<H2>A ‘sociabilidade violenta’ como interpretante efetivador de ações de força: Uma sugestão de encaminhamento pragmático para a hipótese de Machado da Silva1 </H2>
<Sect>
<H4>Vittorio Talone </H4>
<P>Doutorando do Iesp/Uerj </P>
<P>O objetivo deste ensaio é apresentar um reenquadramento pragmático do conceito de sociabilidade violenta, proposto por Luiz Antonio Machado da Silva. A ideia consiste em interpretar o conceito como uma representação, operada pelos atores como metafísica e como dispositivo e dotada de actância suficiente para efetivar a mobilização de grandes quantidades de força necessárias a certas ações de imposição em situações não rotineiras – e que, por conta da representação, são entendidas como (se fossem) rotina. Para tanto, discutimos como uma perspectiva distópica de mundo se soma a uma representação de que uma metafísica baseada na força atua perenemente entre os homens. Palavras-chave: sociabilidade violenta, efetivação, distopia, moral, força </P>
<P>The essay 'Violent Sociability' as an Interpretant for Effectuate Actions Based on Force: A Pragmatic Development for Machado da Silva’s Hypothesis </P>
<P>aims to present a pragmatic reframing of the concept of violent sociability, proposed by Luiz Antonio Machado da Silva. We suggest reinterpreting it as a social representation, operated by actors both as metaphysics and as device and endowed with enough agency to effectuate the deployment of large amounts of force necessary for some imposition actions in nonroutine situations – situations that, because of the representation, are understood as routine. In order to do so, we discuss how a dystopian perspective of the world joins up with a representation that a force-based metaphysics operates perennially among people. Keywords: violent sociability, effectuation, dystopia, morality, force </P>
<P>Recebido em: 25/09/2018 Aprovado em: 18/01/2019 </P>
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conceito de sociabilidade violenta foi proposto no começo da década de 1990 e vem sendo desenvolvido e reapresentado desde então por Luiz Antonio Machado da Silva (1993, 1995, 1999, 2004, 2008, 2010, 2011, 2016) para dar conta do que ele considera uma modalidade emergente de constituição das relações e ações sociais no Rio de Janeiro, modelizada a partir da “criminalidade violenta” no estado, ou, como descreve ele próprio (2004, p. 53), com base em “uma radical transformação de qualidade das relações sociais a partir das práticas de criminosos comuns”. Trata-se de uma abordagem que, por meio da constatação de um recrudescimento da chamada “violência urbana” na capital fluminense, notadamente a partir da ampliação da envergadura e do poder (de fogo, em especial) do tráfico de drogas, percebe uma “forma de vida” cuja característica mais determinante é o uso radicalmente desproporcional da força – ou seja, aquilo que os atores sociais em geral e alguns teóricos em particular costumam chamar de “violência”2 –, constituindo uma recusa da alteridade e um reconhecimento do outro </P>
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<P>DILEMAS: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social – Rio de Janeiro – Vol. 12 – no 1 – JAN-ABR 2019 – pp. 24-61 </P>
<P>apenas como objeto instrumentalmente utilizável. Esse uso da força (nele, física), por conseguinte, desconsideraria a possibilidade de dignidade do outro e, portanto, de bem comum em sua operação. Donde, como diz o autor (MACHADO DA SILVA et al., 2011, p. 691), nessa sociabilidade, “a moralização é mínima, (...) não há por quê, não há como, justificar o que se faz”. </P>
<P>Pois salvo por um esforço explicativo mais adensado da parte de Michel Misse (2006[1999]), por uma revisão analítica geral da obra de Machado da Silva por Jussara Freire e Lia de Mattos Rocha (2010) e por alguns poucos trabalhos de pós-graduação especificamente concentrados no tema3, não muito foi feito exclusivamente a fim de se esclarecer e ampliar a operacionalização desse conceito, tanto em termos de inserções de campo quanto de modelização efetiva das situações de conflito que ele pretende descrever. Da mesma forma, mesmo os movimentos críticos a ele têm sido limitados4. Por outro lado, como era previsível, a ideia de Machado da Silva fecundou várias pesquisas de campo e elaborações analíticas, dele e de outros autores, que, cada uma a sua maneira, dialogam com o conceito e teorizam a partir dele (LEITE, 2000, 2012; BURGOS, 2007; GRILLO, 2008, 2013; BRANDÃO, 2015; RIBEIRO JIOR e QUEIROZ, 2015; entre outros). Esses trabalhos, no entanto, costumam se dividir entre os que atuam contrastivamente, apresentando, digamos, contraexemplos que confirmam a tese – alguns mesmo sugerindo casos de alternativas de contenção das práticas dessa sociabilidade – e os que fazem demonstrações de contextos de extrema violência tornada recorrente e que incidentalmente apontariam a relação entre a situação descrita e o conceito. Além disso, a hipótese tem desempenhado um papel como inspiradora de outras modelizações de sociabilidade em ambientes conflituosos. A partir da afirmação de Machado da Silva, alguns pesquisadores têm proposto paradigmas de convivência ligados ao contexto do conflito urbano – como por exemplo a “sociabilidade delinquente” de Aguiar (2007), a “sociabilidade normalizada” de Grillo (2008) ou mesmo a “sociabilidade disputada” de um de nós (WERNECK, 2015b). O parentesco, aqui, no entanto, é mais analógico, já que esses trabalhos têm servido como alternativas e não propriamente como aplicações exemplares da tese do autor. </P>
<P>Assim, embora todos esses movimentos tenham gerado pesquisas importantes, não há neles, por se concentrarem em outras questões específicas, um investimento mais encorpado em detalhar a sociabilidade emergente sugerida por Machado da Silva e/ou fazer o modelo avançar. Até o limite em que foi conduzida, então, a sociabilidade violenta tem sido mobilizada principalmente como uma construção analítica stricto sensu e, portanto, como uma versão limite e saturada da realidade, a servir como plano de fundo para situações de “violência extrema”. Dessa maneira, o debate em torno do conceito fica espremido entre o questionamento de sua densidade empírica, por meio de demonstrações de que, afinal, pode haver justificativas para ações “violentas”, ou sua reafirmação, apresentando-se casos de “violências” enormes e “não justificáveis” – e de personagens sociais “violentos” e suas genealogias e potencializações. E, entre esses dois movimentos, a afirmação do próprio autor (2016), hábil epistemologicamente, de que se “pode ver a sociabilidade violenta, ainda que seja de forma típico-ideal”5. </P>
<P>Um empreendimento especificamente concentrado para debater a questão foi o projeto, coordenado pelo próprio Machado da Silva (et al., 2014), e do qual fez parte um de nós (WERNECK, 2015b, 2015c), voltado para pensar as formas disputada e violenta de sociabilidade em cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo. Nele, foi possível deslocar a observação sobre as mobilizações de força e sua relação com a ideia de uma lógica nas relações sociais de uma partida objetivista de primeira ordem para uma análise dessa relação como dispositivo (no sentido pragmático6), mobilizado pelos atores sociais como ferramenta para dar conta das situações em que estão inseridos. Posteriormente, Werneck (2015c) coordenou outro projeto, dando continuidade à discussão promovida naquele. Pois, na sequência desses dois movimentos, o objetivo deste ensaio é, a partir de uma série de pesquisas na área da sociologia da moral em nossos trabalhos em separado (WERNECK, 2011a, 2012a, 2012b, 2014b, 2015a; TALONE, 2015a, 2015b, 2017, 2018), esforços de inclinação pragmática, propor uma releitura da abordagem de Machado da Silva; tratamento alternativo, mas em nossa opinião totalmente coerente com e complementar a ela e capaz de revelar dimensões ainda não consideradas do fenômeno. </P>
<P>A ideia é a seguinte: independentemente de sua positividade empírica objetiva – o que não discutiremos aqui –, há um dado sobre a ideia de sociabilidade violenta que a torna um conceito ainda mais complexo e relevante: os atores sociais parecem acreditar nela. Ou, melhor, eles parecem acreditar em algo que, como conceito, ela consegue representar. Em outras palavras, na continuidade da perspectiva segundo a qual “a violência urbana é uma representação” (MACHADO DA SILVA, 1993; MISSE, 1999; PORTO, 1999) – historicizável por meio do que Misse (1999) chamou de “acumulação social da violência”, geradora do que este chamou de “fantasma” (sua imagem dessa representação) –, a ideia de uma ordem baseada na força (física) também pode ser entendida como uma metafísica, uma abstração sobre o mundo operada pelos atores sociais, servindo a eles de horizonte abstrato para sustentar suas ações e, mais determinantemente para este tratamento, suas definições de situação (THOMAS, 1969[1923]) concretas e situadas. Isto é, independentemente de a sociabilidade violenta estar no mundo ou não como objeto discreto não representacional – isto é, presente nos âmagos dos atores que, movidos por ela, agiriam “violentamente” –, ela está nas cabeças das pessoas. Não como “fruto da imaginação”, e sim como uma potente representação social, matéria abstrata, mas dotada de actância o suficiente para ser elevada à posição de metafísica de efetivação (WERNECK, 2012a), articulada como o que Talone (2015a) chamou de distopia realizada. E, das cabeças das pessoas, ela, mobilizada como dispositivo, ajuda a guiar a maneira como estas experimentam o mundo7. </P>
<P>Nossa aposta, então, é que o conceito de sociabilidade violenta chama a atenção para um elemento das situações sociais em geral que se torna determinante nas situações de conflito quando estas chegam ao uso desproporcional da força – e que pode servir para lançar luz para a própria ideia de sociabilidade e para melhor se entender os conflitos urbanos em um horizonte de mobilização da representação “violência urbana”. Usamos, assim, a categoria proposta por Machado da Silva para pensar seu uso não como um plano sobre o qual se desenvolvem ações sociais e como um molde segundo o qual elas se formatem e sim como metafísica e dispositivo de efetivação, ou seja, algo abstrato de que se pode lançar mão a fim de se fazer com que seja factível um certo conjunto de ações moralmente orientadas (WERNECK, 2010, 2011a, 2012a, 2012b). </P>
<P>Sim, moralmente orientadas. Pois, para começo de conversa, teremos que heuristicamente discordar do autor justamente para concordar com ele: seu trabalho tem afirmado que na sociabilidade violenta “não há moral” (MACHADO DA SILVA et al., 2011). Acreditamos que há. Estamos, no entanto, falando de coisas um pouco diferentes, o que torna este movimento menos uma discordância de fato e mais uma recolocação de termos (recolocação, entretanto, absolutamente central). Nele, a ausência de moralidade diz respeito à ausência de justificação, isto é, à impossibilidade de sustentação das ações no plano do bem comum (BOLTANSKI e THÉVENOT, 1991), próprio da “linguagem dos direitos humanos” (MACHADO DA SILVA et al., 2011) marcadora da lógica hegemônica da modernidade. A presença de moralidade, em nosso tratamento, diz respeito à administração do bem como o motivus (WEBER, 1947[1922]) fundamental das situações, no interior de um quadro plural de formas de orientação, de regimes de bem, reconhecendo o bem comum (a justiça) como caso particular de um modelo mais geral de direcionamentos desse princípio (WERNECK, 2012a, 2012b, 2014) – como será aprofundado adiante –, a fim de se permitir que a moral seja analisada da forma mais abstrata e sem qualquer conteúdo intrínseco – apego ao conteúdo que poderia tornar a análise, conquanto normativa, no mínimo etnocêntrica, no máximo meramente moralista8 (WERNECK, 2012a, 2018b). </P>
