade temporária, encontram-se em uma situação de liminaridade (VAN GENNEP, 1978; VARGAS, 1997) e explicam, mediante novas percepções sobre os campos de possibilidade (VELHO, 1994) que se apresentam a eles, as metamorfoses (Idem) que experimentaram e aquelas pelas quais ainda podem passar. Vamos explicar esses conceitos e suas possíveis aproximações na seção seguinte. Argumentamos que a liminaridade da situação permite reflexão para a elaboração de projetos, mas permite ainda contemplar fatores que fogem ao controle desses jovens e que podem interferir em suas trajetórias, dada a situação de deriva. Além disso, essa liminaridade possibilita projetar tanto a “vida normal” como a “vida doida”, permitindo uma reflexão maior sobre o estado de deriva, como também indica as dificuldades em controlar suas trajetórias ou em obter os direcionamentos esperados. </P>
<P>Teoricamente, propomos que podemos analisar melhor esses relatos se nos valermos de aproximações entre alguns conceitos. Logo, a articulação de conceitos como deriva, campo de possibilidades, liminaridade e projeto é central para a compreensão dessas questões. A deriva ajuda a explicar os diferentes polos que se encarnam na ideia de “vida normal”, de um lado, e “vida doida”, do outro, e conforma a maneira que se vê seu campo de possibilidades de ação. A situação de liminaridade – proporcionada pela situação de internação, como explicaremos abaixo </P>
<P>– leva a uma situação particular de projeção, inclusive sobre a situação de deriva. Com esse campo teórico, poderemos chegar à análise das histórias propriamente. </P>
</Sect>
<Sect>
<H4>Liminaridade, deriva e metamorfoses: aproximações teóricas </H4>
<P>Para compreendermos a bifurcação que esse primeiro entrevistado apresentou, acreditamos que as construções teóricas de Gilberto Velho (1994) e David Matza (1999) podem ser de grande valia. Por um lado, Matza apresenta um estágio marcado pela “deriva”, ou seja, situações entre a rotulação como desviante e as práticas dadas como convencionais, um momento no qual a capacidade de projeção ocorre com dificuldade. Velho, por seu turno, investe nas noções de campo de possibilidade e projetos, valorizando as possibilidades de metamorfose entre os papéis sociais. Há uma clara diferença entre as duas propostas: Velho investe muito mais na projeção, na percepção das possibilidades, enquanto Matza apresenta indivíduos mais compelidos pelas forças que o movimentam, à deriva, apesar de acrescentar a construção de “vontade” (will) às trajetórias dos indivíduos. </P>
<P>A priori, o conceito de Matza estaria mais próximo da situação dos adolescentes entrevistados. Esse primeiro entrevistado apresentou duas situações entre as quais ele se encontra. Contudo, não se deixava apenas levar, tampouco apenas reagia às circunstâncias; para elas, apresentou dois possíveis projetos, marcados por dois campos de possibilidades que, para ele, eram distintos: ele poderia seguir a vida “normal” ou a “vida doida”, ou seja, engajar-se no mercado de trabalho formal, por um lado, ou ainda aprofundar sua carreira criminal e gerar novas alternativas dentro dos empreendimentos incrimináveis, por outro. </P>
<P>Nesse sentido, começam a projetar esses mundos. </P>
<P>Velho (1994) apresenta, a partir de Schutz (1979), o conceito de projeto, que seria a conduta organizada para atingir finalidades específicas (VELHO, 1994, p. 32). Nas sociedades complexas, os processos de individuação são de tal maneira fortes que o indivíduo se torna um sujeito que constrói projetos. Para isso, ele organiza as experiências biográficas na memória, de forma que “suas experiências pessoais, seus amores, desejos, sofrimentos, decepções, frustrações, traumas, triunfos, etc. </P>
<P>são os marcos que indicam o sentido de sua singularidade enquanto indivíduo, que é constantemente enfatizada” (Idem, p. 90). Dessa forma, a memória organiza o passado, enquanto os projetos organizam o futuro. Ambos os elementos se constituem com alguma plasticidade, de forma que podem sofrer alterações. Além disso, os projetos estão limitados pelo campo de possibilidades, ou seja, das alternativas dadas no plano sócio-histórico, dentro dos marcos culturais que esse agente possui. </P>
<P>Velho aponta que </P>
<P>na grande metrópole contemporânea, encontramos não só um maior número de papéis e domínios, como evidentes descontinuidades e contradições entre estes. Família, trabalho, religião, lazer, opções políticas, entre outros, configuram um campo de possibilidades em que atores individuais se movem, mais ou menos impelidos ou pressionados, mas com uma gama básica de alternativas e opções (VELHO, 1994, p. 68). </P>
<P>Isso permite que os indivíduos tenham um trânsito entre os papéis, revelando um grande potencial de metamorfose, ou seja, de transformações na trajetória, passando a ocupar novos papéis e posições sociais. </P>
<P>Verificamos, portanto, uma situação de deriva que era de alguma maneira projetada. Nos discursos mais abstratos sobre a “vida doida” alguns fatores se articulam, por serem fatores que levam à “vida no crime”. Dessa forma, a revolta (ZALUAR, 1994), a evasão escolar, a participação no tráfico de drogas, as novas possibilidades de consumo, o dinheiro abundante e gasto de maneira rápida, os “rocks” (festas), as mulheres e a atividade sexual hedonista, a atuação do diabo, tudo isso conforma um conjunto de elementos da vida “doida”. Por outro lado, o mercado formal de trabalho, a atenção à família e a coesão familiar, o casamento, a presença na escola, a abstinência do uso de drogas, a Igreja e a atuação de Deus, se articulam em um outro extremo, de modo a formar uma junção de elementos da vida “normal”. Por operações lógicas, esses elementos são separados em dois extremos, um que permite a “vida no crime” e outro que permite a vida de “trabalhador”. </P>
<P>No caso dos adolescentes em conflito com a lei internados, a sensação é a de que eles precisarão exercer esse potencial de metamorfose assim que recuperarem sua liberdade – ou para a “vida doida”, ou a para a “vida normal”. Contudo, existe um estágio entre esses dois momentos: a deriva (drift), que ajuda a compreender a situação desses adolescentes. Para Matza (1999), os atores não estão nem completamente comprometidos com seus atos, nem podem escolhê-los livremente. Dentro da ideia de deriva, Matza sugere que algum desespero é possível: a indefinição de estar à deriva pode gerar essa sensação, apontando para uma grande dificuldade de controlar o entorno e o próprio destino. </P>
<P>Sobre a decisão de aprofundar ou não a carreira criminal, Matza trabalha com a ideia de vontade (will), destacando a noção de escolha dos agentes. Queremos aqui destacar também a noção de trajetória: cada um dos adolescentes entrevistados apresentou a própria história, cada uma com nuances e particularidades que as diferenciam das demais e que muitas vezes aparecem como determinantes para explicar o engajamento à carreira criminal, bem como para projetar seu aprofundamento ou seu abandono. </P>
<P>A sensação de deriva vai marcar os depoimentos sobre as trajetórias. Ainda assim, é possível buscar o controle sobre o próprio destino nas projeções, mesmo dentro do “mundo do crime”, na busca por controlar a deriva. Nas memórias sobre as trajetórias individuais, as diferenciações que discursivamente aparecem tão marcadas entre “vida normal” e “vida doida” se mostram muito mais porosas do que nas projeções, as possibilidades de transição entre esses mundos se apresentam em muitos momentos e vários dos momentos de uma e de outra aparecem articulados. Contudo, essa articulação entre papéis contraditórios será sempre tensa e difícil. </P>
<P>Ao mesmo tempo, quando apresentam suas trajetórias, fatores que antes apareciam como antagônicos e opostos podem ser vistos lado a lado. A ideia de deriva apresentada por Matza (1999) serve para compreender como esses fatores puderam operar: muitas vezes os conjuntos de fatores apresentados como opostos se misturam, se intercalam, apesar de se manterem idealmente contrários. Isso vai exigir operações de transição entre esses diferentes mundos sociais, o que ajuda a desenvolver o potencial de metamorfose desses indivíduos (VELHO, 1994, p. 58). </P>
