A produção científica relacionada a fake news: uma análise bibliométrica na base de dados Scopus
The scientific production related to fake news: a bibliometric analysis in the Scopus database
Rafael Cacciolari Dalessandro
ORCID: http://orcid.org/0000-0002-3205-6450
Mestre e doutorando em Ciência da Informação pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Graduado em Biblioteconomia pela Universidade Estadual Paulista (UNESP).
rafael.cacciolari@unesp.br
Wilson Roberto Veronez Junior
ORCID: http://orcid.org/0000-0003-2939-1917
Mestrando em Ciência da Informação pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Graduado em Arquivologia pela Universidade Estadual Paulista (UNESP).
veronezw@gmail.com
Rafael Gutierres Castanha
ORCID: http://orcid.org/0000-0002-3117-1780
Mestre e doutorando em Ciência da Informação pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Graduado em Licenciatura em Matemática pela Universidade Estadual Paulista (UNESP).
r.castanha@gmail.com
RESUMO: A disseminação de notícias falsas tem se tornado uma preocupação constante, uma vez que seus efeitos podem ser nocivos para as diferentes esferas sociais e políticas da sociedade. Dessa maneira, fez-se necessário o mapeamento do tema Fake News na literatura científica indexada na base de dados Scopus para melhor compreender esse fenômeno e suas causas e/ou motivações. Foram recuperados 325 artigos e analisadas as principais temáticas, fontes de informação e áreas relacionadas ao tema. Observou-se um notório crescimento na produção científica relacionada a fake news entre os anos de 2017 e 2018, devido, principalmente, às eleições presidenciais dos Estados Unidos, em 2016, e à saída do Reino Unido da União Europeia.
PALAVRAS-CHAVE: Análise bibliométrica. Fake news. Distúrbios da informação. Produção científica.
ABSTRACT: The dissemination of fake news has become a constant concern since its effects can be harmful to both social and political spheres of society. Thus, it was necessary to map the Fake News topic in the scientific literature indexed in the Scopus database to better understand this phenomenon and its causes and/or motivations. 325 papers were retrieved and the main themes, information sources and areas related to the theme were analyzed. The results show that there was a notorious increase in the scientific production related to fake news between the years of 2017 and 2018, mainly due to the United States presidential election in 2016 and the exit of the United Kingdom from the European Union.
Keywords: Bibliometric analysis. Fake news. Information disorders. Scientific production.
1 Introdução
Vivemos em uma sociedade em que encontrar o crível se tornou uma tarefa cada vez mais árdua. Saber distinguir o que é verdade e o que é de fato mentira tem sido frequente na vida das pessoas. Trata-se de uma atividade que requer cuidado e minuciosidade para averiguar os fatos com que nos deparamos diariamente, seja por mensagens instantâneas, e-mails, conteúdos compartilhados em redes sociais e demais veículos informacionais.
Nesse contexto, muitas vezes nos deparamos com notícias que apresentam um conteúdo bem elaborado, mas que não possuem necessariamente o rigor e a veracidade das notícias vinculadas às mídias tradicionais. Segundo Lazer et al. (2018), as fake news (notícias falsas) são informações fabricadas que copiam a forma, mas não o processo organizacional ou o conteúdo de notícias vinculas por mídias tradicionais, pois elas não possuem as normas e processos editorias que asseguram a precisão e eficácia da informação.
Com o advento de meios de comunicação instantâneos, tais como aplicativos de mensagens e redes sociais, a disseminação de notícias falsas se intensificou de tal maneira que se deve ter muito cuidado antes de repassar tais informações. No passado, havia mais rigorosidade na publicação de notícias por mídias tradicionais, enquanto, hoje, vários meios de comunicação podem repassar uma mesma notícia, criando um campo fértil para que a desinformação se prolifere.
Segundo Shao et al. (2018), mesmo em um mundo ideal, em que as pessoas tendem a reconhecer e evitar o compartilhamento de informações de baixa qualidade, o excesso de informação e a atenção finita limitam a capacidade das mídias sociais de descriminar informações, levando em conta sua qualidade. Dessa maneira, notícias falsas tendem a viralizar e a serem tidas como informações confiáveis no ambiente online.