<P>A abordagem aqui adotada, assim, enfatiza a dimensão moral dos fenômenos ou, mais que isso, toma a vida social como vida moral. Trata-se, na extensão da definição, de uma sociologia compreensiva e pragmática da moral (WERNECK, 2014b). Este tratamento, que tem marcado nossos trabalhos separadamente, trilha sua construção na abordagem weberiana sobre os valores e sentidos (WEBER, 1947[1922], 2003[1904]); nas várias formas segundo as quais o construtivismo moral foi erigido a partir do pragmatismo filosófico e social – seja em Charles S. Peirce (1977[1893], 1992[1878]), William James (1907), John Dewey (1938) ou George Herbet Mead (1934), seja no “situacionismo metodológico” (CICOUREL, 1964; KNORR-CETINA, 1981; COLLINS, 1981; JOSEPH, 1984) estabelecido desde William I. Thomas (1969[1923]) seja ainda na releitura de Weber proposta por Wright Mills (1940); na ênfase depositada no “agente competente” das abordagens fenomenológica (SCHÜTZ, 1943) e etnometodológica (GARFINKEL, 1967); na discussão sobre accountability social (AUSTIN, 1956-1957; SCOTT e LYMAN, 2008[1968]); e chegando ao modelo das economias da grandeza (EG) de Boltanski e Thévenot (1991). </P>
<P>A diferença fundamental entre esses dois tratamentos é que enquanto Machado da Silva opera em uma partida positiva9, isto é, buscando objetivar as lógicas de funcionamento intrínseco das ações – o que conduz a uma análise da descrição de metafísicas de funcionamento (objetivas), depreendidas e verificadas em pragmáticas comportamentais, situadamente ou na continuidade de processos, trabalhamos aqui com uma partida compreensiva, quer dizer, pretendendo objetivar as lógicas de sentido dos atores – o que conduz a uma análise da relação entre metafísicas de sentido (intersubjetivas) e pragmáticas comportamentais situadas. Absolutamente não nos opomos a sua opção analítica – nem consideramos a nossa superior ou mais apropriada10. Propomos, no entanto, que um deslocamento rumo a uma abordagem interpretativa (e, veremos, semiótica) explicita uma dimensão do fenômeno que a outra eclipsava (com suas vantagens e desvantagens): o peso da mobilização de metafísicas como dispositivo pelos atores. </P>
<P>Dessa maneira, nossa descrição compreensiva trata de um pluralismo de gramáticas morais e não da moral como uma grande língua geral a limitar, formatar e enquadrar societalmente as ações – o que as dividiria simplisticamente entre morais e imorais. Do ponto de vista dessa descrição, não existe ação social que não seja moral (WERNECK, 2014b, p. 25) porque todas precisam ser alocadas em princípios de efetividade, dialogar com quadros abstratos que a efetivem (WERNECK, 2012a). E isso ocorre sejam esses princípios da ordem da negociação (THUDEROZ, 2010) seja da ordem da imposição, sendo possível – o que é centralmente relevante para esta discussão – se considerar o uso da força uma forma de efetivar determinados bens. Assim, desenha-se um modelo de fundamentação do social por meio do bem e seu direcionamento visado como base: agir é, do ponto de vista social – isto é, na mútua definição das situações, e na administração da mútua avaliação chamada accountability social (WRIGHT MILLS, 1940; SCOTT e LYMAN, 2008[1968]) –, buscar um bem (para si, para outrem, para os dois polos de uma disputa [caso do bem comum], para todos) e a moral é a gramática mesma da vida comum entre os homens: ela é a matriz de associação entre modalidades e direcionamentos do bem capaz de tornar efetivas as situações/ações sociais (WERNECK, 2012a). </P>
<P>O cerne desta forma estritamente pragmática de tratar a abordagem compreensiva é a ideia de efetivação, isto é, a operação por meio da qual uma situação/ação se torna cabível, ou, no sentido pragmático, o processo por meio do qual tem lugar sua definição (THOMAS, 1969[1923]) estável (BOLTANSKI e THÉVENOT, 1991), o que se dá, segundo Peirce (1992[1878]) pela via da constatação de suas consequências, de seus efeitos. Localizamos, então, a análise em um modelo em que a pergunta essencial sobre a vida social não são as causas das ações em sentido primeiro, nem as causas da existência da ordem, mas sim, em vez disso, a forma como as coisas ocorrem em sentido último. Assim, ao se retornar a um tratamento pragmático centrado na competência dos atores, a questão sociológica primordial passa a ser: de que fenômeno se está falando quando se responde a/por uma ação colocada em questão, submetida a “indagação valorativa” (SCOTT e LYMAN, 2008[1968]), elemento primordial de uma vida social centrada na mutua avaliação dos passos dos atores sociais uns pelos outros? Nossa resposta é que o processo de concretização de uma ação é, nos dois sentidos, fenomênica e analiticamente, um processo de efetivação, de algo passar pelo crivo do poder acontecer, no sentido de que a produção de efeitos representa a “permissão” intersubjetiva para a estabilização de uma situação. E isso não significa apenas uma neutralização da categoria avaliativa (que, reduzida à justificação, seria colonizada por uma única moral, a do justo), representa também o reconhecimento de sua pragmática: essas consequências se colocam segundo uma pluralidade de gramáticas, um conjunto finito de formas de produzir consequências, definindo uma galeria de “regimes de efetivação” (WERNECK, 2012a, p. 308). </P>
<Sect>
<H4>A força como ponto de partida </H4>
<P>Como mostramos, nós e um colega (WERNECK, TEIXEIRA e TALONE, 2018), a busca pela compreensão dos múltiplos significados do termo “violência” nos levou a reconhecer a centralidade do operador força para se articular uma sociologia pragmática da violência, um signo problemático e que, para ser operado como conceito, depende de complexas articulações analíticas (MISSE, 2016, 2017): enquanto “violência” é, de partida, um significante multissêmico, a força representa um ente objetivo. Ela, exercida de forma desproporcional e filtrada por registros distintos do que chamamos de “regimes de qualificação” (WERNECK, TEIXEIRA e TALONE, 2018) – isto é, diferentes registros semióticos de definição dessa força desproporcional como violência –, adquire a forma dos vários sentidos de violência a que se referem tanto analistas em várias abordagens quanto pessoas comuns em vários contextos. Como diz o próprio Machado da Silva (2004, pp. 58-59), a sociabilidade violenta “como categoria de entendimento e referência para modelos de conduta”, está “no centro de uma formação discursiva que expressa uma forma de vida constituída pelo uso da força como princípio organizador das relações sociais”. E a força é, afinal, especialmente útil sobretudo por sua comparatividade em termos mais ou menos quantitativos (relativamente, é evidente): dela é possível se dizer objetivamente que seja aplicada em maior ou menor intensidade em uma situação e/ou que haja desproporção entre seus investimentos de lado a lado. De maneira que toda uma série de metáforas físicas (energia, trabalho, potência) ganham factibilidade sociológica a partir da possibilidade da observação desse operador como um ente de fato presente (e com actância objetiva) nas interações sociais. </P>
<P>O tratamento de Machado da Silva para a questão da violência – como na grande maioria das análises acadêmicas – é uma composição de diferentes regimes de qualificação: em uma dimensão, ele constrói seu argumento afirmando que “a violência urbana é uma representação” (MACHADO DA SILVA, 1993), o que designa um tratamento da violência como metafísica (chamada por ele de “linguagem da violência urbana” e, no avanço do argumento, “sociabilidade violenta”), remetendo-se para uma sociologia construtivista da violência11; em outra dimensão, a ideia de uma sociabilidade violenta remete seu tratamento para a interpretação substantivista típica de uma sociologia “da violência” (WERNECK, TEIXEIRA e TALONE, 2018): afinal, a sociabilidade seria “violenta” porque definiria certo tipo de comportamento objetivamente tratável como violento – e especificamente a partir de uma sociologia do crime12 – e, em um registro mais elaborado, um tipo de ator (chamado por ele de “portador” dessa sociabilidade). Isso poderia soar como uma contradição, já que uma abordagem construtivista seria necessariamente fundada em uma recusa do caráter dado de seus objetos, explicitando seu caráter construído. Mas a questão do autor é a modalidade da generalização constitutiva da representação: aquela à qual ele se refere não é a do que seja a violência, mas de seu escopo. A “violência urbana” é uma representação social porque ela generaliza, em um registro, a amplitude do alcance da violência criminal para todo o social de modo a generalizar pressupostos de sua gestão e, em outro registro, porque ela generaliza a ameaça representada pela sociabilidade emergente (isto é, pelos atores e suas ações) por ele apontada. Em ambos os casos, é objetivo (e não atributivo) aquilo que o autor considera violência: o uso da força física, especialmente a bélica, enormemente desproporcional pelo crime. Assim, a generalização diz respeito ao papel desempenhado por essa violência como pauta hegemônica da gestão das relações sociais entre classes – a linguagem da violência urbana é aquela na qual, por conta da representação de certas populações (especialmente as de favela) como perigosas, o controle social ganha um direcionamento específico e o conflito social fica definido pela forma da evitação do contato entre grupos sociais urbanamente distribuídos. E a sociabilidade violenta explicita como essa forma generalizada (representada) corresponde a um aspecto de intensificação de uma definição básica que, nele, corresponde à objetificação instrumental do outro. </P>
<P>Pois bem, nessa formulação de Machado da Silva, a força pode ser imaginada no princípio das ações, anteriormente à moral13. Queremos ressituar o substrato dessa afirmação em outro plano analítico: se partirmos da definição clássica de Weber (1947[1922], p. 88), segundo a qual uma ação será social “na medida em que, em virtude do sentido subjetivo visado a ela atrelado pelo indivíduo (ou indivíduos), levar em conta os comportamentos de outros, sendo, assim, orientada em sua direção”, veremos que o social pode ser ele próprio definido pelo caráter de olhar moral – metonimizado aqui pelos “comportamentos dos outros” – e pela ideia de prestação de contas (accountability) – sintetizada não apenas pela ideia de se “levar em conta” esses comportamentos, mas também por toda a lógica de base do pensamento weberiano, as ideias de espírito, sentido e motivo. Assim, a especulação de que a força pode preceder a moral corresponde a se tomar a força como o motor básico da ação e não como seu elemento. É como se estivéssemos dizendo que a força move as pessoas para uma ação e não que as pessoas a mobilizam para praticar a ação que visam. É, então, como se disséssemos que derrubamos uma parede para usar a força e não que usamos a força para derrubar uma parede. Dessa maneira, quando, por exemplo, um “bandido”, no ápice de sua ação “violenta”, mata um inimigo e corta seu corpo com, digamos, um machado, ele o faz para, entre outras possibilidades, o eliminar (ação social racional orientada segundo fins e/ou valores), destruir seu corpo (WEBER, 1947[1922]), para promover sua humilhação (Idem), talvez para dar vazão a seu ódio contra “o alemão” (ação social não racional afetiva)14. Mas essa ação se relacionará com a força em anterioridade: esta última é o resultado da reunião de energia15 para praticar a ação visada (e cujo sentido se remete a causas que podem ser psicológicas e não passíveis de análise da sociologia) e mantém com esta uma relação servil: a força é usada para fazer algo. De modo que a ideia de uma sociabilidade violenta só pode ser tributária de um contexto no qual os atores contemplem ações que, de alguma maneira, exigirão grandes quantidades de força (nesse caso, física) – e, consequentemente, grandes dispêndios de energia. O que significa, consequentemente, que a afirmação de Machado da Silva consiste em uma hábil inversão lógica, promovida – a exemplo do próprio Weber – heuristicamente, e só pode ser experimentada pelos atores como representação, também ela voltada para a efetivação das ações: representa-se que a força possa ser o que se vise para, ao se visar algo que exige muita força, seja possível reunir os recursos cognitivos e físicos para construí-la como elemento central da situação16. </P>
<P>Assim, operamos como heurística a afirmação de Machado da Silva sobre a força como “em si” da ação: ela dá conta do passo necessário para se efetivar a passagem metonímica do sentido à força (isto é, para tratar a força como se pudesse estar no fundamento, sendo resultado) – e para, com isso, conferir densidade à descrição de um mundo que nativamente considera sua manifestação desproporcional um elemento fundante de uma linguagem. Entendemos, dessa maneira, que a interpretação de Machado da Silva permite pensar como os atores sociais percebem o funcionamento do mundo a partir da problematização do mesmo (DEWEY, 1929). </P>