<P>Porém, o momento específico da internação para adolescentes ajuda a refletir sobre os campos de possibilidade. Nesse sentido, além dessa situação de indefinição entre os dois estilos de vida, destacamos a noção de liminaridade (VAN GENNEP, 1978; VARGAS, 1997), que vai também aumentar a sensação de estar entre posições para eles. É importante termos em mente a noção de suspensão que a privação de liberdade causa na vida desses atores: por mais tempo que se possa passar numa instituição como essa, jamais será uma moradia definitiva3 . Joana Domingues Vargas (1997) já havia utilizado a noção de liminaridade para pensar as condições de presos provisórios, que ainda não tenham sua situação definida perante a justiça. Do mesmo modo, para adolescentes em conflito com a lei, que estão responsabilizados por um ato infracional análogo a um crime, mas que oficialmente não cometeram um crime, e que estão internados por um período máximo de três anos, essa sensação de estar numa situação-limite com a lei e a transitoriedade da condição pode ser ainda mais forte. Eles se encontram em um lugar provisório e suas vidas parecem suspensas; seus projetos serão retomados apenas quando eles saírem desses locais, em condições que não sabem exatamente quais serão. </P>
<P>Mais uma questão que aponta para a liminaridade é o fato de que a maioria dos entrevistados já tenha completado 18 anos de idade. Contudo, uma vez internados em uma unidade socioeducativa, eles ainda são tratados como adolescentes. Os que já completaram 18 anos sabem que essa será a última vez que serão tratados como adolescentes, sendo que em determinadas situações dentro da unidade eles podem ser tratados como adultos. Por exemplo, podem ser responsabilizados criminalmente por um ato realizado dentro da unidade. Mesmo para aqueles que ainda não tinham atingido a maioridade, ela se encontrava bastante próxima. Eles sabiam que, muito em breve, serão oficialmente adultos e terão de arcar com todas as consequências do fato. Contudo, à medida que forem saindo desse estágio de suspensão, eles estarão desenhando para si um caminho e fazendo suas escolhas. Por ora, eles se apresentam como indivíduos em transição constante e as situações de liminaridade (a privação de liberdade e o fim da adolescência) fazem com que percebam as situações contraditórias e conflituosas como dramáticas. </P>
<P>É importante aqui destacar o papel que a medida socioeducativa desempenha para os jovens, diante da situação institucional na qual eles se encontravam. Um dos documentos oficiais que norteia a política pública de socioeducação estadual, o Projeto Político Pedagógico Institucional (PPPI) do Instituto de Atendimento Socioeducativo do Espírito Santo (Iases), define que “a socioeducação precisa então ser entendida como um processo de construção, ou reconstrução, de projetos de vida reais e possíveis de serem realizados, que alterem rotas de vida, desatrelando-os da prática de atos infracionais” (IASES, 2014, p. 41). Ademais, durante a internação, a unidade precisa estabelecer um padrão de controle sobre os adolescentes, em busca da manutenção da ordem, que mesclará diferentes técnicas de dominação, envolvendo desde o convencimento até a submissão física, passando por complexas técnicas de negociação. </P>
<P>A forma de negociar o “respeito” nas unidades socioeducativas, à época da pesquisa, dependia do cumprimento de uma série de “procedimentos”, articulando rotinas de atividades – e a permissão ou não para participar delas –, incluindo atividades externas, o progresso e o regresso no programa de “fases” da unidade. As cinco fases – inicial, intermediária, intermediária avançada, conclusiva e conclusiva avançada – significavam, dentro da unidade, um sistema de classificação baseado na análise do comportamento do adolescente durante a medida socioeducativa de internação. Além disso, e talvez como moeda de troca mais importante, os jovens sabem que o bom comportamento dentro da unidade e o progresso das fases gera um relatório que sugere ao juiz a extinção da medida de internação ou sua progressão para uma medida em meio aberto. </P>
<P>Encontramos, assim, muito do que pode ser descrito como técnicas disciplinares descritas por Michel Foucault em Vigiar e punir (1991). Há uma manipulação calculada dos elementos dos corpos, como afirma Foucault, que pudemos presenciar em muitos momentos dentro da unidade; para cada adolescente havia uma jornada descrevendo suas atividades diárias, além de um relatório e um Plano Individual de Atendimento (PIA). Cada um deles estava sendo avaliado, individualmente, por algum servidor do Estado que tivesse em contato com eles. </P>
<P>Isso levava a uma transformação também com relação ao discurso sobre os projetos, que precisavam, em meio a essa situação institucional, contemplar a ideia de “mudança de vida”. O ideal de responsabilização é muito forte nas unidades socioeducativas, o que obriga os jovens internados a apresentarem algum discurso que indique um caminho para se tornarem um “novo homem”. Se falhassem nesse aspecto, teriam uma série de dificuldades adicionais: não avançariam de fase, não receberiam bons relatórios – o que diminui consideravelmente as chances de receber um alvará mais brevemente – e também teriam dificuldade de dialogar com as pessoas que organizam a instituição que tutela todos os aspectos de sua vida. Logo, construir um discurso sobre “mudança de vida” era uma necessidade institucional. Portanto, a maioria absoluta dos adolescentes tinha um discurso sobre abandono da “vida no crime” para oferecer, ainda que pouco elaborado, incongruente e/ou dissimulado. Somente assim seria possível apresentá-lo de uma maneira que evitasse o confronto ou a falta de comunicação com a equipe de técnicos que gere a unidade. </P>
<P>Ocorria, contudo, também o efeito contrário. A reflexão, nessa situação de deriva e liminaridade, poderia igualmente propiciar a chance de pensar o desenvolvimento da carreira criminal – incluindo pensar sobre possibilidades de escapar de ataques violentos ou do encarceramento e sobre as chances de subir na hierarquia local das quadrilhas de tráfico de drogas ou, ainda, sobre como praticar atividades incrimináveis de maneiras mais rentáveis. A deriva, uma fase normalmente pouco projetada entre a “vida normal” e a “vida doida”, passa assim também a ser planejada. </P>
<P>Para maior compreensão das questões que buscamos debater, vamos apresentar quatro depoimentos que retratam histórias de entrada e de confirmação da carreira criminal. Mais do que ver os fatores que atuaram isoladamente, pretendemos vê-los em conjunto. Desse modo, eles poderão ser apreciados em sua dinâmica. </P>
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<H4>Quatro trajetórias criminais </H4>
<P>A primeira história que apresentamos é a de um adolescente (interlocutor 02) que dizia que a madrasta o surrava porque tinha ouvido que ele estava no “movimento”4, sendo que ele ainda não estava. Era um caso em que o processo de rotulação havia começado antes mesmo da prática de um ato incriminável. A má relação com a madrasta o fez retornar para a casa da mãe, até que ele iniciou o próprio núcleo familiar. Foi no bairro em que morava com a mãe que ele começou seu engajamento no tráfico local. Quando foi apreendido, ele tinha um filho e sua relação com a esposa também não vinha bem. </P>
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<LBody>E sua vida mudou muito depois que se envolveu? (Entrevistador) </LBody>
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<LBody>Um tempo mudou, depois foi piorando. No crime, uma hora ‘tá bom, uma hora ‘tá ruim... É assim; tem hora que você ‘tá lá em cima outra hora você ‘tá lá em baixo. Igual agora eu ‘tô aqui, é foda. Eu ‘tava </LBody>