Mas como não vivemos em um mundo ideal, temos as redes sociais como universos totalmente polarizados e segregados, que por sua vez criam câmaras de eco capazes de expor as pessoas a fontes informacionais com conteúdo de seu agrado, o que acaba por enviesar nossa visão de mundo.
Dada a relevância do tema, fez-se necessário um mapeamento de como as fake news estão sendo abordadas na literatura científica contida em artigos científicos, indexada na base de dados Scopus, a saber: principais temáticas relacionadas, principais fontes de informação, principais áreas do conhecimento que publicaram sobre o tema e a evolução temporal das produções.
2 Referencial teórico
Com o advento da internet e sua atual configuração, qualquer indivíduo com acesso a essa ferramenta tornou-se uma fonte de informação potencial, capaz de criar e/ou modificar o conteúdo de mensagens de todo lugar e a qualquer momento. Mas isso não significa que toda criação ou modificação tenha sido feita levando em conta princípios éticos de conduta e checagem das fontes originais dos fatos por essas mensagens disseminadas. Segundo Lazer et al. (2018), as fake news possuem a mesma forma de notícias vinculadas às mídias tradicionais. No entanto, carecem do mesmo rigor de normas e processos que garantem a precisão e credibilidade do que está sendo anunciado, o que faz com que elas pertençam a um grupo (information disorders) de outros problemas (misinformation e disinformation) que também afetam a disseminação da informação.
De acordo com Wardle (2017), misinformation é responsável pela disseminação inadvertida de informações falsas, e disinformation pela criação e compartilhamento intencional de notícias falsas. A autora cita, ainda, mais um problema que pertence ao grupo information disorders: malinformation, que se caracteriza por ser baseada na realidade, mas é distorcida para causar danos.
As fake news tão comuns nos tempos atuais se encaixam na categoria de disinformation, uma vez que visam o compartilhamento de mentiras em redes cujos integrantes confiam na pessoa que repassou tal informação, ao invés de irem atrás de veículos informacionais tradicionais para checar a veracidade de tais afirmações (SANTOS, 2018). Segundo ainda o autor, as fake news são produto da pós-verdade, que se caracteriza pela distopia conceitual e semântica, criando uma distorção da verdade através do apelo às emoções e à satisfação de crenças e ideologias daqueles que criam e/ou espalham as notícias falsas.
Segundo Oliveira e Souza (2018), as fake news são prejudiciais ao cotidiano das pessoas, uma vez que são capazes de causar desinformação, desconhecimento e insegurança, além de também causarem injustiça, medo, manipulação e desfavorecer as informações que a valer são verdadeiras, pois estas acabam sendo confundidas com as propositalmente falsas ou descontextualizadas.
Para Allcott e Gentzkow (2017), as redes socias (tal como o Facebook) têm contribuído muito para a propagação de notícias falsas. Deve-se a isso o fato de que estas possuem configurações diferentes de outras tecnologias midiáticas. O conteúdo das informações pode ser compartilhado por pessoas sem a revisão de terceiros, fact checking ou julgamento editorial, o que permite a um usuário sem nenhum histórico ou reputação atingir tantos leitores quanto mídias tradicionais, tais como: Fox News, CNN ou o The New York Times, o que traz à tona o impacto de informações falsas e equivocadas, as denominadas Fake News.
Ainda segundo os autores, as fake news ganham um terreno fértil quando o que está em pauta é o lucro de meios de comunicação, uma vez que tais notícias são lucrativas, podendo gerar receita significativa de publicidade para o veículo informacional em que tal mensagem foi veiculada, já que tal notícia será compartilhada e acessada por muitos, atraindo, assim, a atenção de seus leitores para as propagandas ali exibidas.
Outro fator que também influencia muito na criação e disseminação de fake news é o conteúdo muitas vezes ideológico que tais notícias possuem, geralmente espalhando boatos e inverdades sobre as pessoas nelas envolvidas.