<P>Ora, as observações de campo de nossas pesquisas individuais sobre a violência urbana e conflitos sociais no Rio de Janeiro (WERNECK, 2011a, 2015; TALONE, 2015a, 2017, 2018), bem como os resultados do projeto citado e trabalhos de vários pesquisadores do mesmo tema17, nos levaram a refletir sobre o grau de abstração – e, com ele, de actância, isto é, da capacidade de determinação de uma situação – alcançado pela representação de uma ordem baseada na força desproporcional. O ponto aqui é que acreditar que seja possível sustentar uma sociabilidade (discutiremos o termo adiante, mas por ora o tomemos heuristicamente como uma forma de atuar socialmente) “violenta” parece mostrar capacidade para a efetivação de ações baseadas no uso gritantemente desproporcional da força. E quando falamos em acreditar, estamos usando o verbo no sentido pragmático, isto é, de maneira consequencialista: trata-se de se agir como se acreditasse ou demonstrando acreditar. Nesse caso, não importa a interioridade da crença (o que é um tema para a psicologia) ou sua “sinceridade” (um tema para a ética), e sim os resultados práticos de ações que dela dependam. Ora, falando-se de forma objetiva, a desproporcionalidade de força depende, para sustentar sua colocação em prática, de uma grande quantidade de energia. Requer, então, operacionalização de uma potente capacidade de concentração de força. No mundo dos conflitos sociais essa capacidade de concentração tem recebido de atores e/ou pesquisadores alguns nomes como, por exemplo, “etos guerreiro” (ZALUAR, 1996)18, “disposição” (MARQUES, 2009; FELTRAN, 2011; GRILLO, 2013, entre outros), “gana” (OLIVEIRA, 2012) ou “marra” (WERNECK, 2015b). Nosso argumento é que para ser possível promover essa concentração faz-se necessário um par metafísica/dispositivo de efetivação: só é possível concentrar uma grande quantidade de força se um aparato for montado para permitir que os atores o façam, conferindo a eles alguma forma de tornar efetiva sua orientação para a ação em situação. </P>
<P>Assim, como também já demonstramos (WERNECK, TEIXEIRA e TALONE, 2018), uma sociologia pragmática da violência reconhece esse objeto como um par metafísico-pragmático: </P>
<P>[Essa sociologia] se fundamenta em uma praxiologia da qualificação analítica [de ações como violência], fundada na ideia de que essas qualificações captam todas invariavelmente um mesmo fenômeno praticado pelos atores sociais – estejam eles na posição de pessoas comuns ou na de analistas. É no esforço classificatório intersubjetivo dos atores para designar no interior de um signo chamado violência um contínuo variante de ações, situações e atores – seja isso nomear, adjetivar, generalizar ou apontar a intensidade ou a modalidade – (...) [que essa sociologia encontra sua empiria]. E esse esforço de qualificação precisa ser entendido, como qualquer outro desse tipo, como operação de produção de sentido (WEBER, 1947[1922]; BOLTANSKI e THÉVENOT, 1983), o que significa a produção de uma fundamentação partilhada pelos atores e portanto de uma definição socialmente processada e escrutinizada (PEIRCE, 1992[1878]; WEBER, 2001[1904]). Assim, trata-se de compreender, a partir de situações de conflito nas quais se mobilize a força desproporcional, a relação entre metafísicas que fundamentam a qualificação e sua mobilização em termos de dispositivos. Isto é, trata-se de entender como as coisas/situações do mundo são definidas como violência, como elas são, digamos, violentizadas, descrevendo-se um fenômeno de definição específico que poderíamos chamar de violentização. (...) Dessa maneira, uma sociologia pragmática da violência (...) [analisa] a forma específica segundo a qual o signo violência comparece (ora como signo multissêmico ora como conteúdo ora como ambos) no fenômeno da definição de situação/efetivação. Nesse sentido, a violência passa a ser entendida como um par metafísico-pragmático – tornando-se um interpretante, no sentido de Peirce (1977[1897]) [isto é, o elemento da significação que estabelece a lógica da relação entre forma e conteúdo, nesse caso, entre pragmática e metafísica] – e a questão dessa sociologia passa a ser, em sentido amplo, as formas de efetivação [baseadas nesse interpretante]. </P>
<P>Dessa maneira, a questão sobre a sociabilidade violenta para uma sociologia pragmática passa a ser qual a combinação entre metafísica e dispositivos pragmaticamente construídos capaz de tornar possível uma ação como aquelas descritas pelos atores (e por Machado da Silva) como tão extremamente violentas que permitem compreender que o outro se tornou objeto de uso instrumental. Nossa aposta, como mostramos, é que o interpretante aqui em jogo estabelece seu diálogo entre uma metafísica distópica (TALONE, 2015a) – justamente a sociabilidade emergente aqui em pauta –, e um conjunto de dispositivos por ela irradiados, permitindo, assim, que as ações que ela representa como rotineiras sejam possíveis em alguns momentos de ruptura da rotina19. </P>
</Sect>
<Sect>
<H4>Da sociabilidade como conceito multissêmico e multidimensional </H4>
<P>O termo “sociabilidade” comparece no discurso sociológico em algumas poucas acepções estritas analiticamente mais detidas – a mais conhecida e seminal, como é notório, a de Georg Simmel (1949[1910]), de matriz neokantiana. Em sentido amplo, ele traduz uma faculdade/capacidade/disposição para se estar junto, para “se associar” (ou, mais tarde, “sociar”, ainda nos termos daquele autor). Em geral, é atribuído a Samuel Pufendorf, especialmente em seu De jure naturae et gentium (de 1672), o pioneirismo do tratamento analítico de um conceito explícito de Geselligkeit (DARWALL, 2013; HAARA, 2016, 2017), que no francês é falado como sociabilité – sendo a base da forma em português – e no inglês, como sociability. Em todos esses casos, são termos de uso corrente no âmbito externo às ciências sociais ou a qualquer tratamento analítico. O enquadramento de Pufendorf, projeto de uma filosofia moral, parte dessa mesma acepção já presente no senso comum. </P>
<P>E os tratamentos em geral partem dessa mesma galeria de significados. Evidentemente, a ideia de um fundamento para a vida comum dos homens é um tema dos mais antigos no pensamento, comparecendo como pauta dos pensadores gregos à atualidade. O destaque para o filósofo alemão vem de, nele, o termo se consolidar como uma categoria propriamente de análise da vida social. Posteriormente, outros tratamentos filosóficos retomariam essa discussão, notadamente em Kant, na Ideia para uma história universal de um ponto de vista cosmopolita (2016[1784]), especialmente no debate sobre “sociabilidade antissocial” (ver SCHNEEWIND, 2009), e no Hegel de Jena, especialmente na discussão sobre “reconhecimento” (Anerkenung) (ver HONNETH, 2009). Em uma abordagem propriamente sociológica, embora poucas vezes recorra ao termo especificamente, Max Scheler (1973[1913-1916], 2008[1923]), mais ou menos em paralelo a Simmel, promove uma revisão forte do conceito, a partir da ideia de simpatia como base do impulso dos humanos para viver juntamente com outros humanos. A leitura de Simmel, por sua vez, proposta em 1910 em um discurso de abertura para </P>
<P>o simpósio da Sociedade Alemã de Sociologia, em Frankfurt, sob o título de “Sociologia da sociabilidade” (SIMMEL, 1949[1910]), revela uma vontade de retradução disso que parece ser uma característica antropológica – e portanto um fundamento do humano como ser moral – como uma característica morfológica fundamental da vida social, i. e., como algo socialmente determinado e determinante. Nele, a sociabilidade é um símbolo da vida. </P>
<P>Por outro lado, embora o conceito encontre em Pufendorf uma inauguração e em Simmel sua leitura mais circunscrita, quase todo proponente de uma teoria geral sobre o social acaba por apresentar para ele uma versão, seja mais ou menos explícita, mais ou menos central em sua abordagem. Há modelos de sociabilidade – ou de algo que se aproxime do fundamento expressado por esse conceito – em autores tão distintos quanto Marx, Durkheim, Weber, Gurvich, nos da Escola de Chicago e, mais recentemente, em nomes tão diversos quanto Elias (2008[1970]), Bourdieu (2000[1972]), Giddens (1979, 1986) ou Michel Maffesoli (AMIROU, 1989). </P>
<P>Apesar dessa multiplicidade, observando-se como o conceito comparece em várias abordagens sociológicas, é possível traçar sua semiótica. Esse signo pode, então, dar conta de duas diferentes dimensões de uma mesma fenomenologia: como faculdade cognitiva e como lógica de ordenamento – ou, como coloca Ion (1990, p. 174), a sociabilidade “será tanto apreendida como modelo geral do processo de socialização quanto como forma [no sentido simmeliano] última desse processo”. Isso subdivide a questão da sociabilidade em duas dimensões, um plano individual e um plano societal. No primeiro, o termo costuma ser entendido como capacidade cognitiva a atuar na constituição de um self (MEAD, 1934), com duas diferentes acepções: 1) como imperativo antropológico (fundamental ou adquirido, conforme o tipo de teoria) de atores e coisas, de actantes – para se colocar no social, para a vida social (para, em Simmel (2009[1908], sociar), isto é, para interagir, estabelecer laços, produzir relações; ou 2) como filtro (ou motor) actancial (igualmente fundamental ou adquirido, conforme a abordagem), segundo o qual os atores enxergam o mundo e que fundamenta suas ações/definições de situação. No outro plano, ele comparece como metafísica, gramática definida, quadro de referência estrutural/estruturado que se impõe aos atores como um pano de fundo, base ou referência para a vida em comum. No primeiro plano, falamos de características antropológicas, formações de base para percepção, interpretação, manifestação, reflexividade, uma lógica individual do social, segundo a qual se nota e se é impelido para o outro (solidária ou conflitivamente); no outro plano, falamos de uma coerência operativa, de uma lógica de integração, copresença, ação e relação, interação, situação, uma genética ampla do social, segundo a qual algo ocorre a partir do fato de a existência/presença do(s) outro(s) nos afetar e a nossa, por sua vez, também o afetar (WEBER, 1947[1922], 2001[1904]). Essas duas dimensões dizem respeito uma a um plano mecanístico e outra a um plano morfológico. Colocando-se em termos pragmáticos, trata-se de uma distinção entre uma actancialidade – a lógica fundamental das actâncias, das capacidades para a ação – e um sistema actancial – a lógica organizacional e sistematizada do ambiente das ações20. </P>
<P>O quadro a seguir sintetiza esse mapeamento dos significados de sociabilidade21: </P>
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Elaboração própria </Figure>
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<H4>Um ordenamento baseado na força desproporcional: da sociabilidade violenta como metafísica distópica (ou como distopia realizada) </H4>
<P>Como demonstram trechos de Machado da Silva como “a violência urbana é um ‘mapa’ que apresenta aos atores relações sociais de fato e legitimamente necessárias: uma ordem, para todos os efeitos práticos” (1993, p. 131), o autor se situa, para começo de discussão, no polo do sistema actancial, ao afirmar suas linguagens como ordenamentos societais. Seu tratamento, como já exposto, fala nessas linguagens como enquadramentos-guia das ações sociais, gestados e hegemônicos em diferentes momentos históricos – embora não exclusivamente circunscritos e redutíveis a eles. A princípio, a metáfora afastaria esse enquadramento da ideia de gramática – diferenciando-o, portanto, de uma descrição como a de “regime de violência” de Boltanski (1990)22: linguagem sugere que as relações sociais são expressadas nos termos de um enquadramento determinado. Assim, na linguagem da violência urbana, as relações sociais urbanas são traduzidas nos termos dos elementos típicos dessa representação (WERNECK, 2015a), isto é, sendo significadas pelo interpretante (PEIRCE, 1977[1897]) violência quando generalizado para a ordem urbana (WERNECK, TEIXEIRA e TALONE, 2018). Dessa maneira, a metafísica sintetizadora da sociabilidade descreve, para Machado da Silva, uma ordem social cujo mecanismo é descrito por meio de uma mecânica analógica e semiótica. </P>
