Contribuições da ortografia para a análise de fenômenos fonológicos: o caso de sequências #(i)sC no português brasileiro

Autores

DOI:

https://doi.org/10.24206/lh.v7i2.40702

Palavras-chave:

Sibilantes. Ortografia. Redução vocálica. Detalhe fonético. Teoria de Exemplares.

Resumo

Este artigo trata de sequências formadas por sibilante [s] + consoante que podem ou não ser precedidas por uma vogal [i] em início de palavra no português brasileiro. Essas sequências são referidas como sequências #(i)sC. Exemplos de palavras que apresentam as sequências #(i)sC investigadas neste estudo são escola: [iskɔla] ~ [skɔla] e spray: [ispɾej] ~ [sprej]. As palavras analisadas compreendem padrões ortográficos distintos: ⟨#esC⟩ e ⟨#sC⟩. Foi testada a hipótese de que cada padrão ortográfico se relaciona a diferentes taxas de ocorrência da vogal e a diferenças no detalhe fonético em sequências #(i)sC por meio de uma investigação experimental. Os resultados demonstram que a ocorrência da vogal inicial é favorecida em palavras com o padrão ⟨#esC⟩ em comparação a palavras com o padrão ⟨#sC⟩. Também foram atestadas diferenças na duração da vogal, mais longa em palavras com o padrão ⟨#esC⟩ do que em palavras com o padrão ⟨#sC⟩. É discutido como que padrões ortográficos, que têm trajetória histórica distinta na língua, podem se relacionar a diferentes realizações fonéticas. Também é explorado o papel que o detalhe fonético tem em caracterizar diferentes conjuntos de palavras. Argumenta-se que a forma ortográfica das palavras pode representar evidência útil para a análise de fenômenos fonológicos. Para isso, a análise é realizada à luz dos modelos teóricos da Teoria de Exemplares e da Integração de Múltiplos Padrões.

Biografia do Autor

Matheus Freitas, Universidade Federal de Minas Gerais

Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos da Universidade Federal de Minas Gerais, na área de Linguística teórica e descritiva, na linha de Estudos Formais da Linguagem, com interesse na área de Fonética e Fonologia. Atualmente bolsista da CAPES. Mestre em Estudos Linguísticos pela Universidade Federal de Minas Gerais; graduado em Letras pela Universidade de Ouro Preto.

Referências

BAAYEN, R.; DAVIDSON, D.; BATES, M. Mixed-effects modeling with crossed random effects for subjects and items. Journal of Memory and Language, n. 59, p. 390–412, 2008.

BATES, D.; MÄCHLER, M.; BOLKER, B.; WALKER, S. Fitting Linear Mixed-Effects Models Using lme4. Journal of Statistical Software, v. 67, n. 1, p. 1–48, 2015.

BISOL, Leda. A sílaba e seus constituintes. In: NEVES, M. H. M. (org). Gramática do Português Falado, v. VII. Campinas: Editora da Unicamp, 1999. p. 701–739.

BOERSMA, P.; WEENINK, D. Praat: doing phonetics by computer [Programa de computador]. Versão 5.4.08, de 24 de março de 2015. Disponível em: http://www.praat.org/.

BYBEE, J. Phonology and language use. Cambridge: Cambridge University Press, 2001.

BYBEE, J. From usage to grammar: the mind’s response to repetition. Language, v. 82, n. 4, p. 711–733, 2006.

BYBEE, J. Language, Usage and Cognition. Cambridge: Cambridge University Press, 2010.

CANTONI, M. M. A epêntese no português brasileiro em uma perspectiva multirrepresentacional. Gragoatá, n. 38, p. 231-246, 2015.

CHEVROT, J. L’effet Buben: de la linguistique diachronique à l’approche cognitive (et retour). Langue française, n. 129, p. 104-125, 1999.

COLLISCHONN, G. A epêntese vocálica no português do sul do Brasil: análise variacionista e tratamento pela Teoria da Otimalidade. Letras de Hoje, v. 35, n. 1, p. 285–318, 2000.