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<LI>tranquilo, eu era amado e agora eu só tenho minha mãe e Deus, Deus em primeiro lugar e a minha mãe. É foda, mas também já tive vários momentos bons, momentos ruins. Um desses momentos ruins é esse que eu ‘tô passando aqui agora. (Entrevistado) </LI>
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<LBody>Como era o momento bom? (Entrevistador) </LBody>
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<LBody>Momento bom você lá daquele jeito, do dinheiro, comprando o que você quer, fazendo o que você quer... É foda. Mas se Deus quiser eu vou ficar tranquilo agora quando eu sair. (Entrevistado) </LBody>
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<LBody>Você acha que ficou mais agressivo quando você ‘tava no mundo do crime ou não? (Entrevistador) </LBody>
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<LBody>Rapaz, a gente fica, porque as pessoas que ‘tá do seu lado que... Muitas das vezes você não faz as coisas porque você quer, por causa das pessoas que ‘tá do seu lado fala: “ó, pra mostrar que você ‘tá com nós, você vai ter que matar fulano, vai ter que matar ciclano, vai ter que fazer isso aí...”. É a hora que você pensa que você deixou-se levar, matou um, matou dois, três e vai indo. Mas isso depende de você. Eu mesmo graças a Deus nunca matei ninguém, já tentei e não consegui, graças a Deus, e também não tenho vontade de matar ninguém não. Ficar tranquilo porque quem com ferro fere, com ferro será ferido. Vou ficar tranquilo. (Entrevistado, Interlocutor 02) </LBody>
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<P>A relação que esse adolescente estabeleceu, nesse depoimento e em outros momentos, entre escolha e obrigação, foi sempre bastante ambígua e chama muito a atenção. Ele tenta conjugar pressão dos colegas por um determinado padrão de conduta e escolha individual. A capacidade de metamorfose teve de ser muito mobilizada em termos de discurso por esse entrevistado, não só porque ele oscilava entre o que o campo de possibilidades colocava como obrigação para ele e entre o que ele apontava como vontade, mas também porque ele mesmo apresentava vontades que poderiam ser vistas como contraditórias, mediante a situação de deriva. Apesar de não apresentar o desejo de matar alguém, ele estava respondendo oficialmente por uma tentativa de homicídio, que ele atribui a necessidades de proteção do grupo. Em outra ocasião, perguntamos sobre uma possível saída da vida no crime: </P>
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<LBody>Pô, ‘tava mais tranquilo, mas o que aconteceu é que é foda, a gente começa a fazer umas coisas e depois a gente quer ficar tranquilo, mas é tarde. Foi o que aconteceu, eu ‘tava pegando os caras, fazendo um montão de coisa, vendendo droga, tentando matar os outros. Aí depois quando eu fui parar pra pensar que o que eu ‘tava fazendo era errado já era tarde; aí foi a hora que eu vim preso. Eu ‘tava querendo parar já, aí eu peguei e vim preso. (Entrevistado) </LBody>
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<LBody>Você acha difícil o cara parar? (Entrevistador) </LBody>
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<LBody>Não é não, para se ele quiser; é igual tem gente que fala: “ah se você começar a usar droga você não consegue parar mais” – mentira! Você para se você quiser, depende de você: “[se eu disser que] vou parar, eu vou parar”. Igual eu cheirava pó, não cheiro, maconha eu fumo. Maconha eu falo no meu caso que pra mim não é fácil parar não, agora o pó é fácil. Eu cheirava e ficava dois, três dias virado cheirando e parei. Droga é fácil você parar, basta você querer. (Entrevistado, Interlocutor 02) </LBody>
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<P>Nesse momento, quando analisa suas metamorfoses, a noção de vontade é determinante para ele, mas se constitui em meio a obstáculos e a possibilidades. Para esse adolescente, eram também problemáticas sua relação com sua companheira e com seu pai. Em uma segunda conversa que tivemos com ele, o jovem voltou a reclamar das relações: o pai não o visitava e a esposa não se comportava da maneira como ele gostaria. Ofereceu a ela o término da relação, mas ela prometeu rever sua conduta e passou a morar com a mãe do interno. O término seria particularmente problemático porque eles têm um filho e o acesso à criança se tornaria mais difícil para ele caso se separassem, ao menos durante o período de sua internação. </P>
<P>Durante nosso período de convivência na unidade, pudemos perceber que o jovem em questão gozava de prestígio entre os colegas: ele ocupava uma posição de destaque na hierarquia do tráfico de seu bairro e sua relação com os demais lhe conferiu uma posição de respeito nas unidades. Em uma nova conversa, ele expôs um pouco mais sua rotina antes de ser apreendido. Ele diz que não poderia abandonar o tráfico na sua rua, pois estava “segurando o negócio” para o “patrão” (chefe da quadrilha local de tráfico), que estava preso. Havia um grande compromisso com as posições assumidas: ele não poderia deixar seu “patrão” desamparado nesse momento. Além do mais, ele também tinha muitos inimigos e estava “famoso” no bairro, logo não podia circular livremente. </P>
<P>Pode-se ver aqui como o campo de possibilidades desse jovem se mostra bastante atrelado a suas posições na “vida do crime”. A passagem por esse mundo5 afetava suas possibilidades de transição para outros mundos de sua vida: ele havia feito inimigos, alguns dos quais já havia tentado matar, ele sentia necessidade de manter-se leal ao seu “patrão” e à sua quadrilha. Ao mesmo tempo, buscava alternativa para ocupar os papéis familiares de pai, de marido e de filho, precisando assim passar por metamorfoses tensas e complexas. </P>
<P>Em outro momento, o interno declara-se arrependido de não ter de fato conseguido matar o oponente. Completou dizendo que ainda sente muito ódio dele e que, já que acabou preso, era melhor que seu inimigo tivesse acabado morto. Ainda assim, ele afirmou procurar uma saída da “vida no crime”, especialmente pela via religiosa. Seu discurso religioso foi invariavelmente forte em todas as conversas e pareceu-nos que fazia parte de suas reflexões. Perguntamos se os inimigos não iriam atacá-lo caso estivesse circulando desarmado por seu bairro. Em resposta, o jovem referiu que, se estivesse na bênção, não “ligaria” de morrer. </P>
<P>Quando manipulam discursivamente elementos que são idealmente separados, o discurso pode apresentar grande nível de contradição aparente. Em outras palavras, é complexo compreender discursos que passam muito rapidamente da busca pela “obra de Deus na vida” para </P>
<P>o desejo de assassinar alguém. César Pinheiro Teixeira (2011) demonstra como é possível que a religiosidade (especialmente pentecostal) dê vazão ao potencial de metamorfose na formação de “ex-bandidos”. Por outro lado, Cristina Vital da Cunha (2014) aponta para as possíveis transições entre as posições de “traficante” e de “evangélico”. Ainda que consiga organizar sua religiosidade e sua carreira criminal em seu mapa mental, isso pode trazer problemas, uma vez que esse tipo de contradição aparente pode ser utilizado para aprofundar a rotulação sobre o adolescente: em outras palavras, enquanto não puder dar provas de que abandonou completamente as práticas incrimináveis e tudo associado a elas, ele será tido como “bandido”. Mesmo que reforce seu discurso religioso, ele pode ser dado como alguém que “está se escondendo atrás da Bíblia”. Isso os remete à negociação da realidade, que é realizada não somente pelo indivíduo, mas também por aqueles que com ele interagem. Campos de possibilidades, portanto, não se definem isoladamente. </P>