Segundo Shao et al. (2017), o compartilhamento massivo de fake news tem sido visto como um grande risco global capaz de influenciar eleições e apresentar ameaça à democracia. Tem-se como fake news: farsas, rumores, teorias da conspiração, notícias fabricadas, títulos de notícias tendenciosos e sátiras.
Os autores reforçam as declarações de Allcott e Gentzkow ao dizerem que a disseminação de tais desinformações se dá pela lucratividade que o site hospedeiro das fake news possui com propagandas, e que tal disseminação é feita através de robôs programados para espalhar notícias falsas e atingir usuários influentes nas redes. Desse modo, as pessoas são vulneráveis a esta manipulação, uma vez que elas acabam compartilhando tais informações geradas por robôs, o que por sua vez acaba criando câmaras de eco em que as pessoas são expostas a mensagens direcionadas nas quais elas tendem a acreditar, assim as disseminando cada vez mais.
Ainda segundo os autores, tais câmaras de eco se concretizam muitas vezes em redes sociais por serem ambientes polarizados e segregados quanto a assuntos políticos, ou seja, as pessoas tendem a disseminar mais informações inverossímeis quando o alvo destas mensagens não é alguém de seu interesse.
3 Metodoloogia
O corpus de pesquisa deste trabalho foi obtido através de uma busca pelo termo “fake news” nos títulos, palavras-chaves e/ou resumos (TITLE–ABS–KEY) de artigos de periódicos indexados na base de dados Scopus. Esta pesquisa foi realizada em 07 de junho de 2019 e foram recuperados 325 artigos entre os anos de 2005 e 2018.
Nota-se que o ano de 2005 apresentou as primeiras publicações com um total de dois artigos. Após a recuperação desses artigos, foi analisada a evolução temporal da produção científica da temática (artigos por ano) e observados os principais pontos de variação. Deve-se ressaltar que, por se tratar de uma pesquisa em base de dados realizada em uma data específica, a mesma se configura como uma análise de dados diacrônica, visto que, se repetida futuramente, os resultados poderão (e certamente irão) variar.
Essa análise dos artigos extraídos da base de dados anteriormente mencionada, que dizem respeito à temática Fake News, ocorreu através do uso de indicadores bibliométricos a fim de saber: principais temáticas relacionadas, principais fontes de informação, principais áreas do conhecimento que publicaram sobre o tema e a evolução temporal das produções.
Analisar a produção científica relacionada à temática Fake News poderá indicar as primeiras evidências de que maneira as diversas áreas do conhecimento irão tratá-la, não só como conceito, mas também como objeto de pesquisa, visto que essa temática ainda não se configura como uma disciplina ou área do conhecimento.
Araújo e Alvarenga (2011) destacam que as publicações, enquanto produto final de pesquisas científicas e da ciência em si, são, sem dúvidas, importantes subsídios para o estudo do comportamento de disciplinas e/ou campos científicos, destacando os mais diferentes aspectos e questões que essas publicações podem apresentar, a saber: quais são as frentes de pesquisas desse campo, considerando-se diferentes variáveis, pesquisadores/autores, instituições ou temas; quais são os padrões de comunicação entre seus pares, tais como os tipos de canais preferidos e as parcerias; quais são as bases epistemológicas em que se fundamentam suas pesquisas: autores, títulos clássicos, línguas, países, datas.
Dessa maneira, a análise do rol das atividades científicas de qualquer campo do conhecimento resulta diretamente em uma seleção criteriosa de toda informação que as compõem, visto a ampla circulação de mensagens e de informações registradas que estão em contínuo desenvolvimento e crescimento (BUFREM, PRATES, 2005).
Segundo Santos e Kobashi (2006), a bibliometria como um todo agrega os diversos aspectos quantitativos e modelos da comunicação científica e do armazenamento, disseminação e recuperação da informação científica. Além disso, uma análise bibliométrica pode ser realizada tanto no nível macro quanto no nível micro, isto é, pode-se analisar desde produções científicas de países, grandes grupos de pesquisadores e cientistas, a bases de dados, disciplinas, temáticas e domínios científicos específicos.