COLLISCHONN, G.; SCHWINDT, L. C. Considerações sobre a sequência /sC/ inicial em Português Brasileiro. Revista Lingua(gem), Macapá: ILAPEC, v. 3, p. 249–266, 2005.

CRISTÓFARO-SILVA, T.; ALMEIDA, L. S. On the nature of epenthetic vowels. In: BISOL, L.; BRESCANCINI, C. (org.). Contemporary Phonology in Brazil, 1a. ed. Cambridge: Cambridge University Press – Cambridge Scholars Publishing Series, 2008. p. 193-212.

CRISTÓFARO SILVA, T.; FREITAS, M. sC-clusters in Brazilian Portuguese. Journal of Portuguese Linguistics, v. 19, n. 1, p. 1–14, 2020. DOI: http://doi.org/10.5334/jpl.231

D’ANDRADE, E.; RODRIGUES, M. C. Das Escolas e das Culturas: História de uma sequência consonântica. In: Actas do XIV Encontro Nacional da Associação Portuguesa de Linguística. Lisboa: APL/Colibri, 1999. p. 117-133.

FREITAS, M. A redução segmental em sequências #(i)sC no português brasileiro. 2019. Dissertação (Mestrado em Estudos Linguísticos) – Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte. Disponível em: http://hdl.handle.net/1843/LETR-B9MG2V.

GONÇALVES, M. F. A Ortografia Nacional (1904) de Gonçalves Viana e as ideias ortográficas dos reformistas sul-americanos. Eutomia, v. 1, n. 6, p. 1–17, 2010.

GONÇALVES VIANA, A. R. Ortografia Nacional. Simplificação e uniformização das ortografias portuguesas. Lisboa: Livraria Editora Viúva Tavares Cardoso, 1904.

HAMANN, S. Ghost phonemes in second languages: How orthography can create contrasts without perceptual correlates. In: 15th Old World Conference on Phonology. Londres: University College London, 2018. (Comunicação oral)

HAMANN, S.; COLOMBO, I. A formal of the interaction of orthography and perception: English intervocalic consonants borrowed into Italian. Natural Language & Linguistic Theory, n. 35, p. 683–714, 2017.

HARRIS, J. Epenthesis Processes in Spanish. In: NEIDLE, C.; CEDEÑO, R. A. N. (eds.). Studies in Romance Languages, v. 25. Foris: Dordrecht, 1986. p. 107-122.

HOUAISS, A.; VILLAR, M. S. Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa. Elaborado pelo Instituto Antônio Houaiss de Lexicografia e Banco de Dados da Língua Portuguesa S/C Ltda. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.

ITŌ, J.; MESTER, A. Japanese Phonology. In: GOLDSMITH, J. (ed). The Handbook of Phonological Theory. Blackwell, 1995. p. 817–838.

ITŌ, J.; MESTER, A. The structure of the phonological lexicon. In.: TSUJIMURA, N. (ed). The Handbook of Japanese Linguistics. Malden, MA, e Oxford, U.K.: Blackwell Publishers, 1999. p. 62-100.

JOHNSON, K. Speech perception without speaker normalization: An exemplar model. In: JOHNSON, K.; MULLENIX, J. W. (eds.). Talker Variability in Speech Processing. San Diego: Academic Press, 1997. p. 145-165.

JOHNSON, K. Decisions and mechanisms in exemplar-based phonology. In: SOLE, M.; BEDDOR, P.; OHALA, M. (eds.). Experimental Approaches to Phonology. Oxford: Oxford University Press, 2007. p. 25–40.

KAYE, J. Do you believe in magic? The story of s+C sequences. SOAS Working Paper in Linguistics and Phonetics, v. 2, p. 293–313, 1992.

LENNES, M. Calculate segment durations. Script para Praat. 2002. Disponível em: http://www.helsinki.fi/~lennes/praat-scripts/public/calculate_segment_durations.praat. Acesso em 8 de setembro de 2018.

LEVITT, J. The influence of orthography on phonology: a comparative study (English, French, Spanish, Italian, German). Linguistics, 208, p. 43–67, 1978.

LOVINS, J. Loanwords and the phonological structure of Japanese. Linguistics Club, v. 163, n. 1, 1975.