<P>Essa condição tende a forçar o adolescente a fazer escolhas, especialmente quando ele sair da unidade socioeducativa. Além disso, existem fatores que ele não controla – como se a “guerra” entre seu “bonde” (quadrilha) e os “bondes” inimigos vai se tornar mais ou menos intensa até sua soltura, o que é especialmente dramático para esse entrevistado, que, como já dissemos, tem como possibilidade ser alvejado – e fatores que ele não sabe como se desenvolverão – como, por exemplo, a harmonia de seu casamento. Nesse momento, ele se vê entre inúmeras possibilidades e sua atuação será o resultado de como esses fatores serão futuramente articulados em sua trajetória. A liminaridade de sua situação induz que ele reflita sobre esses fatores e construa projetos de metamorfose nessa situação de deriva. </P>
<P>O segundo depoimento que aqui separamos aponta claramente para a influência de grupos de referência (DOWDNEY, 2003). Com a perda dos pais, tem como referência apenas os irmãos: de um lado a irmã que tentava organizar a família, de outro os irmãos envolvidos na vida do crime: </P>
<P>– Pô, minha infância foi na Bahia, foi um pouco sofrido, passei lá necessidade e umas parada aí. Sei lá, minha família foi um pouco difícil, perdi minha mãe [quando] eu tinha cinco anos, perdi meu pai [quando] eu tinha oito anos de idade. Depois disso daí eu fui crescendo... Minha irmã... não foi nem procurar um colo de conselho, de criação não, foi ter essa vida não. Minha irmã sempre ‘tava ali presente, me mandando pra escola, me ensinando o melhor. Só que teve uma hora que vi que não queria aquilo. Fui se envolver e se envolvi. Conhecia já, meus irmãos já eram envolvidos já, conhecia os cara tudo. Me envolvi pra ver como que é, via todo mundo com dinheiro e eu duro, e aí só o ódio já... Comecei a ganhar dinheiro e também gostei, resultou que depois de um ano e pouco fui preso, saí, fui preso de novo, aí tomei internação. (Interlocutor 03) </P>
<P>Muitos adolescentes entrevistados passavam a impressão de que quanto maior for a presença dos pais, maior será a sensação de disciplina; eles apresentam essa presença, portanto, como um fator que influencia fortemente no campo de possibilidades. A perda dos pais é sempre apresentada como um fator de revolta. Nesse sentido, ela se aproxima muito das reclamações com relação à pobreza, até por ser uma condição sobre a qual não se pode interferir durante a infância. Por outro lado, apontamos também que as famílias podem apresentar outros membros envolvidos no “mundo do crime” e as referências constituídas pela família e pelo grupo de amigos são sempre apresentadas como um fator de influência no engajamento nas carreiras criminais. </P>
<P>Para o adolescente em questão, fica claro que definições nos dois sentidos se apresentaram dentro do grupo de referência familiar: a irmã era a referência de definições favoráveis à “vida normal” (“ensinando o melhor”), enquanto os irmãos (“já envolvidos”) eram referências que facilitavam a participação no “mundo do crime”. Sendo assim, a transição entre posições destaca-se na experiência do jovem, além da possibilidade de construir projetos, apesar dos constrangimentos. Em outro trecho de nossa conversa, ele destacou: </P>
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<Lbl>– </Lbl>
<LBody>Não adianta falar pra você que eu me arrependo, se eu... Eu sei que não arrependo. (Entrevistado) </LBody>
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<Lbl>– </Lbl>
<LBody>Ah, falar a verdade, né. (Entrevistador) </LBody>
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<LI>
<Lbl>– </Lbl>
<LBody>Eu falo a verdade, não me arrependo não. Falar a verdade... Pessoa que se arrepende do que faz é aquelas pessoas que não têm ciência, que têm mente fraca, que não sabe que que faz. Eu entrei nessa vida eu sei por causa de que eu entrei, eu sabia desde um momento já... Minha irmã sempre me falava – eu sempre fui criado com a minha irmã – que ou era cadeia, ou morte, ou cadeira de rodas, que quando você ‘tá na troca de tiros você não sabe onde a bala vai te acertar, a bala pode te acertar na espinha, pode acertar num lugar fatal e você pode ou morrer, ou ficar de cadeira de rodas, ou ficar todo costurado né. Como já tinha, tinha ciência disso tudo aí já... Mas eu quis mesmo assim. (Entrevistado, Interlocutor 03) </LBody>
</LI>
</L>
<P>Segundo Matza (1999), uma subcultura pode facilitar a prática de atos incrimináveis, mas não os torna obrigatórios. É preciso que o praticante escolha por elas, ou seja, que elabore seus projetos, sem perder de vista as noções de associação diferencial ou de grupos de influências. O plano de aprofundar-se em carreiras criminais também depende de como esses fatores vão se desenvolver. Apesar de a “vontade” ser um elemento sempre destacado pelos jovens, eles sabem que essa não é a única condição que permite o desenvolvimento de uma carreira criminal. Além disso, o interno não tem exata noção de como tais fatores se modificaram durante o período de sua internação: </P>
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<LI>
<Lbl>– </Lbl>
<LBody>Pô, como é que vai ser? Nem eu não sei como é que vai ser. Quando eu fugi achei que ia ser uma coisa, ‘tava há um ano e dois meses já, achei que ia ser uma coisa, que eu ia chegar, que ia voltar lá pra favela, todo mundo já me conhecia, ia lembrar de mim, ia ser aquilo... Todo mundo... Acabou que foi outra coisa, fugi, fiquei quase três meses só dentro de casa, só escondido, foi um bagulho mó diferente do que eu... Voltei lá pro bairro, onde quando eu era mais novo eu conhecia os cara, muitos já tinha morrido, já ‘tava </LBody>
</LI>
<LI>muita coisa diferente, os cara já eram outros donos, já... Mas mudou aquilo que eu conheci porque foi... Sei lá, vai ser um bagulho doido, nem sei como vai ser não. (Entrevistado) </LI>
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<LI>
<Lbl>– </Lbl>
<LBody>Depende de quem você encontrar lá, né? (Entrevistador) </LBody>
</LI>
<LI>
<Lbl>– </Lbl>
<LBody>Depende de quem eu encontrar, né, véi. E se eu vou voltar pra essa vida aí, né véi. (Entrevistado, Interlocutor 03) </LBody>
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<P>Para esse entrevistado, a posição dos irmãos na quadrilha local era bastante importante, determinando seu campo de possibilidades. Ele dificilmente poderia deixar de apoiá-los caso se envolvessem em um conflito violento; por outro lado, teria dificuldades em participar da quadrilha local de traficantes se, por algum motivo (morte, prisão, abandono da carreira criminal, etc.), seus irmãos ou amigos mais próximos estivessem ausentes. A experiência de passar por uma internação e recuperar a liberdade alterou a forma como esse adolescente projeta sua situação de deriva. Em uma primeira situação de liminaridade dada pela privação de liberdade, ele fez uma projeção sobre sua atuação para quando saísse, que não se confirmaria na prática: seu campo de possibilidades foi alterado por sua situação legal (ele estava foragido) e porque muitos de seus comparsas mais íntimos não estavam mais na quadrilha. </P>
<P>Nosso próximo entrevistado dá outras pistas de como essa questão pode ser pensada. Ao contrário do entrevistado anterior, ele foi criado por ambos os pais, mas se queixa do divórcio dos dois. Porém, ele não assume responsabilidade da mesma maneira como o interlocutor anterior. Isso não significa que ele transmita essa responsabilidade a outrem, mas que ele observa a situação como uma maneira muito mais fortuita do que ela foi apontada pelos demais: </P>
<P>– Minha história de vida é meio longa. Triste. No começo eu era um aluno bom, um dos meninos mais bons da família, não tem? Nunca tinha se envolvido ni crime nem nada. Cheguei até o primeiro ano na rua. Fiz até o primeiro ano [do ensino médio] na rua. Aí depois disso... A minha família era crente, todo mundo era crente, nós, aí começou a desandar, não tem? Minha mãe separou do meu pai, eu comecei a conhecer, juntar com uns amigos do crime, não tem? Eles oferecia droga, eu ia e usava, aí eles me ofereceram muito dinheiro, muito rápido assim, não tem? Aí eles me chamou, eu não ia... Aí certo dia de tanto eles ficar me chamando, por impulso, eu vi que dava muita mulher, fama, dinheiro, não tem? Aí, poxa, eu experimentei a droga uma vez, aí acabei gostando, aí comecei secretamente a ir usando, não tem? Aí em certo momento jogaram uma carga na minha mão, não tem? De droga. Aí eu fui vendendo, fui ganhando dinheiro, fui gostando mais ainda, fui vendendo mais e mais e mais, aí se tornei um dos traficantes lá da boca, não tem? (Interlocutor 04, grifo nosso) </P>