Além disso, a fim de melhor observar o comportamento sazonal da temática Fake News presente na base de dados em questão, traçou-se o gráfico desta série temporal de dados, buscando observar o crescimento ou decréscimo da produção científica e como isso afetou no total das produções.
4 Resultados
Após recuperar os 325 artigos na base de dados Scopus utilizando o termo de busca “fake news”, foram observadas primeiramente as principais temáticas relacionadas, por meio da análise das principais palavras-chaves relacionadas ao tema, assim como apresentado na Tabela 1.
Palavras-Chave |
Frequência |
Fake News |
138 |
Social Media |
58 |
Human(s) |
47 |
Post-truth |
25 |
Misinformation |
23 |
Article |
19 |
Information Literacy |
17 |
Journalism |
16 |
Information Dissemination |
13 |
Observa-se que, além da temática Fake News, que se apresenta como mais incidente, com 138 aparições, Social Media (mídia social) é a palavra mais relacionada a fake news, apontando indícios de uma forte ligação entre estudos de fake news e mídias socias. Há também intensa aparição de palavras como Misinformation e Post-truth, o que contextualizam ainda mais a relação das fake news com as information disorders e o momento ora vivenciado por este fenômeno.
Especificamente, o termo Post-truth (pós-verdade), com 25 aparições em artigos, foi escolhida como palavra do ano em 2016 pelo dicionário de Oxford e a mesma pode ser definida como “relacionada ou denotando circunstâncias nas quais os fatos objetivos são menos influentes na formação da opinião pública do que apelos à emoção e à crença pessoal”. Ao relatar brevemente a história do conceito, o dicionário observa um pico após uma década de uso em relação ao Brexit (Saída do Reino Unido da União Europeia), à eleição de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos e à ascensão do composto substantivo pós-verdade política como uma descrição para os tempos atuais (PETERS, 2017) (Tradução nossa).
Ademais, ao recuperar as temáticas relacionadas às fake news, observa-se um certo perfil do fenômeno das notícias falsas, que ocorrem principalmente pelo viés das redes (mídias) sociais com forte apelo político, como aponta Allcot e Gentzkow (2017).
Compreendendo a relação das temáticas relacionadas às fake news, observou-se, na Tabela 2, as principais áreas do conhecimento que trataram desse tema no período analisado, visando observar possíveis afinidades entre a temáticas e as diversas áreas do conhecimento.
Áreas do Conhecimento |
Frequência |
Ciências Sociais |
218 |
Ciência da Computação |
72 |
Artes e Humanidades |
64 |
Medicina |
25 |
Psicologia |
20 |
Negócios, Gestão e Contabilidade |
19 |
Engenharia |
15 |
Economia, Econometria e Finanças |
13 |
Bioquímica, Genética e Biologia Molecular Agricultura e Ciências Biológicas |
9 8 |
Ao observar as principais áreas do conhecimento que publicaram a respeito do tema, destacam-se as Ciências Sociais, com 218 publicações. Tal fato suscita que a temática em questão possui grande afinidade com as humanidades visto que, além de Ciências Socias, a área Artes e Humanidades é a terceira mais incidente. Tal fato pode remeter à ideia de que as fake news podem estar sendo tratadas como um potencial objeto de estudos das ciências sociais e humanas. E mais, tal fato se consuma ao notar que a maioria das áreas relacionadas são oriundas das humanidades ao acrescentar as áreas de Negócios, Gestão e Contabilidade, Economia, Econometria e Finanças.
Entretanto, observa-se que a temática é um tanto quanto multidisciplinar dada a dispersão das áreas relacionadas, como a área de Ciência da Computação que se apresenta como a segunda mais relacionada às fake news, o que sugere uma possível vertente de estudo relacionada às ciências exatas, visto que a área de Engenharia também está presente na lista, tal como as áreas oriundas das ciências da saúde, como Psicologia e Medicina.
Dessa maneira, em suma, a temática apresenta-se fortemente relacionada às áreas humanas, com relações multidisciplinares com as diversas áreas do conhecimento (exatas, biológicas e da saúde).