MADUREIRA FEIJÓ, J. de M. Orthographia, ou arte de escrever, e pronunciar com acerto a lingua portugueza para uso do excellentissimo duque de Lafoens. Lisboa Occidental: Na Oficina de Miguel Rodrigues, 1734.

MATTINGLY, I. G. Linguistic awareness and orthographic form. Advances in Psychology, v. 94, p. 11–26, 1992.

MENESES, F.; ALBANO, E. From Reduction to Apocope: Final Poststressed Vowel Devoicing in Brazilian Portuguese. Phonetica (Basel), n. 72, p. 121-137, 2015.

MORAIS, J.; CARY, L.; ALEGRIA, J.; BERTELSON, P. Does awareness of speech as a sequence of phones arise spontaneously?. Cognition, v. 7, p. 323-331, 1979.

PIERREHUMBERT, J. Exemplar dynamics: word frequency, lenition and contrast. In BYBEE, J.; HOOPER, P. (eds.). Frequency and the emergency of linguistic structure. Amsterdam: J. Benjamins, 2001. p. 137-157.

PIERREHUMBERT, J. Probabilistic Phonology: discrimination and robustness. In: BOD, R.; HAY, J.; JANNEDY, S. (eds.). Probability theory in linguistics. Cambridge, MA: The MIT Press, 2003. p. 177–228.

PIERREHUMBERT J.; BECKMAN, M.; LADD, R. Conceptual foundations of phonology as a laboratory science (reprint from 2000). In: COHN, A.; FOUGERON, C; KUFFMAN, M. (eds.). The Oxford Handbook of Laboratory Phonology. Oxford: Oxford University Press, 2011 [2000]. p. 1–23.

POLGÁRDI, K. The representation of sC-clusters: A CV analysis. In: BERCÉS, K. (ed.). Proceedings of the Government Phonology Roundtable 2017, Budapest, Hungria, 18 de novembro de 2017. Budapest: Pázmány Péter Catholic University.

PURSE, R. Variable Word-Final Schwa in French: an OT Analysis. U. Penn Working Papers in Linguistics, v. 25, n. 1, p. 199–208, 2019.

R CORE TEAM. R: a Language and Environment for Statistical Computing. R Foundation for Statistical Computing. Vienna, Austria. 2013. Disponível em: <http://www.R-project.org/>. Acesso em: 5 de dezembro de 2017.

SCLIAR-CABRAL, L. Princípios do Sistema Alfabético do Português do Brasil. São Paulo: Contexto, 2003.

SMITH, J. L. Loan phonology is not all perception: evidence from Japanese loan doublets. Japanese/Korean Linguistics, n. 14, p. 63–74, 2006.

SOARES, M. Alfabetização: a questão dos métodos. São Paulo: Contexto, 2018.

TAFT, M. An alternative to grapheme-phoneme conversion rules?. Memory & Cognition, n. 10, p. 465–474, 1982.

TAFT, M. The Influence of Orthography on Phonological Representations in the Lexicon. Journal of Memory and Language, v. 24, n. 3, p. 320–335, 1985.

TAFT, M. Orthographically influenced abstract phonological representation: Evidence from non-rhotic speakers. Journal of Psycholinguistic Research, v. 35, n. 1, p. 67–78, 2006.

TODD, S.; PIERREHUMBERT, J.; & HAY, J. Word frequency effects in sound change as a consequence of perceptual asymmetries: an exemplar-based model. Cognition, n. 185, p. 1–20, 2019.

TREIMAN, R. Learning to spell: phonology and beyond. Cognitive Neuropsychology, 2017.

TREIMAN, R.; KESSLER, B. How children learn to write words. New York: Oxford University Press, 2014.

VELOSO, J. Da Influência do Conhecimento Ortográfico sobre o Conhecimento Fonológico: Estudo Longitudinal de um Grupo de Crianças Falantes Nativas do Português Europeu. München: Lincom Europa, 2007.

VELOSO, J. Phonology and Writing: Can we look at written productions to “see the unseeable” in phonology?. Loquens, v. 6, n. 1, p. 1–12, 2019.

Downloads

Publicado

2021-08-28