<P>Ele destaca fatores pré-existentes: o tráfico de drogas em sua região é bastante anterior a seu engajamento e talvez até seja anterior ao seu nascimento. Contudo, enquanto ele permaneceu </P>
<P>com um núcleo familiar mais coeso, sentia que não havia qualquer necessidade de iniciar uma carreira criminal. Seu grupo de referência eram amigos que o chamavam para consumir maconha e apontavam a oportunidades de ganhar dinheiro “fácil”. </P>
<P>Quando analisamos as trajetórias desses adolescentes, é bastante difícil ignorar as condições ambientais dos bairros onde cresceram. A relação entre o ambiente dos bairros e a criminalidade, proposta originalmente por Shaw e McKay (1942), ganha relevância quando se percebe que, em geral, as possibilidades de se engajar na “vida do crime” estão muito mais abundantes nos bairros em que a população mais pobre habita. A concentração de desvantagens, como a pobreza e a dificuldade de acesso à educação e à saúde, facilita a formação de linhas de conduta não convencionais, que podem ser adotadas como forma de conseguir vantagens competitivas em meio a um ambiente hostil (ZILLI DO NASCIMENTO, 2011). </P>
<P>Cada trajetória individual, entretanto, vai conjugar um sem-número de possibilidades e idiossincrasias. Ainda assim, observar como os mais distintos fatores foram sendo conectados nos relatos dos adolescentes pode servir para compreender, de maneira geral, como eles podem ser articulados e como tendem a interferir um no outro. Apesar de cada trajetória ser única, o campo de possibilidades que as conforma tem muitos elementos em comum. A liminaridade da situação biográfica determinada induz a uma reflexão maior sobre a trajetória vivenciada. Para esse entrevistado, a memória sobre sua trajetória apresentada força dois pontos: a separação dos pais e sua “impulsividade”. </P>
<P>Quanto à referência da família desfeita, pode-se argumentar que se os pais tivessem se separado apenas após ele ter se tornado adulto, ou se jamais tivessem se separado, esse seria um fator a menos. É bastante complexo saber a exata interferência desse tipo de fator, embora todos os entrevistados que eram filhos de pais separados, ou de pais mortos, ou de pais que não os criaram por algum outro motivo, se queixavam e elaboraram seus relatos de vida a partir dessa perspectiva. Destacamos que outros entrevistados narraram ter sido criados pelos pais que permaneceram casados, mas que se afastaram com o passar do tempo. Sendo assim, tal afastamento dos pais é um fator que parece acentuar os sentimentos de revolta, assim como a pobreza. Somando-se a isso o fato de a quadrilha distribuidora de droga a varejo na maioria dos bairros ser um fator pré-existente, a sensação de revolta pode aumentar as possibilidades de começar um envolvimento. </P>
<P>Já com relação à “impulsividade”, trata-se de um processo mental de decisão, de uma forma de organizar a própria biografia. Esse adolescente disse que agiu de maneira impulsiva, enquanto </P>
<P>o entrevistado anterior assume uma posição mais consciente dos fatos. Podemos destacar a sensação de deriva, uma vez que os referenciais da vida convencional ou “normal” não foram completamente abandonados, o que leva à necessidade de justificar o engajamento na “vida doida”. Desse modo, o pedido para contar a própria história e o próprio engajamento criminal que se fazia, de certa forma já levava os adolescentes a produzirem um account, como elaboraram Scott e Lyman (2008): trata-se da explicação de algo que não aconteceu da forma como deveria, precisando ser justificado. Isso não impediu que alguns assumissem plena responsabilidade pelo acontecido, ainda que a presença de fatores que não se controlam acentue a sensação de deriva. </P>
<P>Desejamos também chamar a atenção para o fato de uma carreira criminal não se constituir de maneira isolada. É preciso que eles sejam dados como desviantes. Isso impede que eles se definam em seus próprios termos, uma vez que se trata de um processo de negociação da realidade, que não se define isoladamente. Ressalta-se aqui a ideia de Howard Becker (2008) de que o desviante é visto como alguém que transgride regras importantes e que, portanto, é tido como fundamentalmente diferente dos demais membros dessa sociedade. O que pretendemos apontar aqui é que, independentemente de ter sido um ato mais consciente ou mais impulsivo, o indivíduo tende a ser qualificado como um desviante – no caso específico, como “bandido” ou “vagabundo”. Logo, se o comprometimento e a lealdade com grupos de pares delinquentes podem levar à prática de delitos, esta pode levar ao aprofundamento das relações com pares delinquentes, uma vez que será tido como alguém diferente. Continuando a fala do mesmo adolescente, vamos apresentar como ele narrou esse processo de rotulação: </P>
<P>– Poxa, eu dava de tudo, meu potencial todo pra mim estudar. Até na metade do ano, não tem? Cheguei a estudar. Aí, até então, lá dentro mesmo, os moleques usavam droga dentro da própria escola. Me chamaram pra usar, eu não usei dentro da escola, porque eu vi o bicho [tinha receio], não tem?, de alguém me ‘caguetar’ pra minha mãe. Aí eu saía, chegava no final, nas duas últimas aulas, não tem?, depois do recreio? Eu não voltava. Depois não voltava mais. Eu saía, eu pulava o muro, porque o muro era pequeno, não tem? Os professor falava: “Vocês tão aqui pra nós ensinar vocês. Quem não quiser estudar, a porta tá aberta. Se vocês quiser ir embora, pode ir pra onde ‘cês quiser, faz o que vocês quiser. Nós ‘tamo aqui pra te ensinar, se vocês quiser permanecer ‘cês fica. Nós vamos ensinar o aprendizado pra vocês se tornar uma pessoa melhor, um advogado, quem vocês quiser se tornar, pode se tornar, pode até fazer faculdade”. Tá tranquilo então, tranquilo você estudar, você aprendia. Comecei a pular o muro, aí usei droga, comecei a usar droga dentro da escola, conheci um monte de menina que usava também, não tem? Comecei a se tornar popular dentro da escola, que eu não era reconhecido [antes], não tem? Popular, comecei a pagar de pá, tirar onda dentro da escola, comecei a vender droga dentro do cotidiano da escola, comecei a tirar onda, pá, cordãozão de prata, pá, monte de anel, aqueles bonés da Cyclone, de Kenner [chinelo]. Daquele jeito, queimadão, como bandido mesmo, indo pra escola. Aí, até então, comecei a ver já os inimigo que têm já perto da escola, não tem? Aí eu: “tá doido?” Aí ficou mandado [ruim]. Abandonei a escola, esqueci foi de tudo, não queria estudar mais, só de ficar nessa vida doida mesmo. A partir de então, depois que eu conheci essa vida. É foda. (Interlocutor 04) </P>
<P>Podemos ver como a relação com os amigos “envolvidos” aumentou bastante depois que ele começou também a se “envolver”. No início ele tinha medo (“via o bicho”) de alguém contar para sua mãe que ele estava fumando maconha. Ele encontrou professores que lhe deram a opção de não ficar em sala de aula e, aos poucos, foi se enturmando com os outros alunos que saíam da escola durante o horário letivo para consumir drogas. Nesse sentido, a prática fortaleceu também essas relações. Porém, ele “ganhou fama”. </P>
<P>Dessa forma, ele ressalta um lado importante da subcultura: existem formas de agir, de falar, de se portar que servem para identificar um “bandido”. Os chinelos, as roupas, os cordões, os bonés, mas também o linguajar e o uso de drogas ilícitas (especialmente de maconha) somam-se aos usos da violência e ao engajamento no mercado varejista de drogas para identificar um bandido nos bairros periféricos da RMGV. </P>