<P>O sentido do termo gramática na sociologia pragmática da crítica (que aqui nos guia) é bastante específico. Ele corresponde, de maneira inspirada na linguística gerativa de Noam Chomsky (1965)23, a um modelamento comportamental cuja base é a competência, quer dizer, o uso desenvolto de padrões de atuação estabelecidos idealmente, mas não totalmente obrigatórios. Boltanski e Thévenot (1991, p. 183) definem competência como “uma capacidade de reconhecer a natureza de uma situação e de pôr em ação o princípio (...) a ela correspondente”. Werneck (2015, p. 193), por sua vez, propõe uma definição alternativa (mas coordenada com aquela), de inclinação actancial, tratando-a como “um traço demonstrado nas ações situadas, apontando para sua alocação em determinada gramática actancial moral, como medida de desenvoltura em regras que verificam critérios de concretização da [situa]ação, isto é, trata-se do critério procurado nas [situa]ações quando se verifica se elas podem ou não ser efetivadas”. Isto é, a competência também é o valor em jogo na avaliação que os atores fazem ao escrutinizar um fenômeno social para efetivar seu acontecimento. Em uma gramática nesses moldes, os atores são impelidos a atuar criativamente a partir dos padrões estabelecidos para se agir nos termos desses padrões, o mais próximo possível de sua idealidade, mas da forma mais eficiente para o fim último de uma gramática, que é ajustar os vários comportamentos entre si, permitindo a comunicação (isto é, a colocação em comum) dos mesmos. Formalmente, na abordagem das économies de la grandeur (EG) (BOLTANSKI e THÉVENOT, 1991), um regime é, então, uma gramática – uma gramática com o fim específico de regrar os escrutínios morais efetivadores dos fenômenos sociais. Trata-se, portanto, de um aparato valorativo/avaliativo cuja base é um parâmetro chamado competência. Nos termos de Boltanski, o regime de violência é um regime de ação – isto é, uma gramática de avaliação de ações – cujo parâmetro (competência) é a força. Já o uso do termo linguagem por Machado sugere uma metafísica como sistema de signos comuns, uma forma mais ou menos padronizada de expressão, o que é um designativo menos avaliativo (como a gramática) e mais substantivo/descritivo (como se diz de uma língua que ela é a língua de um povo), tendo mais a ver com o apontamento das características de como se age com vistas ao ajustamento do que com a modulação dos comportamentos. </P>
<P>Há, no entanto, na abordagem de Machado da Silva, uma forte conexão entre linguagem e gramática, justamente na medida em que ele constrói sua acepção de sociabilidade de maneira duplamente articulada: ela é, nele, ao mesmo tempo aparato societal (mapa) e filtro actancial (forma de agir fundada na força desproporcional). Como dissemos, a generalização como representação coletiva nela em jogo diz respeito à amplitude do alcance da violência tomada como filtro actancial de alguns atores. Dessa maneira, se não pode ser considerado correlato ao regime de violência de Boltanski (que tem muito mais a ver com a força simbólica, em resposta a Bourdieu), seu tratamento se gramaticaliza na medida em que se constrói como sistema semiótico gerativo: a linguagem indica aos atores como agir, mas não descreve uma lógica incontornável, estando aberta a suas agências – eles são efetivamente responsáveis por sua ações (já que são julgáveis e responsabilizáveis pelo caráter potencialmente violento do que fazem) (WERNECK, 2014b). </P>
<P>Machado da Silva constrói seu modelo a partir de uma perspectiva conflitualista de sociabilidade, isto é, com o conflito como ponto de partida das relações sociais, em especial com uma conflitualidade marcada pela problemática de classes (passando, então, pelo marxismo) – e portanto afastado de uma perspectiva simmeliana, estando mais próximo de uma teoria da ação na qual a dominação seja tema de disputa entre os atores (WEBER, 1947[1922]). Em um horizonte como esse, a questão da legitimidade, e, em consequência disso, dos processos de legitimação como formas da dominação, torna-se problema de base24, de modo que a abordagem de Machado da Silva se torna, em certa medida uma sociologia crítica da violência (WERNECK, TEIXEIRA e TALONE, 2018). Ora, um dos pontos fundamentais de uma abordagem de partida conflitualista é que ela independe de uma inclinação (antropológica) solidária dos atores para fundamentar a vida comum – o que seria o pressuposto de uma “sociabilidade associativa” (ION, 1990) típica das abordagens consensualistas. Nessa leitura fundada no conflito, a goma arábica do social chamada sociabilidade tem como resultante um estado de pura atuação dos atores sociais em um mesmo ambiente, e sua antropologia se baseia na coordenação de interesses25. Nesse sentido, em uma abordagem como essa, os contatos entre homens são conflituosos, aberta ou sub-repticiamente. E, nele, Machado da Silva encontra total respaldo para buscar observar uma forma não integrativa (e, em certos momentos desintegradora) de sociabilidade. </P>
<P>De nossa parte, colocamos entre parênteses a ideia de descrever uma possível ordem social intrinsecamente “violenta de forma extrema” em favor de compreender em qualquer modelo de sociabilidade as condições de possibilidade de ações chamadas de “extremamente violentas” que possam se beneficiar da representação social de uma sociabilidade fundada na “violência”, isto é, operadas com um enorme desnível de força entre as partes, e apontadas como incomodamente recorrentes sob determinada gramática moral a elas ligadas (e, portanto, interditáveis). Para tal, então, a questão passa a ser explicar princípios de ação/situação e não princípios de integração, ou seja, os dispositivos mobilizáveis para se agir competentemente, efetivamente, e não as disposições estabelecidas para integrar seres. Pensada como forma metafísica da actância inscrita nos modos de agir e nos modos de efetivar e não nos modos de organizar, a sociabilidade se oferece como operador efetivador das situações (sociais) e não como goma arábica da ordem (social). </P>
<P>Nossa questão substantiva na discussão sobre a sociabilidade violenta será, então, como os atores sociais lançam mão desse signo (ou, simplesmente, do fundamento, o conteúdo por ele carregado) como representação (e, consequentemente, ao mesmo tempo como metafísica de fundamentação e como dispositivo de operacionalização) a fim de ser efetivo mobilizar uma grande quantidade de força, construir uma representação de uma grande força com actância sobre outros atores ou para efetivar ações em relação/reação a essa grande quantidade de força. Assim, nossa aposta é que aquilo que é representado analiticamente por Machado da Silva como sociabilidade violenta é representado nativamente pelos atores sociais em situações (pelo menos) no Rio de Janeiro e que essa representação a respeito de uma sociabilidade de força se apresenta como um dispositivo moral abstrato para efetivar ações de imposição (WERNECK, 2012a, p. 312). </P>
<P>Não apenas imposição, no entanto: o que está em jogo centralmente na ideia de “ausência de moralidade” proposta por Machado, para além da impossibilidade de justificação, é o estatuto dessa impossibilidade: trata-se de se estudar as bases do exercício de uma desproporção de força capaz de fazer os atores classificarem as ações como “extremamente [isto é excessivamente] violentas” e, nesse sentido, “impossíveis de serem justificadas”. Para eles26. Ora, o estatuto de um excesso, de uma quantidade “exagerada” e “inaceitável”, é, para se sustentar moral e logicamente, antes de tudo, uma questão física: o excesso, justamente por ser excesso, dificilmente pode ser operado como algo rotineiro. Afinal, para ser o que é, depende de um investimento de energia dispendioso, tanto física quanto abstrata (e talvez emocional) e operacionalmente. Assim, ações “extremamente violentas”, para serem operacionalizadas, dependem da aposta, situada, em uma metafísica segundo a qual toda a lógica do social possa ser “violenta” – ou seja, baseada na imposição por uma força enormemente desproporcional de forma regular, cotidiana. </P>
<P>Como mostra o próprio Machado da Silva – e como mostramos ao descrever uma sociologia política da violência (WERNECK, TEIXEIRA e TALONE, 2018) –, no entanto, a força é já um elemento da própria linguagem dos direitos, já que é a própria substância da garantia de segurança por meio dos dispositivos de Estado (BRODEUR, 2004) e tem sido assim percebida por vários autores27 – uma força tornada legítima, como se sabe. Ela é também, evidentemente, elemento central da linguagem da violência urbana, já que se torna uma supersubstância da administração de conflitos na sociedade (MACHADO DA SILVA et al., 2011). Mas, no que diz respeito à sociabilidade violenta, representa-se a força desproporcional como a própria lógica de vida comum. </P>
<P>Detenhamo-nos, então, sobre o conceito: uma força é, retomemos os termos físicos, um ente capaz de alterar o estado de inércia de um corpo disponível para o movimento ou de produzir deformação em um corpo estático. É algo, então, que se opõe ao estado de algo e o altera, algo que faz fazer ou faz estar28. Do ponto de vista quantitativo, quando se aplica a um corpo determinado quantum de força correspondente a sua inércia, será alterado seu estado (de repouso ou movimento uniforme, conforme ele esteja parado ou se movendo – caso este em que se poderá alterar o sentido ou a direção do mesmo) ou mesmo sua integridade formal (elasticamente, sem </P>
<P>o destruir). Se for aplicada uma força suficiente – o efeito indica essa suficiência. Pois bem, a força será desproporcional quando produzir efeitos além dos diretamente envolvidos na ação visada (isto é, se for mais do que o suficiente a força aplicada). E uma percepção moral de que esses efeitos são excessivos – e, nessa mesma medida, negativos moralmente – será justamente, na avaliação da maioria dos atores, o que caracterizará essa ação como violenta (porque, “excessiva”, “forte demais” ou “covarde”). De modo que a força desproporcional pode ser pensada não apenas como uma medida objetiva, mas como um símbolo, um signo aberto (PEIRCE, 1977[1897]), a ser interpretado em um regime de efetivação estritamente impositivo e cuja rotina pode ser a imposição de práticas de puro bem de si. Estas, avaliadas – isto é, com a força sendo passada de símbolo a índice (Idem) – pelos atores como egoístas ou desumanas e, em uma tradição de exigência de altruísmo – ou bem comum em equivalência (BOLTANSKI e THÉVENOT, 1991) – como medida da positivação moral, podem ser apontadas como inaceitáveis. Isso, no entanto, como mostra Werneck (2011b), não pode ser operado por um recurso simples ao universal (WERNECK, 2016b) – se externamente à mobilização da força desproporcional tomada como legítima e justificada pelo papel que desempenha na manutenção da ordem. Do ponto de vista dos usos isolados da força desproporcional, sem um aparato de legitimidade (notadamente de justificação), o que permitiria a reunião prática de muitos recursos de força sem maiores resistências, há apenas dois caminhos possíveis para a efetivação. Por um lado, como mostra Werneck (2012a, pp. 307-310), uma ação desse tipo precisa, em geral, ser operacionalizada por peculiarização: ou por circunstância (na imprevisibilidade situacional, na qual uma imensa quantidade de energia pode ser mobilizada); ou por diferença (em uma competitividade operacional localizada que exija a grande mobilização de energia); ou por singularidade (em uma construção identitária, segundo a qual o ente possa ser reconhecido como extremamente poderoso). Por outro lado, toda essa peculiaridade é por demais contingente, depende do fluxo imprevisto das coisas, para sustentar alguma relação cabível capaz de manter atividades dependentes da força desproporcional – como a dinâmica do crime, por exemplo. De modo que um outro recurso disponível aos atores para ser possível lançar mão desse recurso é eles se guiarem comumente por uma mesma representação, constituída por um universal situacionalmente localizado que permita tratar essa objetividade – força desproporcional – como potência sígnica, como interpretante difuso – da forma mais abstrata da qualificação como “violência” (WERNECK, TEIXEIRA e TALONE, 2018). E que o permita porque trate o contingente como universal, criando uma condição propícia para a contingência não ser mais (pensada como) contingência, sendo tratada como rotina. Assim, sugerimos que a “sociabilidade violenta”, como contida no conceito de Machado da Silva, torna-se, no início de um percurso semiótico (cuja culminação detalhamos adiante), essa metafísica, a permitir momentos de mobilização de uma quantidade gigantesca de força desproporcional, isto é, para os atores e para certas análises (Idem), de “extrema violência”, o que, repetimos, é dificilmente sustentável como rotina: o caráter momentâneo justamente revela o elemento de raridade dessa ocorrência. Como diz o próprio Machado da Silva (2004, p. 80), a questão não é “falar sobre a ‘verdade’ das relações de força (...), mas propor uma interpretação, entre outras possíveis, sobre como os envolvidos as vivem – como as praticam, experimentam e representam”. </P>