Já com relação às fontes de informação (periódicos) que mais publicaram artigos relacionados à temática, observou-se uma distribuição altamente esparsa, como apresenta a Tabela 3, visto que 172 revistas publicaram artigos sobre o tema.
Fontes de informação |
Total doc. |
Quartil |
Índice-H |
Proceedings of The Association for Information Science and Technology |
13 |
Q3 |
6 |
Profesional de la Información |
7 |
Q1/Q2 |
22 |
Economist United Kingdom |
6 |
Q3 |
8 |
Journalism Practice |
6 |
Q1 |
38 |
Popular Communication |
6 |
Q2 |
16 |
Media Watch |
5 |
Q4 |
2 |
Reference Librarian |
5 |
Q2 |
21 |
Computers in Human Behavior |
4 |
Q1 |
137 |
Journalism Studies |
4 |
Q1 |
51 |
New Media and Society |
4 |
Q1 |
87 |
Além disso, observa-se que a revista mais produtiva é a Proceedings of The Association for Information, responsável por 13 artigos dos 325 recuperados, equivalente a 4% dos artigos. Essa revista, referente às áreas de Ciência da Computação, Ciência da Informação e Biblioteconomia, mesmo sendo a mais produtiva, possui, segundo a Scimago Institution Rankings, quartil Q3 e Índice-H igual a 4, apresentando-se como uma revista de expressão relativamente baixa, dados esses indicadores.
Ainda sobre as principais fontes de informação recuperadas, possuem 60 artigos produzidos juntas, um total de 18,46% da produção total recuperada, reafirmando o fato das distribuições esparsas citado anteriormente. Ademais, deve-se destacar as revistas Computers in Behavior Studies, New Media and Society e Journalism Studies, por serem as mais expressivas segundo os indicadores da Scimago JR, com quartis e Índice-H respectivos de Q1 e 137, Q1 e 51, e Q1 e 87, responsáveis por quatro artigos cada.
Compreendendo a afinidade teórica que a temática Fake News tem com outras, representada pelas palavras-chaves mais incidentes nos artigos recuperados, as principais áreas que abordam e investigam esse tema e as principais fontes de publicação, é apresentado a evolução temporal dos artigos que possuem o termo “fake news” em seus títulos, resumos e/ou palavras-chaves, representada no Gráfico 1.
Segundo o gráfico em questão, que representa toda evolução da produção de artigos relacionados a fake news durante os últimos 14 anos, observa-se que, a priori, até o ano de 2016, essa temática era pouco estudada, visto que, até esse ano, foram produzidos apenas 30 artigos em 12 anos, ou seja, uma média de 2,5 artigos por ano. Esse resultado intensifica-se ao observar que nesse mesmo período de 12 anos, durante os anos de 2006 e 2009, nenhum artigo contendo o termo de busca (em títulos, resumos e/ou palavras-chaves) foi produzido.
Contudo, destacam-se os anos de 2012 e 2015, que tiveram uma produção muito superior à média de artigos desses 12 anos (2005 – 2016) e superior aos anos que os antecederam. Observa-se que, em 2012, foram publicados oito artigos e, em 2015, seis artigos (anteriormente, em 2011, foi publicado um artigo, e em 2014, dois artigos).
Tal fato é explicado pelas fontes Proceedings of The Association for Information e Popular Comunication terem publicado respectivos três e seis artigos, elevando a publicação nesses anos. Especificamente com relação ao segundo periódico, esse fenômeno pode ser explicado pelo mesmo publicar um fascículo com o tema Not Necessarily the News? Global Approaches to News Parody and Political Satire, trazendo aspectos relacionados a fake news e o tema proposto pelo periódico.
Destacados tais pontos até o ano de 2016, ressalta-se os anos de 2017 e 2018, responsáveis pela grande maioria da produção de artigos, com 77 publicações em 2017 e 218 em 2018, ou seja, 295 dos 325 artigos recuperados, um percentual de 90,76% sobre o total. Nesse sentido, a fim de buscar possíveis explicações para esse aumento tão expressivo de publicações de artigos nos últimos dois anos, buscou-se na literatura possíveis fatos que possam ser plausíveis para justificar essa expansão repentina, visto quão similares eram os dados anteriormente.