<P>Muitos acreditavam não haver razões para serem tão indiscretos como eram antes e desejavam ser mais discretos quando saíssem das unidades, para não facilitar a identificação por parte da polícia. Nos termos deles, era possível ser “menos pichado” ou “deixar de ser pichado”, usando roupas menos chamativas, cordões mais discretos e cortes de cabelo menos ousados. No entanto, a outra forma de se apresentar permitia indicar para seus vizinhos e conhecidos que ele estava engajado no “mundo do crime”. </P>
<P>É interessante notar como essa negociação e definição da realidade advindas do engajamento na vida no crime se mostram, aos interlocutores, como algo que modifica drasticamente seus campos de possibilidade. A possibilidade de ganhar quantias de dinheiro muito maiores, o uso de drogas e o consumo de produtos da moda potencializavam-se de uma maneira que lhes parecia impossível sem esse engajamento. Por outro lado, a presença na escola se mostra como algo impossível, mediante as inimizades e a chance de ser alvejado. Esse processo não é algo que ele controle unilateralmente: uma vez “pichado”, ele abre a possibilidade de que sua identidade pública seja toda atravessada por sua rotulação criminal, num processo que Michel Misse (1999, 2010) chamou de sujeição criminal. A sujeição criminal dificulta sobremaneira que haja transição entre esses mundos, uma vez que a ligação do indivíduo com o “mundo do crime” será lembrada em todos os seus momentos sociais. </P>
<P>Nas unidades socioeducativas, como já apontamos, o processo de reversão da rotulação criminal, chamado de “mudança de vida”, era discutido oficialmente. Logo, o processo de “entrada na vida do crime” era também abordado. O adolescente cujos depoimentos estamos apresentando mostrou uma parte de como era esse tratamento: </P>
<P>– Esses papel que eu ‘tô aqui é tipo que nós ia ser regredido [no programa de fases da unidade], não tem?, aí até então nós se assumimos aê, na questão que nós ia fumar, dentro das nossas ideias. (...) Acabei quase usando, aí nós demos a nossa ideia lá e ela foi e passou esses negócio aqui, não tem? Durante uma semana nós estamos fazendo essa atividade aqui sobre as drogas e o crime: o jeito que você entrou no crime, como é que você se tornou bandido e como é que você virou usuário, não tem?, de drogas. Então, até então esse texto aqui fala umas partes sobre minha vida também, não tem?, porque é desse jeito aí que o moleque entrou no tráfico aí, por causa de amigos, por causa que não tinha dinheiro, por causa de mulher, fama e poder, queria comprar um tênis e não tinha dinheiro, queria comprar uma parada e não tinha dinheiro, foi procurar um serviço e não conseguiu porque era discriminado porque tinha cara de bandido, não tem? Aí foi até então que ele não conseguiu ficar nesse emprego, ficou uma semana, foi despedido, ficou revoltado, “saparada”. (Interlocutor 04) </P>
<P>A privação de liberdade é mais um momento importante na carreira criminal desses adolescentes. Assim que saírem do estágio liminar, terão de conviver com o fato de terem sido oficialmente responsabilizados por um crime. Embora saiam com a “ficha limpa”, ou seja, sem antecedentes criminais registrados, é possível que vizinhos, conhecidos e mesmo policiais saibam de seu histórico. </P>
<P>Em processos de definição negociada da realidade, a rotulação pode ter um peso exagerado. Além disso, isso impede que o indivíduo se defina em seus próprios termos: ao menos, ele terá de negociar essa definição com aqueles com quem convive. A liminaridade o afasta da situação vivenciada e permite refletir sobre a trajetória e projetá-la. Os projetos, contudo, têm de ser pensados mediante campos de possibilidade muito estreitos. O projeto de conduzir uma “vida normal” vai precisar levar em consideração a sujeição criminal e a tentativa de revertê-la. Por outro lado, seguindo a “vida doida”, </P>
<P>o engajamento criminal pode ser pensado como uma alternativa para tentar superar os fatores que geram revolta – como a situação familiar ou a pobreza. </P>
<P>Como já mencionamos no final da primeira entrevista, pedíamos para que cada adolescente esboçasse uma vida, alguma situação que pudesse escolher livremente. Houve majoritariamente dois tipos de resposta: aquelas que focaram em corrigir algo do passado de suas vidas e aqueles que projetaram uma vida futura a partir do que tinham construído até agora. Quando se preocuparam em mudar elementos de seu passado, os adolescentes foram unânimes em dizer que gostariam de ser ricos. Um deles chegou a dizer que “gente rica não vai presa”. Mas a maioria aponta que seria um jeito de superar uma série de dificuldade com relação à sobrevivência e ao consumo. O interlocutor cuja história estamos apresentando formulou a seguinte resposta: </P>
<P>– Uma vida!? Caraca! Rapaz, não tem? Até não sei... Mas se fosse para escolher uma vida, eu ia querer ter uma vida de luxo. Qualquer coisa que quisesse, umas paradas responsa, uma televisão grandona, uma casa de luxo de rico, pá, não tem? Uma piscina grande, pá, um monte de mulher. Dinheiro pra caralho, vida de patrão, assim, não tem? Igual esses caras que fica passando em filme, essas parada assim, famoso, não tem? Pô, não que eu ia querer ser famoso, mas pô, ter um monte de mulher, pá, ter umas mulher assim, umas cinco, quanto mais... Umas cinco, de diferente, não tem? (...) Uma mansão, uns prédios só pra você, não tem? Caraca, um prédio, tá pagando de patrão, pá. Uma Mercedes, uma Ferrari, pá. Daquele jeito. Seguranças... O carro ia ser responsa, o carro. Queria ter uma vida assim. Mas até então... Não que eu sou pobre, não tem? Mas poxa, queria ter uma vida assim, véi. Mas nessa vida aí você pode ter tudo, mas é foda, você não tem nada. A felicidade, pá. Você não tem... Só fica dentro de casa, nessas vidas de rico aí, você não pode ter uma liberdade igual nós. É foda, cara, mas pô, responsa andar numa mansão, fazer os rock, pá, tranquilo, um monte de mulher, gritou [pode apostar], fí. Acho que ia ser responsa [bacana]. As mulher hoje em dia só pensa em dinheiro. Quero ficar logo rico, ter casa. Que nem MC Catra, tá ligado? (Interlocutor 04) </P>
<P>A referência a MC Catra aparece porque esse cantor de funk é famoso por ter várias esposas e algumas dezenas de filhos. Aponta para uma linha de raciocínio segundo a qual para os indivíduos que têm muito dinheiro a vazão dos desejos hedonísticos é sempre permitida, sem que isso crie muitos problemas. Ainda que se trate de uma situação bastante hipotética, permite ver como ele compreendia elementos de sua realidade: consumo e tranquilidade aparecem para ele como opostos, dentro dos campos de possibilidade que ele consegue pensar. Mesmo em sua riqueza imaginária, ter alguma coisa significa ter o que perder: ele sentia que poderia ser vítima de assaltos e que não teria tanto liberdade quanto tinha. Seu caso, porém, é ainda mais dramático: a tentativa de consumir itens de luxo ou de se destacar com as mulheres o levou a perder completamente a liberdade, o que o faz pensar que ser rico seria uma situação mais cômoda, mesmo precisando de “segurança”. </P>
<P>Uma questão central na sensação de deriva era a relação com a família. Em geral, os adolescentes citavam algum tipo de controle sobre eles por parte dos familiares, que caminhava para a interdição de práticas incrimináveis. Embora houvesse casos de pais e de famílias inteiras engajadas no tráfico de drogas, os adolescentes geralmente assumiam responsabilidade por seus engajamentos. Além disso, narraram a interferência principalmente das mães para impedir que eles continuassem nesse caminho, o que se destacou no discurso do próximo internado. É interessante notar que, como adolescentes, os entrevistados se encontravam no estágio de liminaridade entre a infância e a fase adulta, e que o engajamento no tráfico de drogas modificava essa questão. Seria de esperar que adolescentes tivessem de obedecer aos pais, o que não acontecia, pois a aproximação com o mundo das drogas permite a independência financeira e oferece repertórios de violência que podem superar a dependência dos pais. Apresentamos como ele narrou esse processo: </P>