<P>A pesquisa de Talone (2015a) mostrou-se congruente com a longa tradição de estudos sobre a representação de atores sociais pelos outros de forma negativa, como “desviantes”, especialmente com base na rotulação (BECKER, 2008[1963]; GOFFMAN, 1963; WERNECK, 2014a) e/ou na sujeição criminal (MISSE, 1999). No seu caso, ele mostra como a representação de certos atores a respeito de um suposto “conteúdo” de “força desproporcional” de outros permite compreender a mobilização prática de algo que pode ser considerado um dispositivo moralista, a desconfiança. Levada adiante, sua discussão dialoga com a de Machado da Silva na medida em que aqueles representados como movidos por uma forma de vida violenta em si são os “portadores da sociabilidade violenta” (MACHADO DA SILVA, 2004; et al., 2011), sendo, ainda nas análises de Talone, alvo de uma reação que altera o estado taken for granted (inércia ou movimento em um dado sentido – em seu caso empírico, do deslocamento “normal” pela cidade) justamente pela projeção da possibilidade de tal força produzir deformações (como na violação de corpos). A possibilidade de se deparar com agentes que, para certos atores, efetivamente mobilizam em todas as suas ações a “força desproporcional” é justamente o que marca e indica a irradiação da sociabilidade como representação. E essa figura, o “portador”, dessa maneira, corresponderia àquele representado como capaz de mobilizar a força necessária para um nível de imposição efetivado pela possibilidade de uma destruição completa – e eventualmente performática (WERNECK, 2015a) – do outro29. Concebe-se, assim, um personagem marcante de um ambiente social que podemos (com base ainda em Talone) chamar de distópico. </P>
<P>O ponto, dessa maneira, é a operação de generalização que eleva a ideia de uma vida perenemente baseada na força ao plano da metafísica-guia das definições de situação, isto é, como interpretante semiótico (PEIRCE, 1977[1897]). Assim, trata-se de compreender como os próprios atores fazem a passagem de uma operação a outra, isto é, como solidificam como rotina uma operação de se construir como perene uma estruturação que – na prática – só pode ser mobilizada de forma momentânea, situada. Trata-se, com isso, de se observar que elementos do mundo são mobilizados para projetar uma abstração e a tratar como se fosse uma estrutura-guia. </P>
<P>Assim, estamos falando de um quadro que opõe os componentes de uma ordem social em dois polos, apartados pela aposta de um dos lados – não necessariamente fixo – de que o outro seja capaz de atuar com força desmedida sobre ele e – o que é mais importante no sentido de se conceber uma rotina – a qualquer momento ou, mais que isso, o tempo todo. </P>
<P>Ainda para Talone, sobre a questão da representação e seus efeitos, os atores implementam uma disposição cognitiva chamada por ele de estado alerta – aquele no qual se desliga a confiança blasé da vida moderna em favor de uma atenção redobrada sobre possíveis portadores da violência30. O ponto que nos interessa, no entanto, é o outro polo do processo, surgido a partir desse: esse estado de alerta é despertado por um quadro cognitivo chamando pelo autor, inspirado no tratamento de Boltanski (1990) para as utopias políticas, de distopia realizada. </P>
<P>Na literatura, uma distopia é uma representação – em geral sobre o futuro, mas construída como metáfora do presente – de uma vida social centrada em opressão, totalitarismo e condições sociais de extremo sofrimento31. Notadamente a partir de obras como Admirável Mundo Novo (1932), de Aldous Huxley; 1984 (1949), de George Orwell; ou Laranja mecânica, de Anthony Burgess (1962), a ideia de um ambiente representado pela antítese da Utopia, de Thomas More (1516), generalizou-se para além do discurso da/sobre a ficção a respeito de projeções a respeito da vida social das quais se espere condições adversas generalizadas. E é possível argumentar que essa difusão da distopia é uma resultante direta da difusão de seu par oposto, que especialmente a partir da filosofia política, passa a designar os projetos de boas ordens a serem construídas pelos homens (CLAEYS, 2017; WEBER e VALLIER, 2017). </P>
<P>Apesar disso, uma utopia tradicionalmente é representada como uma visão fantasiosa e paradisíaca da vida social, um ideal a ser usado como horizonte, mas virtualmente inalcançável. Boltanski (1990), no entanto, no percurso de construir com Thévenot o chamado modelo das cités (BOLTANSKI e THÉVENOT, 1991) e em consonância com as idealizações da filosofia política, propõe, com certa inspiração aristotélica, a ideia de “utopia realizada”, por meio do traçado de um percurso que volta à cidade-Estado grega, sendo ela justamente exemplificada pela pólis: trata-se de um ordenamento social em que a paz encontra sua possibilidade na dissolução das diferenças entre os homens até se alcançar uma utopia realizável. O autor (Idem, pp. 150-151) escreve: </P>
<P>[As] velhas construções utópicas, visando um ideal inacessível, nada têm nada a ver com as pessoas de nosso mundo, que, não tendo em sua maioria nunca aberto um livro de Hobbes, de Saint-Simon ou de Rousseau, nada poderiam com eles fazer. São termos como “utopia” ou “ideal”, colocados de forma oposta à “realidade”, que servem de pivô à crítica. Mas eles não podem ser afastados sem exame porque a utopia existe. É possível construir mundos imaginários apresentando pelo menos um certo grau de sistematicidade e coerência. (...) [d]evemos então ser capazes de diferenciar não apenas entre utopias impossíveis e utopias realizáveis, mas também entre utopias realizáveis e utopias realizadas. E para isso dispomos de um indicador objetivo: uma utopia é realizada, e com isso merece o nome de cité, uma vez que exista na sociedade um mundo de objetos capaz de permitir agenciar processos de comprovação cuja avaliação supõe o recurso ao princípio de equivalência cuja possibilidade lógica essa utopia coloca em ação. </P>
<P>As utopias são, desse ponto de vista, diferentes formas de generalidade, metafísicas, que converteriam a diferença de “grandeza”32 em uma simulação de igualdade, em “equivalência”, e, portanto, justas, legítimas, aceitáveis pelos atores. Tais generalidades diriam respeito, nos termos de Boltanski e Thévenot (1991), a diferentes cités33, ordenamentos utópicos projetados pelos atores em termos de justiça, então modelizadas de formas variadas, mas finitas. Os autores propõem essa construção, pois percebem, por meio de uma vasta matriz empírica, que as pessoas, quando questionadas, operam por justificações referenciadas a diferentes tipos de bem comum (BOLTANSKI e THÉVENOT, 1983), sendo tal procedimento considerado legítimo pelos outros na medida em que fizesse referência a uma dessas cités. Pois, como acabamos de ver com Boltanski, a condição de realização de uma utopia é seu rebatimento no mundo real dos atores por meio da mobilização de dispositivos de objetos que a atualizem nas situações pragmáticas. </P>
<P>Então, na prática não é apenas possível projetarmos uma utopia realizável, mas lidamos igualmente com referências dadas no mundo sobre a mesma: há utopias realizadas. E isso porque se sustentam em uma operação de verificação constantemente operada pelos atores por meio de formas variadas de realizar comprovações (épreuves), ancorando na realidade a mobilização de uma utopia – por meio de coisas do mundo, dispositivos (materiais ou não) – para que as pessoas possam colocar suas grandezas em prática. </P>
<P>Em suma, há metafísicas morais orientando a utopia (a idealidade) das ações sociais e há mundos constituídos por meio delas, de forma que há distintos quadros referenciais para diferentes mundos. Estes correspondem à vida prática, às situações pragmaticamente constituídas e aos variados estados de grandeza assumidos pelos participantes de tais situações. Boltanski e Thévenot (1991, 1999), então, para “operar” as cités, descem da abstração de metafísicas morais em direção aos “mundos comuns”, habitados por variados actantes, pessoas, coisas, discursos, entre outros elementos, compondo planos de dispositivos mobilizados pelas pessoas para constituir provas de competência vis-à-vis gramáticas de sociabilidade (nesse caso, do justo). </P>
<P>Pois bem, nossa aposta analítica é que é possível imaginar – e foi possível observar empiricamente que os atores operam – formas de fundamentar ações no mundo baseadas não no “melhor dos mundos possíveis” (uma utopia), mas sim no pior dos mundos possíveis (uma distopia). No caso da distopia, trata-se de atores que veem suas rotinas permeadas por diferentes e específicas possibilidades e formas de perigo, possíveis para eles por precedentes já observados em suas rotinas que rompam com uma possível confiança estabelecida (CHATEAURAYNAUD, 2012). Mas são fatores que em geral levam à cautela, ou seja, a uma atenção despertada, com vias à tentativa de proteção antecipada em relação aos mesmos, e nem sempre ao medo. No caso da sociabilidade violenta, no entanto, a resultante é justamente o extremo: o medo redobrado (e paralisante); a coragem radical – por exemplo, de outros atores igualmente capazes de mobilizar grandes quantidades de força e enfrentar a força sobre-humana de alguns – e empreendedora; a fala acusatorial; a banalização da destruição. </P>
<P>Duas das características mais fundamentais das utopias são duas pretensões (WEBER e VALLIER, 2017): a primeira é sua pretensão de universalidade, isto é, sua vontade de traduzir seu projeto de mundo para todas as situações possíveis sob seus auspícios; a outra, é sua pretensão de eternidade: elas sugerem um congelamento da história e que se viva cada momento como se a idealidade fosse durar para sempre. Mas, como metafísica, para ser realizada (BOLTANSKI, 1990), uma utopia precisa prestar contas a uma outra característica fundamental, um imperativo de eventualidade: como é, antes de tudo, uma abstração mobilizada pelos atores para conferir sentido (WEBER, 1947[1922]), definir (THOMAS, 1969[1923]), efetivar (WERNECK, 2012a) uma situação, ela só pode ser universal e eterna de forma localizada e temporária, só pode sê-lo situadamente – o que é coerente com um modelo de vários mundos de Boltanski e Thévenot (1991). Ora, essa aparente contradição é o fundamento mesmo da idealidade aqui em jogo: enquadrada por meio daquelas duas pretensões, mas sob o constrangimento do imperativo citado, a utopia enquadra, gramatiza a efetividade da situação segundo ela, fornecendo às pessoas uma base, um chão, sobre o qual se moverem, oferecendo, então, o que Giddens (1991) chamou de “segurança ontológica” para a atuação conjunta. Pois uma distopia, por conseguinte, para ser realizada, terá que apresentar as mesmas características formais: fará o pior mundo possível existir no horizonte da situação como se existisse em todo lugar, desde sempre e para sempre, colonizando as efetivações ali operadas, para que as pessoas tenham chão para agir. </P>
<P>A afirmação, assim, é que o par utopia/distopia não é uma antinomia, na qual uma exclui a outra e uma define a antítese e se apresenta como resíduo da afirmação da outra (como é tradicional pensar, isto é, como a distopia funcionando como antiutopia, eliminando todas as suas manifestações). A ideia é que elas constituem regimes complementares – e eventualmente coordenados em situação – de gestão abstrata da intervenção dos atores sobre o mundo, como formas de conferir sentido amplo aos fenômenos situados. </P>