Segundo Allcot e Gentzkow (2017), após as eleições de 2016, uma preocupação específica foi o efeito de falsas histórias, ou fake news, como foi apelidado, circuladas nas redes (mídias) sociais. Os autores apontam ainda que, nesse mesmo ano, as mídias sociais tiveram papel central na disseminação de notícias falsas nas eleições presidenciais dos Estados Unidos (disputadas entre Donal Trump e Hillary Clinton), e que o uso das mídias sociais, em termos de usuários ativos, do Facebook atingiram 1,8 bilhões por mês, e o Twitter se aproximou de 400 milhões. Além disso, um terreno fértil para o surgimento e a disseminação de fake news foi a perda de confiança na grande mídia.
Tal fato vai ao encontro do supracitado por Peters (2017), o que sugeriu uma busca mais refinada na base de dados Scopus. Visando observar o quanto as eleições presidenciais nos Estados Unidos e o Brexit no Reino Unido influenciaram no crescimento da produção de artigos relacionados a fake news, foi limitada a busca, que resultara até então em 325 artigos entre 2005 e 2018, apenas aos anos de 2017 e 2018, ou seja, apenas os últimos 295 artigos, e buscou-se, dentro desses artigos, os termos: “Trump” (referência ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump), “Clinton” (referência à candidata opositora a Trump nas eleições presidenciáveis dos Estados Unidos em 2016), “Elections” (Eleições) e “Brexit”.
Ao recuperar os novos resultados, obteve-se um total de 108 artigos relacionados a “Trump”, 134 artigos relacionados a “Elections”, 20 artigos relacionados a “Clinton” e 32 relacionados a “Brexit”. Nesse contexto, pode-se suscitar que as pesquisas recentes (2017 – 2018) referem-se, massivamente, ao fenômeno da disseminação de notícias falsas durante as eleições presidenciais dos Estados Unidos em 2016, corroborando com a ideia trazida pelos autores supracitados.
Ademais, a previsão do número de publicações futuras torna-se mais árdua e talvez imprecisa, visto que o comportamento de alta produção com relação ao tema é recente, e que previsões matemáticas ou estatísticas como regressões ou interpolações podem não ser tão fidedignas quanto esperadas, dada a alta colinearidade dos dados de 2005 a 2016, ou seja, a expansão repentina da produção científica a respeito de fake news ainda pode estar atrelada a um acontecimento específico, nesse caso a eleição presidencial norte americana de 2016 e o Brexit. Entretanto, ao realizar uma nova busca na base de dados Scopus, já é possível recuperar 121 artigos produzidos no ano de 2019.
5 Considerações Finais
Tendo em vista o potencial nocivo e a facilidade com que as fake news podem ser disseminadas nos mais diversos meios de comunicação existentes, afetando assim importantes esferas da sociedade como saúde, política, economia, bem estar social, entre outras, o tema é de suma importância e deve ser analisado com cautela por parte de governantes, pesquisadores e membros do público geral.
A partir da análise dos resultados obtidos por meio da presente pesquisa, é possível concluir que as fake news se relacionam com outros temas, tais como: redes sociais, misinformation, pós-verdade, competência informacional, jornalismo e internet, explicitando os assuntos mais comuns vinculados a esse tema.
Observou-se também que as áreas do conhecimento que mais endereçaram atenção às fake news até o momento foram: ciências sociais, artes e humanidades e ciência da computação. Por se tratar de um fenômeno cujos malefícios afetam principalmente a sociedade e suas esferas mais significativas, o tema tem sido objeto de estudo principalmente das ciências sociais, fato que pode ser comprovado pela grande incidência de trabalhos nessa área do conhecimento, 218 no total.
O que por sua vez acabou refletindo nos periódicos que mais publicaram a temática em questão, também pertencentes às ciências sociais, a saber: Proceedings of The Association for Information Science and Technology, Journalism Practice, Popular Comunication, Media Watch, Profesional de la Información, Reference Librarian, entre outros.