<P>– Tudo começou com eu queria ir numa festa e minha mãe não deixou eu ir, não tem? Aí eu fui escondido e ela falou: “ó, se você pular a janela e for você não precisa vim mais pra casa, você não vai ser meu filho mais”. Aí eu falei: “não, tranquilo”. Fui lá, me arrumei, pulei a janela e meti o pé. Ela falou assim que eu não podia voltar mais pra casa, não tem? Ahn, fiquei na rua. Aí, os moleque me deixou dormir na casa dele, eu dormi. No outro dia, eu fui na pracinha, aí o moleque falou bem assim: “ê, viado, você não quer vender uma droga pra mim não?”. Falei: “ahn, demorou fi, vou vender então”. Ele me deu maconha, aquele monte de carro de maconha. Comecei vender, não tem, eu fui bom naquilo, comecei vender, comecei ganhar dinheiro, aí os, os, os chefão já, já jogaram atividade, não tem? Já me deu mais droga, me deu pedra, maconha, cocaína, me deu arma, aí comecei se levantar, não tem, no crime. Aí minha mãe grudou, não tem? Aí ela foi lá na pracinha, minha mãe, me pegou, não tem?, me falou assim que, que eu ia mudar de lá, que ela não ia querer que o filho dela morresse. Aí falei, ah, então vamo, então, aí eu mudei, entreguei as droga, a arma. Fui lá pra [outro município da RMGV], aí fui lá, fiquei morando lá uns seis mês, fui pra escola, não tem? Fui com um pessoal que ‘tava meio encrenqueiro, aí fui lá, fui expulso da escola, aí fui pra outra escola... Fui pra outra escola, todo dia eu tinha ocorrência, briga, é monte de coisa. Aí fui lá, fui expulso da escola de novo, segunda escola, aí fui lá pra roça morar com meu pai. Fiquei com meu pai também uns mês lá, comecei bagunçar e o moleque me chamou pra vender droga lá também, e eu falei: “vão [vamos] vender então”. Aí eu saí da escola e comecei vender droga. (Interlocutor 05) </P>
<P>Desejamos chamar a atenção não para a insistência desse interlocutor específico contra as tentativas disciplinares de seus pais, mas para o fato de que qualquer fator pode ser utilizado para apresentar uma “revolta”. O que para muitos foi apresentado como a ausência dos pais, neste caso foi justamente a tentativa dos pais de imporem disciplina que causou a revolta inicial. Imaginando que o grupo de pares e a lealdade a ele pode ser importante, os pais o mudaram de município duas vezes, um deles situava-se dentro da RMGV e o outro ficava no interior do Espírito Santo. </P>
<P>Para o adolescente em questão, em cada um dos lugares para o qual ele se mudou, ele fez novas relações de amizade e novamente se engajou no tráfico de drogas. Vale lembrar que o tráfico de drogas é um fator pré-existente aos adolescentes, que pode ser encontrado na maioria dos bairros do estado. Por fim, o adolescente retornou para seu bairro de origem e restabeleceu sua relação com a mãe, que passou a tolerar seu engajamento criminal, embora sem jamais aceitá-lo plenamente. O restante da família, segundo ele, deixou-o à própria sorte. Essa sensação de ruptura fez com que ele se sentisse “disposto a qualquer coisa”, afastando-o da “vida normal” e levando-o a se aprofundar na “vida doida”. Existe uma grande sensação de liberação de desejos de prazer associada à “vida no crime” que também pode ser articulada com a liberação de desejos violentos: </P>
<P>– Olha, antes de eu entrar pro crime, não tem? Tipo como, eu era tranquilo, não tem? Eu era tranquilaço mesmo, gostava de surfar, não tem, gostava de ir na praia, de brincar com os moleques de pique-esconde, de jogar bola, eu gosto de jogar bola, não tem? Tipo como, extrovertido, não tem? Gosto de ficar brincando, rindo... Só que minha mente foi muito pela dos outros, era muito grupinho, o que os outros faziam eu queria fazer também, sempre fui atentado não tem?, atribulado... Mas tinha vez que eu ‘tava tranquilo, tinha vez que eu ‘tava tranquilo, já tinha vez que eu ‘tava bolado, aí é foda, fi. Aí, depois, depois que eu entrei pro crime, mais tipo neurótico mais ainda, não tem? Já não tava mais, aí acabou o negócio de ficar rindo, brincando, aí já andava boladão, mais bolado, tipo, sei lá, não tem, qualquer coisinha pra mim era matar, se eu discutisse com você aqui, se você falasse comigo, eu já ia buscar a peça, já ia desembolar... Se os outros te apadrinhar, você ia ficar vivo, senão virava. Aí, minha mente ‘tava muito atribulada, minha família ‘tava nem aí. Botava a cara não, se eu morresse dava nada. (Interlocutor 05) </P>
<P>Em meio a processos de rotulação que têm efeitos na negociação da realidade, os campos de possibilidade vão se transformando. A capacidade de metamorfose dos indivíduos vai sendo modificada mediante os novos papéis que se apresentam, ao mesmo tempo em que novas situações permitem novos projetos. </P>
</Sect>
<Sect>
<H4>Considerações finais </H4>
<P>Não apontamos nenhum desses quatro casos acima como típicos. Da mesma forma, não desejamos indicar que nenhum deles seja atípico. Os quatro parecem possibilidades de trajetória dentro da “vida no crime” plausíveis para a realidade da RMGV e de outras cidades brasileiras. Muitos dos adolescentes apontam para o que Matza chamou de “will” e o que Velho chamou de “projeto” na construção de suas trajetórias: eles se percebem como membros ativos nesse processo, apesar de saberem que não controlaram ou não controlam a completude de seus elementos. E todos viam que ainda tinham possibilidade de aprofundar ou de reverter suas carreiras criminais – logo, mantinham-se em deriva, entre esses dois mundos. A definição da realidade social, no entanto, acontece de maneira negociada. E quanto mais tempo passar engajado ao tráfico de drogas, mais profunda será a sujeição criminal, que articula suas identidades públicas com a criminalidade e torna progressivamente mais complicado o trânsito entre os papéis e domínios que não estão relacionados com a questão criminal (MISSE, 1999, p. 213). </P>
<P>De qualquer modo, todos os relatos sobre a entrada na carreira criminal descrevem o engajamento em um grupo diferenciado e organizado de criminosos e todos envolveram alguma forma de rotulação, e a memória de ao menos um momento de revolta contra sua situação de vida, seja familiar, seja social. Com o engajamento à vida no crime, segundo os relatos, o campo de possibilidades se alterou drasticamente. E a maioria delas apontou para usos de repertórios de violência bastante enérgicos – como o último entrevistado, muitos sentiam que passaram a se tornar mais agressivos com o envolvimento. Esse conjunto de fatores os levou à sua situação atual, e com base nesse conjunto é que era possível projetar seus futuros após a internação. </P>
<P>Qualquer projeto que advenha dessa construção vai precisar ser suficientemente adaptável para poder lidar com fatores em que a definição da realidade é negociada e com fatores que eles não controlam em sua totalidade – a interação familiar, incluindo a relação com as namoradas, esposas ou companheiras; os processos de rotulação ou de sujeição criminal, por parte de amigos, vizinhos ou forças policiais; os conflitos armados (“guerras”) coletivos ou mesmo individuais, aos quais eles se engajaram, etc. Do contrário, o projeto terá de ser completamente reformulado ou abandonado caso esses elementos não se desenvolvam nem se encaixem da forma como se espera. </P>
<P>Os elementos da “vida normal” (como a participação no mercado de trabalho formal, a escola, a Igreja, a família, etc.) ou os elementos da “vida doida” (o uso de drogas, as práticas criminais, o hedonismo, o consumo desenfreado, etc.) são apresentados em polos opostos, como contraditórios. Logo, os projetos tendem a indicar a busca da superação das liminaridades apresentadas e do estado de deriva; transitar entre o mundo do crime e os demais mundos sociais parece complicado demais. </P>
<P>Entretanto, eram essas transições complexas que esses adolescentes vinham fazendo nos últimos anos de sua vida: os depoimentos apresentam sempre alguns vínculos familiares, ainda com a escola, com a Igreja e com o trabalho formal, que se articularam com a prática de crimes, com o uso de drogas e com o consumo de bens, além da postura corporal e o linguajar que os levaram a ficar “pichados” ou “queimados”. Ainda assim, essas operações passam por lógicas tão complexas que a maioria das projeções tendia a separar projetos para “vida normal” e para a “vida doida”. Voltemos a nosso primeiro interlocutor: </P>