<P>Dessa maneira, para falar em uma distopia realizada fundada na violência, ou seja, para construir a ideia de um quadro referencial a carregar distintos signos (práticas violentas) de um perigo social difuso em termos de força desproporcional inaceitável cujos efeitos tomam forma no mundo real e não apenas em fantasias, pensamos em algo ancorado no mundo (diferenciandose, portanto, de distopias puramente abstratas), pois se constitui em dispositivos efetivamente usados pelos atores. Essa distopia realizada é, assim, uma projeção dos problemas que dizem respeito à “violência urbana” – e sua radicalização como uma forma de vida, uma sociabilidade – com que os atores acreditam lidar em suas rotinas. </P>
<P>Dessa forma, notamos em nossa reflexão que muitos elementos da vida cotidiana de uma grande cidade como o Rio de Janeiro (base do raciocínio de Machado da Silva para observar a sociabilidade violenta34) – como seu planejamento urbanístico, a definição de áreas consideradas perigosas, os conflitos com trocas de tiros e o perigo de balas perdidas entendidos como cotidianos, por exemplo – são elementos no mundo do quadro referencial de uma distopia realizada chamada violência urbana. Esta diz respeito a uma projeção de problemas (elementos identificáveis no dia a dia) que as pessoas reconhecem como efetivos em suas rotinas. A distopia realizada é tornada um quadro a partir das operações por meio das quais os atores pautam e explicam as ações a respeito de uma expectativa em relação ao “outro” com que estabelecem contato em suas rotinas, como coloca Machado da Silva (2010), sendo definida no imediatismo situacional da ameaça à integridade física e patrimonial de cada um – integridades a comporem o bem básico (TALONE, 2015a, 2017), elementos entendidos pelas pessoas como estritamente necessário para se sentirem protegidas existencialmente. </P>
<P>Por sua vez, em uma vida social na qual ele esteja introduzido pelas vivências práticas, o interpretante sociabilidade violenta é operado nativamente pelos atores em suas situações cotidianas como base lógica de uma distopia (emergente no interior da linguagem da violência urbana), de forma que a representação a respeito dessa sociabilidade se apresenta como um dispositivo moral abstrato para efetivar, de um lado, ações baseadas na imposição pela mobilização de grande quantidade de força desproporcional – esta, sim, a questão prática em pauta – e, de outro – o que é o ponto mais central a seu respeito –, para efetivar a relação interpretativa de toda uma ordem social política a respeito dela, produzindo quatro principais reações (eventualmente articuláveis entre si): a rendição a essa sociabilidade (na ordem do medo); a intensificação energética da reação a ele (na ordem da mobilização da força); a escandalização com ela (na ordem da crítica); e a naturalização de seus efeitos (na ordem da rotina e da atitude blasé [SIMMEL, 1979[1903]]). Assim como tratado a respeito do termo utopia, na distopia os atores também compreendem a necessidade de preenchimento das ações práticas com um conteúdo abstrato (WEBER, 2001[1904]), alocando-as em uma lógica a garantir sua efetividade, sua geração de consequências. Se o quadro de referência da distopia realizada, nesse sentido, é capaz de permitir a atores mobilizarem “violência”, também é capaz de fazer os outros a temerem – pelo perigo e risco causados ao bem básico – e a usarem como referencial para considerar um mundo dominado por ela e a este reagir – com desconfiança e vários outros dispositivos moralistas –, inclusive também lançando mão da força desproporcional em relação àqueles em primeiro lugar tidos como “muito violentos”, mas especialmente se construirá em torno dessa sociabilidade uma imagem apocalíptica e infernal: trata-se de medo e impossibilidade de interação com vistas a acordos estáveis – a efetivação, neste caso, é universalmente circunstancial (WERNECK, 2016b). </P>
<P>Dessa maneira, a interpretação de que certos atores – os portadores da sociabilidade violenta </P>
<P>– mobilizam desproporcionalmente a força torna-se efetiva por conta do efeito produzido: a mobilização de dispositivos de reação a ela, seja na ordem da paralisia (medo), da vigilância (desconfiança) ou do ataque preventivo (mobilização da força “igualmente” desproporcional). Esses, como já dito, passam a ser interpretados como cabíveis. </P>
</Sect>
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<H4>A força das representações de força: a ‘sociabilidade violenta’ como interpretante efetivador </H4>
<P>De volta à questão da moralidade, afirmar que a sociabilidade violenta envolve moral obviamente não significa sugerir que os atores, ao lançarem mão de enorme quantidade de energia para mobilizar a força desproporcionalmente, são necessariamente altruístas e/ou generosos – poderia até ser o caso, como quando isso é percebido como algo feito em favor dos outros ou para se defender justamente etc. Mas, ora, como já mostrou Werneck (2014b), é de todo simplista tratar a moral como algo redutível à generosidade e ao altruísmo. A afirmação significa, na verdade, que os atores – mesmo no interior de relações conflituosas – compreendem competentemente (embora não necessariamente de forma reflexiva) a necessidade gramatical de preenchimento das ações/estados com um conteúdo abstrato valorativo (WEBER, 1947[1922], 2001[1904]), isto é, alguma lógica comparativa baseada no bem (WERNECK, 2012a) e que garanta sua efetividade, sua geração de consequências. Dessa maneira, a qualificação de uma sociabilidade violenta não pode anular a necessidade de valoração em busca de efetividade. Ela, em vez disso, adota como princípio moral, isto é, de efetivação, uma base centrada, em geral, no regime de bem de si, sustentando-se no fato de os atores se tornarem capazes de em seu próprio favor mobilizarem de forma não rotineira uma força que não seria factível se ela não fosse considerada mobilizável como rotina, como produto de uma grande quantidade de energia sempre presente, e portanto com esse estatuto invisibilizado como questão, já que naturalizado como elemento da própria vida. </P>
<P>De maneira que é preciso acreditar (pragmaticamente, como dissemos) em uma ordem na qual uma grande quantidade de força pudesse ser mobilizada na forma da rotina, pós-efetivada, ajustada, para justamente ser possível mobilizar grande força – como se isso não desse o grande trabalho que dá. O “etos guerreiro”, a “disposição” ou a “gana” são mobilizados em determinado momento, situacionalmente, e podem até ser justificados ou desculpados, mas, antes disso, precisam ser actancializados, fazer sentido em um plano de pura efetividade energética, operacional. A afirmação-chave aqui é: a sociabilidade violenta preenche o uso da força com a informação de que, sim, usar uma força sobre-humana é algo que um humano pode fazer. </P>
<P>Assim, quando Machado da Silva fala em portadores da sociabilidade violenta, reconhecemos em sua fala a possibilidade de uma tradução pragmática como um de dois operadores: a) agentes competentes em mobilizar a distopia realizada para efetivamente reunir grande quantidade de força para uso desproporcional; ou b) agentes tornados objetos de uma efetiva operação de representação a respeito de sua associação integral com a mesma distopia – tornando-se actantes de seu sistema actancial (WERNECK, 2015a) – ou, nos termos de Machado, “portadores” de sua linguagem, traduções mais sintéticas de sua operatividade. Ora, nos dois casos estamos falando de um desvio. Não um desvio moral/legal, nos moldes da clássica sociologia do desvio (BEST, 2003; BECKER, 2008[1963], pp. 179-207), mas de um desvio de percurso, um atalho lógico, que os signos virtuais (i. e. potenciais) costumam adotar para dar conta de sua efetividade: quem é apontado como portador da violência o é porque é notado mobilizando força desproporcional por alguém que vive em um mundo em que isso é moralizado negativamente. E como é notado, vira objeto de observação e, portanto, índice de recorrência e, em consequência disso, de rotinização. Mas, empiricamente, as pesquisas mostram mesmo é que a mobilização desse nível de força é um momento, uma ruptura, e que o que isso tem de recorrente e rotineiro é seu elemento virtual, de representação, seu braço coercitivo: na vida cotidiana, a sociabilidade violenta é uma ferramenta mais do medo (BATISTA, 2003) do que de ações concretas. </P>
<P>A partir da discussão anterior, podemos pensar um modelo extensivo para se descrever a concretização de uma ação social, dividindo a cena dessa concretização em dois processos de concretização: um moral, posto em prática do ponto de vista da adequação conveniente (THÉVENOT, 1990)/competente (BOLTANSKI e THÉVENOT, 1991, 1999)/efetiva (WERNECK, 2012a) a quadros de referência gramaticais valorativos do ponto de vista interpretativo; e outro, operacional-moral, colocado em ação do ponto de vista da pura factibilidade, e portanto de uma efetividade lógica e/ou energética da ação. Isso chama a atenção para o fato de ser preciso contemplar os elementos universalizáveis como forma abstrata das possibilidades de conferir factibilidade a ações. Boltanski (1990) sublinha que o primeiro ponto avaliado em uma situação de questionamento gira em torno de um “julgamento de normalidade”. Bem, essas avaliações de sanidade (como ele descreve) não são (necessariamente) avaliações de justiça – conquanto sejam avaliações de justeza (BOLTANSKI e THÉVENOT, 1991)35. Não se trata de uma questão de legitimidade. Trata-se de um plano de questionamento mais básico, mais operativo, relacionado a um conjunto de regras partilhadas que dizem respeito ao pertencimento ao mundo – não a mundos específicos, mas ao mundo como uma unidade lógica coerente e sustentável –, à realidade. É nesse plano que é necessário se perguntar sobre a factibilidade: é uma questão de passagem ao ato, do potencial ao fato. Na avaliação de factibilidade, as pessoas estão se perguntando se os entes envolvidos e todos os signos que eles são e que trazem ou geram atendem à condições mínimas para começo de conversa. Desse ponto de vista, o elemento mais central da sociabilidade violenta é menos o fato de algumas (poucas) pessoas – afinal, a hipótese de Machado da Silva fala em sociabilidade emergente, em formação/consolidação – agirem praticamente, verdadeiramente, segundo um cânone de uso desproporcional da força e, sim, mais o fato de haver pessoas capazes de viver assim ser algo passível de crença (pragmática) por algumas (muitas) pessoas, entre elas, aliás, as próprias pessoas que se crê viverem assim. Pois a riqueza que o conceito de Machado da Silva permite captar é que o que ele descreve não é puramente um tipo ideal. É mais, muito mais, um ideal-tipo, ou seja, uma idealidade, uma metafísica, que se efetiva como dispositivo recorrente: uma vez consolidada como representação partilhada, ela assume autonomia como um plano abstrato ao qual os atores recorrem em situação. </P>
<P>Pensada nos dois registros da ideia de sociabilidade que apresentamos, a abordagem de Machado da Silva, então, define dois fenômenos articulados: em plano individual, trata-se da formação de um self (isto é, a forma sígnica de um ator social) cuja face que mais se externaliza é marcada pelo recurso à força desproporcional. Esse self (ou melhor, esses selves, já que se trata de imaginar a muitos agindo dessa forma) é, por efeito do interpretante sociabilidade violenta, capacitado a mobilizar a energia necessária para isso no plano das ações/situações, efetivando esse recurso. E sua formação encontraria objetividade histórica – defendida pelo autor por meio da ideia de “portador” – em um processo de internalização do filtro actancial próprio a essa sociabilidade operado pela abstração metafísica da dimensão experiencial do outro polo (descrita a seguir)36. Em um plano societal, por sua vez, tem lugar a formação de uma metafísica difusa – na forma de uma representação social segundo a qual o alcance do poder e da ameaça daqueles selves é generalizado para toda a ordem –, construindo-se com isso uma gramática de ordenamento distópica, estabelecedora, em um plano das ações/situações, de uma série de práticas e processos sociais vis-à-vis aqueles mesmos selves, em quatro principais formas: movimentos baseados no medo; reações em termos de força física ou simbólica – inclusive nos limites da “desumanização” (FREIRE, 2010; FREIRE e TEIXEIRA, 2016); manifestações críticas </P>
<P>– notadamente acusatoriais (WERNECK e LORETTI, 2018); e a rotinização da presença dessa distopia. A formação desse processo encontraria objetividade histórica na generalização para o plano gramatical da situação paradigmática de exercício da força enormemente desproporcional. </P>