Vale ressaltar que o tema é recente, uma vez que a produção científica referente a fake news não possuem ٢٠ anos. O primeiro registro ocorreu em 2005 e apresentou uma massiva intensificação da produção a partir de 2017, fato que se justifica pela utilização do termo no contexto da eleição norte americana de 2016 e o referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia, o Brexit (ROSS; RIVERS, 2018).
Nesse sentido, o perfil da produção científica relacionada a temática pode ser descrito como algo extremamente recente visto a alta produção nos anos de 2017 e 2018, além de uma forte relação multidisciplinar com as ciências humanas. Além do mais, reforça-se o fato do alinhamento da temática com a política internacional (Brexit e Eleições presidenciais de 2016 nos EUA), como dito anteriormente, afetando diretamente esse aumento de produtividade.
Dessa forma, tem-se o fenômeno Fake News como um assunto relativamente novo, mas com produção científica expressiva, principalmente nos últimos anos, o que atenta para o fato de que é um assunto que tem sido objeto de estudo por várias áreas do conhecimento, dado o seu potencial nocivo à sociedade como um todo.
Referências:
ALLCOTT, Hunt; GENTZKOW, Matthew. Social media and fake news in the 2016 election. Journal of Economic Perspectives, [S.l.], v. 31, n. 2, p. 211-36, 2017.
ARAÚJO, Ronaldo Ferreira; ALVARENGA, Lidia. A bibliometria na pesquisa científica da pós-graduação brasileira de 1987 a 2007. Encontros Bibli: revista eletrônica de biblioteconomia e ciência da informação, v. 16, n. 31, p. 51-70, 2011.
BUFREM, Leilah Santiago; PRATES, Yara. O saber científico registrado e as práticas de mensuração da informação. Ciência da Informação, v. 34, n. 2, 2005.
KOBASHI, Nair Yumiko; SANTOS, Raimundo Nonato Macedo dos. Institucionalização da pesquisa científica no Brasil: cartografia temática e de redes sociais por meio de técnicas bibliométricas. TransInformação, v. 18, n. 1, 2006.
LAZER, D. M. J. et al. The Science of Fake News: addressing Fake News requires a multidisciplinary effort. Science. v. 359, n. 6380, p. 1094-1096, 2018.
OLIVEIRA, M. L. P.; SOUZA, E. D. A competência crítica em informação no contexto das Fake News: os desafios do sujeito informacional. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 19., Londrina. Anais [...].Londrina: ANCIB, 2018.
PETERS, Michael A. Education in a post-truth world. In: Post-Truth, Fake News. Springer, Singapore, v. 49, n. 6, p. 563-566, 2017.
ROSS, A. S.; RIVERS, D. J. Discursive Deflection: Accusation of “Fake News” and the Spread of Mis- and Disinformation in the Tweets of President Trump. Social Media + Society, v. 4, n. 2, 2018.
SANTOS, R. R. O. Fake news como produto da pós-verdade. 2018. Disponível em: http://observatoriodaimprensa.com.br/comunicacao-social/fake-news-como-produto-da-pos-verdade/. Acesso em: 02 Nov. 2018.
SHAO, C. et al. The spread of low-credibility content by social bots. Nature Communications. 2018. Disponível em: https://www.nature.com/articles/s41467-018-06930-7. Acesso em: 28 Nov. 2018.
WARDLE, C. Fake News, it’s complicated. First Draft News. 2018. Disponível em: https://medium.com/1st-draft/fake-news-its-complicated-d0f773766c79/. Acesso em: 02 nov. 2018.
Fonte: Elaboração dos Autores.
Tabela 1 - Principais temáticas.
Fonte: Elaboração dos Autores.
Tabela 2 - Áreas do conhecimento.
Fonte: Elaboração dos Autores.
Tabela 3 - Principais fontesde informação
Fonte: Elaboração dos Autores.
Gráfico 1 - Evolução temporal da produção relacionada a fake news