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<LBody>E me conta aí, se você pudesse escolher uma vida assim pra você, qualquer tipo de vida, como é que ia ser? (Entrevistador) </LBody>
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<LBody>Normal ou uma vida doida? (Entrevistado) </LBody>
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<LBody>Vamos a uma de cada vez; primeiro a vida doida, ia ser como? (Entrevistador) </LBody>
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<LBody>Não, eu ia continuar do meu mesmo jeito, entendeu? Eu ia sair daqui, ia ficar mais ciente, ia se mudar de lugar onde que a [polícia] civil sabe que eu moro, entendeu? Ia prum lugar mais longe, eu ia pra roça, primeiramente pra casa da minha tia, não tem? Ia comprar uma casa lá, construir outra casa, ia vender uma casa aqui pra construir mais rápido lá, que eu tenho três casa, a do meu pai e da minha mãe e a que comprei do [incompreensível], uma casa boa, duas sala, dois quarto, uma cozinha, um terraço, um banheiro bom, fora a área de serviço, tem três mil de pedra e um oitão, pra ele fumar e ficar na atividade, passou pro nome da minha mãe num lugar bom. Eu posso vender essa... Pedra é coisa do diabo, pedra tira atitude. Teve uma vez que eu dei uma surra num cara lá porque o cara chegou noiando a mulher dele, e a mulher dele era bonita demais. “Me dá duas pedrinha e toma minha mulher aí”, na hora que ele falou isso eu peguei uma puta de uma ripa, chamei os moleque e amarrei ele, falei “vai pra casa, mulher, vai pra casa”, fiquei quebrando ele. Aí a polícia chegou lá, pegou ele, “ei Jack”, tem uns polícia lá que é corrupto, levou embora, entendeu? Aí é isso, eu ia morar mais longe e ia continuar com minha vida doida, </LBody>
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<LI>ia botar uma pessoa pra ser eu e só ficar recebendo, ia ser mais esperto, não ia botar a cara mais pra pegar dinheiro, levar droga, pra ver quantos tá lá, fazer a contagem, entendeu? Ia botar mais um gerente pra mim, que eu já tinha um, ia botar um gerente e um subgerente, entendeu? Ia ficar só o gerente, olhando, se tiver que sair saiu, eu com um carro na mão, ficar de boa. (Entrevistado) </LI>
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<LBody>E se for pra mudar de vida? (Entrevistador) </LBody>
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<LBody>Se fosse pra mudar de vida? Ia fazer um curso, trabalhar nos dois emprego, entrar na igreja, né, que eu quero fazer isso, falar da palavra de Deus, contar meu testemunho, que que eu fui e o que que eu sou hoje, falar como que Deus mudou a minha vida e criar minha filha, entendeu? Seria uma coisa bem melhor pra mim, ser um cara exemplar pra minha família, pra essa pessoa que eu amo mais, e dar um futuro pra minha filha, entendeu? E é só isso mesmo. (Entrevistado, Interlocutor 01) </LBody>
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<P>Uma “vida doida” em que se lidasse o mínimo possível com violência, com a polícia, com “noias” ou uma “vida normal”, trabalhando em dois empregos, frequentando a igreja e criando a filha. São sonhos possíveis, porém em realidades incertas e violentas. Era possível tentar resolver, para um dos lados, a liminaridade entre os dois “tipos de vida”, ou tentar caminhar no meio delas, navegando à deriva, o que parecia ser a construção da maioria dos jovens. </P>
<P>Sendo assim, inferimos que muitos jovens almejam uma “vida doida”, mas sem violência (e, portanto, longe dos mecanismos de sociabilidade violenta, descritos por Luiz Antonio Machado da Silva, 2004, 2008), sem contato com a polícia e, portanto, sem a condenação oficial. Além disso, pretenderiam, nesse estilo de vida, exercer papéis como de pais, filhos, irmãos, e também dar vazão à sua espiritualidade. </P>
<P>Contudo, como indica a metáfora de Anthony Giddens (1991) sobre o carro de Jagrená, a vida na modernidade tardia se assemelha à tentativa de governar uma máquina de guerra potente, que é difícil de controlar e muito sensível aos acidentes do percurso, o que parece ainda mais forte na situação de deriva. Apesar de fazerem parte do campo de possibilidades que alguns desses adolescentes viam, existe uma série de fatores que escapam do seu controle e que podem fazer com que eles se sintam forçados a tomarem determinadas posições. Por outro lado, o abandono da “vida doida” traria outros desafios, como conseguir emprego e renda – na maioria dos casos, sem qualificação. </P>
<P>Quando recuperam a liberdade, o estágio de liminaridade será superado, mas isso não significa que a deriva será abandonada. Serão, portanto, adultos desenvolvendo seus projetos – mais ou menos elaborados – de vida. Perderão também a pressão institucional para realizarem projetos. Aprofundar ou abandonar a “vida doida” passará pela vontade dos atores, mas também pelos fatores sobre os quais eles têm pouco controle que já destacamos. E também por ter vida: ainda durante o desenvolvimento da pesquisa, três dos 45 entrevistados foram mortos a tiros, incluindo um dos cinco interlocutores citados neste artigo. </P>
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<H4>Notas </H4>
<P>1 Na unidade de internação provisória, havia também adolescentes que ainda não tinham sido sentenciados, e outros que receberam medidas de advertência de 45 dias de internação. Outros já haviam sido sentenciados e esperavam vaga na unidade de internação. Foram entrevistados apenas aqueles que se enquadravam neste último tipo, ou seja, que já tinham recebido medida de internação. </P>
<P>2 Na impossibilidade ética e legal (Ecriad, lei nº 8096/90, art. 17) de expor a identidade dos entrevistados, optamos por numerá-los, de forma a manter sob sigilo suas identidades. A numeração foi feita exclusivamente para este artigo. </P>
<P>3 Nas primeiras entrevistas realizadas, perguntamos aos adolescentes onde eles moravam. A pergunta confundia-os pelo tempo verbal utilizado: como foi feita no passado (“onde você morava?”), eles não sabiam a que fase de suas vidas estávamos nos referindo. Passamos, então, a fazer a pergunta no presente (“onde você mora?”) e a confusão se desfez. Nenhum adolescente respondeu que morava na unidade socioeducativa, todos respondiam com o nome do bairro em que moravam antes de serem apreendidos. </P>
<P>4 O termo “movimento” era utilizado nativamente usado para designar a organização local do tráfico de drogas. Para uma análise sobre a história e os usos desse termo, ver Misse (2008). </P>
<P>5 Quando pensamos em “mundo”, para além da reprodução da categoria nativa, seguimos o uso do termo dado por Velho (1994, p. 74), que indica que “nas ciências sociais, o conceito/noção de mundo vincula-se principalmente às obras de Georg Simmel e Alfred Schutz, que sugeriram a possibilidade de classificar e identificar domínios de realidade que se distinguiriam através de fronteiras sociológicas e descontinuidades culturais”. </P>
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<H4>Referências </H4>
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<H5>AMÍLCAR CARDOSO VILAÇA DE FREITAS </H5>
<P>(amilcarchicago@yahoo.com.br) é professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense (IFSul, Lajeado, Brasil) e pós-doutor pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel, Brasil). Possui doutorado em sociologia pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia (PPGSA), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ, Brasil), mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito (PPGSD), da Universidade Federal Fluminense (UFF, Niterói, Brasil), e bacharelado e licenciatura plena em ciências sociais pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes, Vitória, Brasil). </P>
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