<P>Dessa maneira, nosso argumento aqui foi que o tratamento situacionista revela uma pujança do conceito que tanto uma abordagem puramente individualista quanto uma abordagem plenamente holista acabam por eclipsar (KNORR-CETINA, 1981): a vantagem de uma abordagem pragmática é apontar para a sociabilidade violenta como uma condição de possibilidade – e portanto como algo passível de atuar ou não, conforme a situação – independentemente de ela ser ou não um dado ecológico perene e sempre atuante. Como interpretante, ela é a condição de operacionalização da força em enormes quantidades desproporcionalmente sobre seus objetos e com efeitos destrutivos para estes, o que em vários regimes de qualificação empiricamente observados tem sido descrito pelos próprios atores sociais em geral como inaceitável. Além disso, o situacionismo, ao enfatizar o processo de efetivação, das definições de situação (THOMAS, 1969[1923]), chama atenção para o caráter contingente da concentração de energia envolvida na mobilização de força para as ações descritas pelos próprios atores como desumanamente violentas. A proposta, aqui, então, foi interpelar os momentos em que essas ações tenham lugar e pensar a sociabilidade violenta como – no limite – um dispositivo metafísico; este, sim, consolidado e plenamente estabelecido na gramática de sociabilidade urbana das grandes cidades modernas e capaz de efetivar ações sociais situadas dependentes de grande quantidade de força e com amplo potencial de destruição, sem recorrer a uma gramática do justo que as qualifique na lógica da coerção legítima – caso que, aliás, por definição, expurga a possibilidade de um recurso contínuo a essa força (WERNECK, TEIXEIRA e TALONE, 2018). Evidentemente, essa abordagem permite ainda perceber o duplo caráter dessa metafísica, já que ela é plenamente visível para os atores sociais como representação e se torna objeto de avaliações morais: é comum ver ser chamado de “monstro” ou “psicopata” o personagem que habitualmente lança mão da força desproporcional para sua gestão das situações, seja por uma atuação situada (ações violentas) relativamente recorrente – embora nunca perene – seja por projeções de porvir (o medo provocado pela mitologia das ações violentas que acaba por produzir efeito coercitivo). Esse olhar externo se desdobra, no trabalho de Machado da Silva, na descrição de um conjunto de ordens legítimas em disputa, ordens morais essas que julgam de formas variáveis (entre si e em seus próprios interiores) a metafísica de força, chegando a representar sua generalização como uma versão radicalizada da linguagem da violência urbana, como aquilo que aqui chamamos de distopia realizada. O que quisemos mostrar aqui é que a produtividade do conceito de Machado da Silva ultrapassa o problema da positividade de primeira ordem para se amplificar na produtividade metalinguística, na actância das representações de força: a representação de uma sociabilidade violenta como dado da ecologia urbana é um dispositivo fundamental para tornar parte da vida equacionável pelos atores, a saber, situações nas quais a destruição completa e a força agigantada sejam efetivas. E é nesse sentido que ela se configura como distopia realizada: é a versão mais ideal, mais pura, desse uso absoluto da força. E, como tal, só pode comparecer no mundo por meio de dispositivos construídos pelos atores e preenchidos por esse interpretante e, ao mesmo tempo, não pode comparecer no mundo na plenitude de seu ser ideal: não se pode viver na sociabilidade violenta. Mas ela, como a descrevemos aqui, está no mundo, e na vida, a atua sobre e por meio dos atores. </P>
<P>Este último quadro sintetiza nosso argumento central: </P>
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<ImageData></ImageData>
Elaboração própria </Figure>
</Sect>
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<H4>Notas </H4>
<P>1 Este texto apresenta um diálogo entre resultados de projetos de pesquisa financiados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq, Edital Universal 14/2011, processo 486355/2011-0) e pela Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj, Edital de Pesquisa Básica, APQ1, processo E26/110.327/2014) e de uma dissertação de mestrado financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes, código 001). </P>
<P>2 Para duas discussões densas do conceito, ver Misse (2016, 2017) e Werneck, Teixeira e Talone (2018). </P>
<P>3 Por exemplo, as teses de Paiva (2012), Franco (2014) e Rocha (2017). Mas o trabalho desse tipo mais claramente centrado no conceito é a tese de Márcio Abreu França (2015). França, aliás, contribui com este dossiê (FRANÇA, 2019). </P>
<P>4 A crítica mais aberta ao conceito é de Zaluar (2014, 2018). A autora, no entanto, reifica as interpretações de Georg Simmel e Marcel Mauss para a ideia de sociabilidade, tomando-as como referências incontornáveis para sua avaliação, e negligencia a abordagem pragmática, contingencialista e, como veremos adiante, especialmente conflitualista de sociabilidade de Machado da Silva. Apesar disso, seu ensaio da questão serve como uma referência para o debate sobre como violência e sociabilidade podem participar de um mesmo tratamento analítico. </P>
<P>5 Grifo nosso, mas expressando um destaque do próprio autor em sua apresentação, ao flexionar enfaticamente a palavra. </P>
<P>6 Ver, sobre isso, Latour (1997[1987]); Peters e Charlier (1999); Werneck (2015b, pp.192-193); Lemieux (2018, pp. 43-46). </P>
<P>7 Essa descrição faria, a princípio, a sociabilidade violenta se aproximar da ideia de frame, de Goffman (2012[1974]), como um quadro sintetizador mais de comportamentos do que de critérios de avaliação (competências). Mas queremos insistir em um tratamento gramatical com a base na ideia de efetividade (WERNECK, 2012a), argumento mais elaborado adiante. </P>
<P>8 Werneck chama de moralista a definição de situação que simplifica a complexidade moral do mundo, alienando outros quadros morais em favor de um único, em referência ao qual se instaura um movimento não de crítica/accountability, mas de acusação/intervenção sobre a agência. No limite, toda legislação incorporada ao aparato formal do Estado é resultante de uma interpretação moralista da vida social – na qual um comportamento em desacordo com regra moral X (mas em acordo com regra moral Y) é expurgado da pauta de movimentos permitidos aos atores com base na petrificação da regra moral X. </P>
<P>9 Estamos evitando propositalmente o termo positivista, para não promover uma associação descabida entre toda abordagem fundada numa positividade estrita e a corrente filosófica de Comte. </P>
<P>10 Toda abordagem compreensiva, como interpretação científica que é, pressupõe também uma positividade, depositada, nesse caso, no processo de entrelaçamento entre metafísica e pragmática. A positividade de uma abordagem positiva – e que fundamenta sua definição (notadamente em sua versão mais radical, o positivismo) – está na pura pragmática – na qual a metafísica comparece ou como resultante descritiva (teoria) ou como integrante mesma (como nas metafísicas de Durkheim, plenamente objetivadas; por exemplo, a representação coletiva). Em um modelo estritamente positivo, os fatos são interpretados com uma objetividade plenamente independente dos atores. Em uma abordagem compreensiva, volta-se a atenção para o papel desempenhado pela interpretação dos atores na construção dos fatos e elas são tratadas como os fatos a serem analisados. Ora, uma forma de se ler essa dicotomia é não a tratando como antinomia, mas como tipologia: uma opta por enfatizar uma dimensão dos fenômenos enquanto outra, outra. </P>
<P>11 Aqui, como em Werneck, Teixeira e Talone (2018), ao falarmos de “sociologia”, nos referimos a uma episteme e não à disciplina – e a várias epistemes e não (simplesmente) a áreas da disciplina. Por ela, entendemos uma fala analítica sobre o social em sentido amplo – incluindo discurso acadêmico formal, mas também outros discursos (entre eles, as falas dos atores sociais comuns). Assim, em todas as citações ao termo remetidas a esse texto, o sentido será esse, salvo quando indicado. </P>
<P>12 Essa abordagem ainda se aproveita de um regime crítico, uma vez que ao mesmo tempo aponta para a extrema violência dos criminosos, explicita como o controle social promovido sob o signo da ordem social moderna é também uma prática fundada na violência contra as classes menos favorecidas – passando-se da hegemonia de uma linguagem dos direitos a uma hegemonia da linguagem da violência urbana. Optamos por explicitar essas duas dimensões por conta de sua relevância mais central para este argumento. </P>
<P>13 Afirmação feita no 39o Encontro Anual da Anpocs, no Seminário Temático Sociologia e Antropologia da Moral. </P>
<P>14 Como parece ser claro, a “força” pode em algumas circunstância ser uma metonímia da ação afetiva, já que pode ser lida como transbordamento, extravasamento de emoções. Mas, mesmo nesse caso, ela funciona como significante, já que, objetivamente, permanece como resultado da emoção e não sua causa. Evidentemente, essa conversa não diz respeito à força colocada em ação por um indivíduo A e que cause a reação de contraforça em outro, B. Mesmo nesse caso, ela não pode ser considerada a “causa” da ação de B, já que foi algum movimento interno de si por ter sido objeto da “agressão” de A o que causou a reação em B – esse movimento interno pode, ainda nos termos de Weber, ser um reflexo defensivo ou uma emoção elaborada, uma resposta com base em valores ou uma vingança com um fim. </P>
<P>15 Para uma discussão sobre a relação entre energia e violência, ver Collins (2008). </P>
<P>16 Como é central em se tratando do pensamento de Weber, a precedência aqui não se refere à dimensão temporal – já que o autor trata analiticamente o a posteriori empírico como se fosse a priori por meio da noção de tipo ideal (RINGER, 1997). A questão é o apontamento de um motivo que funcione (isto é, se mostre efetivo) como princípio sustentador da ação. E essa anterioridade é filtrada por um olhar coerentista, que trata como racionalidade mesmo aquilo que seja não racional (por exemplo, propondo uma orientação de sentido – uma base de coerência – cujo fundamento são as emoções). Assim, estamos conscientes do fato de essa descrição “racionalista” de Weber fazer parecer que os atores sociais são conscientes e reflexivos na condução desse processo. O próprio autor (1947[1922]), no entanto, explicita o caráter típico-ideal das orientações de sentido – e sua relação analítica formal com a anterioridade causal. Não se trata, então, de um conjunto de cálculos de dispêndio energético anteriores à ação, mas de uma descrição dos elementos necessários para se concretizar o que se faz enquanto se faz, no decurso desse movimento. Desse ponto de vista, é bastante limitado o quadro de possibilidades de a sociologia saber, em primeira instância, por que uma ação individual ocorre (essa primeira instância caberá em geral a outras disciplinas, conforme a reivindiquem, como a psicologia, a filosofia ou mesmo a física das subpartículas). É muito mais possível a ela saber por que ela ocorre em última instância – isto é, o que de social permite que ela ocorra. Para mais sobre esse debate em Weber, ver Sell (2013). Para uma discussão especificamente sobre as zonas cinzentas socialmente operadas desse “imperativo de racionalidade” da sociologia da moral, ver Werneck (2018a). </P>
<P>17 Além dos de Misse, Machado da Silva, Porto (ver 1999), Zaluar (especialmente, 2004), Edmundo Campos Coelho (para uma síntese de seu trabalho, ver 2005) e de outros textualmente citados ao longo do texto, destacamos os de Teixeira (2012, 2013) e Freire (2010, 2014), mas nos reportamos a um vasto universo de trabalhos desenvolvidos por pesquisadores do Rio de Janeiro sobre a violência e o crime no estado que animam nossas leituras e nos inspiram de várias maneiras, universo ao qual fazemos aqui justiça em sentido amplo. Explora-lo caso a caso ultrapassaria os limites – inclusive espaciais </P>
<P>– deste texto e os citamos mais pontualmente em Werneck, Teixeira e Talone (2018). Para revisões analíticas recentes dos estudos de violência, ver Nóbrega Júnior (2015), Ratton (2018), Aquino e Hirata (2018) e Costa e Lima (2018). </P>
<P>18 Neste caso, como é notório, a autora se inspira na obra de Norbert Elias. </P>
<P>19 O caráter não rotineiro da mobilização da força desproporcional aqui apontado não pode ser pensado como impeditivo para (ou como negação nossa de) sua recorrência. As pesquisas sobre crimes nas grandes cidades brasileiras, especialmente aquelas sobre homicídio – sobre isso, ver Silva (2006, 2013), Ribeiro (2009) e Costa e Lima (2017) –, evidenciam o quão recorrentes e “violentos” eles são. A questão da rotina aqui está ligada à percepção dessa recorrência como carne mesma da vida social: essa mobilização de energia é mais rara do que os momentos em que ela não é mobilizada, e é justamente essa raridade que lhe confere o caráter de singularidade que a torna escandalosa para os atores. </P>
<P>20 As ideias de actancialidade e sistema actancial foram introduzidas por Bruno Latour a partir do conceito de actante, proposto pelo linguista lituano radicado na França Algirdas Greimas (1976[1966]), proponente de um modelo semiótico dedicado a analisar narrativas chamado narratologia. Segundo o próprio, o actante é aquele ou aquilo que pratica um ato. Trata-se de um ente dotado de capacidade determinadora do que ocorre em uma narrativa. E esse ente pode ser de qualquer natureza, uma pessoa, um animal, um objeto, uma ideia. Latour, juntamente com Michel Callon, se utiliza de Greimas no modelo dos atores-rede, a fim de construir logicamente a ideia de simetrização, ou seja, a inclusão de todos os entes contidos em uma situação em um mesmo plano analítico, não os diferenciando em termos de agência (o que permitiu analisar em um mesmo quadro os seres humanos e os não humanos em laboratório). Um sistema actancial é uma disposição de elementos que situa logicamente uma actancialidade, uma lógica de determinação de ação. Observação: na tradução brasileira do citado livro de Greimas, optou-se por traduzir actant como “atuante”. Mantivemos, no entanto, o formato “actante”, para explicitar sua peculiaridade conceitual. </P>
<P>21 Esses diferentes regimes de interpretação da sociabilidade podem se inter-relacionar ou mesmo sobrepor, conforme o modelo teórico em questão. De fato, a clássica dicotomia ator x estrutura pode ser lida como antinomia a respeito de que polo desse esquema determina o outro – por exemplo, em Durkheim (2003[1912]), o impulso antropológico para o social é necessariamente produzido de forma societal; ao passo que, em Weber (1947[1922]), as construções societais são resultantes de uma filtragem actancial fundamentada nas atribuições de sentido intersubjetivas. </P>
<P>22 Para uma discussão sobre a relação entre regime de violência e sociabilidade violenta, ver Freire (2010) </P>
<P>23 Lemieux (2018, p. 58) afirma que o conceito pragmático de gramática se afasta do modelo gerativo de Chomsky. Discordamos fortemente dessa afirmação. O autor concentra sua distinção na parcela mais etiológica/naturalista da abordagem do linguista, segundo a qual o aprendizado das línguas conta com uma fundamentação biológica inata e de acordo com a qual não se deve tomar a performance como medida da eficácia linguageira – embora não explicite a discordância com a maneira como Bourdieu (2000[1972]) se apropria do termo para tratar de seu “estruturalismo gerativo”. Ora, como não se trata de uma teoria das origens da apreensão das competências, mas de sua operatividade, a descrição pragmática de gramática é fundamentada justamente no conceito de competência, central para Chomsky, e se beneficia ainda justamente da geratividade, o caráter flexível/criativo do exercício prático da metafísica gramatical. </P>
<P>24 Para a descrição de Machado da Silva sobre sua inflexão do modelo, ver Machado da Silva et al. (2011). </P>
<P>25 Possivelmente a mais forte descrição desse tipo é a de Marx e Engels (2007[1845-1846]), que n’A ideologia alemã (p. 34) descrevem o social como cooperação (Zusammenwirken), termo que neles significa simplesmente co-operação, atuação conjunta, um mero paralelismo (e eventual coordenação) de atuação – cujo fundamento, ainda segundo esses autores, é a satisfação das necessidades naturais. Como é bem sabido, na abordagem marxista, a coordenação se dá forçosamente, pela atuação forte de uns sobre os outros, seja do ponto de vista da coerção objetiva seja por meio da ideologia e da alienação. </P>
<P>26 Este é um ponto fundamental, pois a polêmica sobre a justificação das ações de força desenha uma disputa entre múltiplas moralidades – que, no campo dos estudos de violência se desdobra desde uma disputa entre “o justo” e “o certo” em vários trabalhos sobre o mundo do crime (Grillo, 2013, 2014) até a legitimidade absolutamente circunstancial e situada do uso da força em um linchamento (Rodrigues, 2012). </P>
<P>27 Por exemplo, Bittner (1970, p. 233) define polícia como “um mecanismo de distribuição de uma força coercitiva não negociável, colocada a serviço de uma compreensão intuitiva das exigências de uma situação”. Ver ainda Alpert e Dunham (2004). </P>
<P>28 Como caracterizamos força como ente físico pré-qualificação, esse "fazer" que atua sobre o fazer de outrem é independente de alguma noção de poder – o que ocorre apenas quando se adentra no plano de uma episteme crítica, como mostramos em Werneck, Teixeira e Talone (2018). Isto é, a força, nessa descrição, não tem vontade. De fato, expressivamente isso só ocorre por prosopopeia ou metonímia: dizer que a força faz algo é, na verdade, dizer que alguém fez algo usando a força – mas "como se" não houvesse alguém a exercendo e como se a força fosse um ente animado em si. Seu sujeito, no entanto, é algo a ser analisado em outra esfera, aqui colocada entre parênteses, mas analisada mais a fundo por nós no texto já citado. </P>
<P>29 Nesse sentido, a ponte entre sujeição criminal e sociabilidade violenta se encontra na relação entre a resultante da primeira e o ponto de partida da segunda, justamente o ator sobre o qual se deposita a expectativa de uma ação de pura força, o portador da sociabilidade violenta, do qual se desconfia que ingressará nas situações impositivamente e de forma destrutiva e sem qualquer perspectiva de contenção. </P>
<P>30 Como coloca Dewey (1929), ter consciência de algo implica pensarmos, por um lado, em fatos óbvios de atenção/interesse, e, por outro, no funcionamento de hábitos estabelecidos e assegurados. Nossos hábitos mais profundos seriam aqueles dos quais temos menos consciência. Porém, deparando-se com uma situação incomum, realizamos um ajuste: há um choque e ativamos a percepção quanto à dissolução e a reforma do significado. A atenção é mais alerta nas “situações inusitadas” devido à preocupação e às expectativas quanto ao que será. Ao estarmos em alerta, nos concentramos no ponto de necessidade iminente, de urgência. São situações em que se altera o “clima” nos ambientes (CAVALCANTI, 2008), antes “normalizados”. </P>
<P>31 Como afirma o historiador Gregory Claeys, autor de um denso livro dedicado às distopias: “A palavra distopia é derivada de duas palavras gregas, dus e topos, significando um lugar doente, ruim, defeituoso ou desfavorável” (2017, p. 4). Normalmente conceberíamos distopias pensando-as a partir da literatura ou da cinematografia, mas “[há] usos não literários e empíricos do termo” (Idem, p. 5). Trata-se do dado primordial e característica mais relevante do livro e que destacaremos em seguida por meio de uma abordagem sociológica pragmática: distopias podem não apenas existir nesse exato momento, como foram a realidade de diferentes grupos ao longo da história. </P>
<P>32 Diferentes estados hierarquicamente distintos ocupados pelas pessoas em uma dada situação, ainda que cotidiana. Não se trata de um valor ou de um tamanho – definidor identitariamente dos atores –, mas de magnitudes referentes a um ordenamento situado cujo caráter de justo é presente. É um elemento primordial para se chegar a acordos suscetíveis de generalidade. É a grandeza, baseada em princípios gerais de equivalência, que pode levar determinado acordo possível a ser aceito por todos (BOLTANSKI e THÉVENOT, 1991, p. 77). </P>
<P>33 Em sua tradução brasileira de De la justification, no prelo no momento da publicação deste texto, Werneck opta por manter o termo cité sem tradução, sugerindo sua incorporação direta à língua portuguesa. Isso porque, muito embora traduções tradicionais tenham optado por Cidade (com maiúscula) para indicar esse tipo de circunscrição política – por exemplo, nas versões em português de A Cidade de Deus, de Santo Agostinho – o termo original não apenas conta com uma enorme peculiaridade teórica como sua tradução como cidade poderia induzir uma série de decorrências da metáfora geográfica que poderiam induzir a erro: especialmente, uma cité não é um ambiente circunscrito do qual se entra e se sai, é mais um recurso abstrato de que se lança mão ou não. </P>
<P>34 Um dos detalhes centrais da abordagem de Machado da Silva é seu caráter ao mesmo tempo teórico, abstrato, e profundamente circunscrito: a sociabilidade violenta diz respeito, pelo menos a princípio, ao Rio de Janeiro. Nesse estado, especialmente em sua capital, opera, mostram muitas pesquisas (por exemplo, LEITE, 2000; TALONE, 2015a), uma rotinização conferidora de sentido aos problemas observados a partir da complexificação do quadro da linguagem da violência urbana. A cidade é vista como um cenário que pôde ser chamado de distópico no sentido em que nela seria inevitável ingressar em brigas, desentendimentos, e/ou ser assaltado, furtado, desrespeitado, violentado, enganado, morto, entre outros exemplos. As pessoas locomovem-se e agem pela cidade a partir dessa representação. </P>
<P>35 Ou, nos termos de Boltanski e Thévenot (1991), pode-se dizer que todo fenômeno (moralizado) tem uma dimensão de justiça e uma dimensão de justeza, isto é, uma dimensão abandonada às interpretações dos atores (na qual o justo é o que eles consideram equivalente) e uma dimensão entregue a uma agência puramente objetiva (na qual o justo é o que “encaixa”, está de acordo com um critério passível de testagem/comprovação [épreuve] independente das subjetividades). Não se trata, entretanto, de se dizer que toda cité faz compromisso com a cité industrial, mas que toda efetivação conta com alguma carga de justeza (que caracteriza em generalidade esta cité) como critério necessário, embora em geral não suficiente. </P>
<P>36 Ver, sobre a construção desse self, especialmente do ponto de vista criminal, não apenas o seminal trabalho de Misse (1999) sobre a sujeição criminal como também o enormemente perspicaz trabalho de Teixeira (2012) sobre as várias representações dessa formação como teorias nativas sobre a fundamentalização do crime. </P>
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<P>________. (2011b), “O ‘egoísmo’ como competência: Um estudo de desculpas dadas nas relações de casal como forma de coordenação entre bem de si e moralidade”. Revista de Antropologia, Vol. 54, no 1, pp. 133-190. </P>
<P>________. (2012a), A desculpa: As circunstâncias e a moral das relações sociais. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira. </P>
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<P>________ (coord). (2015c), Violências moduladas: Gramáticas e dispositivos da crítica e da negociação na conflitualidade urbana no Rio de Janeiro. Relatório de pesquisa, Faperj. </P>
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<P>________. (2018b), O Moralismo Ostentatório: Um Estudo do Papel da Crítica Acusatorial nos Mundos Público e Privado. Projeto de pesquisa, CNPq. </P>
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<P>ALEXANDRE WERNECK (av.werneck@uol.com.br) </P>
<P>é professor do Departamento de Sociologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ, Brasil) e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia (PPGSA) da UFRJ e coordenador efetivo de pesquisas do Núcleo de Estudos de Cidadania, Conflito e Violência Urbana (Necvu) da UFRJ. É doutor em sociologia pelo PPGSA/UFRJ (com estágio doutoral na École des Hautes Études en Sciences Sociales, EHESS, Paris, França), tem mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da Escola de Comunicação (ECO) da UFRJ e graduação em comunicação social pela ECO/UFRJ. </P>
<P>VITTORIO TALONE (vittorio.talone@gmail.com) </P>
<P>é doutorando do Programa de Pós-Graduação em Sociologia (PPGS) do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj, Brasil) e pesquisador associado do Necvu. É mestre pelo PPGSA da UFRJ e graduado em ciências sociais pela mesma universidade. </P>
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