Ciência da Informação e Comunicação Científica:
uma trajetória do campo informacional
O início das atividades relacionadas ao campo informacional, que compreendo como sendo as áreas da Arquivologia, Biblioteconomia, Ciência da Informação e Museologia, tem início com a maior invenção da humanidade: a escrita.
O ato de registrar uma atividade, um conjunto de mercadorias e, posteriormente, um pensamento, trouxe uma mudança de paradigma cultural, um evento que Santillana denomina “fenômeno de transmissão de Alta Cultura”, responsável por saltos qualitativos na história da humanidade. Esse evento histórico e cultural trouxe mudanças importantes em nossa visão de tempo e de espaço, criando as condições para que se pudesse pensar em um sistema para sistematizar o registro das atividades práticas e também, posteriormente, àquelas relacionadas a atividades intelectuais.
Após esse momento histórico, temos o marco representado pela biblioteca de Alexandria, que, mais do que uma biblioteca, era um centro de estudos, que incentivava a vinda de intelectuais de outras partes do mundo antigo, assim como a aquisição de obras para o seu acervo. E não podemos esquecer a importância das bibliotecas dos mosteiros na Europa, na Idade Média, fundamentais para a preservação das obras dos filósofos gregos. Em resumo, essa arqueologia do campo da informação tem a intenção de ressaltar que as atividades relacionadas ao armazenamento, organização e preservação de informações contabiliza um histórico de milhares de anos, em mais de uma civilização.
A partir do século XV a Europa irá apresentar algumas das condições fundamentais para modificar os processos e atividades informacionais que vinham sendo efetuadas, mudanças que irão abrir caminho para o surgimento de uma nova área no campo da informação. Destaco três, muito relevantes para o surgimento da Ciência da Informação, e também as dimensões tecnológicas, técnicas e sociais que, como sabemos, acompanham a Ciência da Informação desde os seus primórdios.
• O surgimento da ciência moderna
• O crescimento das cidades
• A invenção da imprensa
A ciência moderna, que trouxe uma nova visão de mundo e novas práticas e metodologias. O crescimento das cidades, que gerou mais oportunidades para interação, troca de informações entre as pessoas, criação de grupos por interesses em determinados assuntos e temas, como os cientistas, por exemplo. Enfim, o início de uma cultura urbana europeia que começa a se centrar na produção e circulação da informação e, mais ainda, em um tipo particular de informação: a informação científica. A criação da imprensa, que trouxe uma revolução informacional, não somente pelo que se pode ser observar mais facilmente (o aumento no número na produção de livros, p.ex.), mas, especialmente, pela possibilidade de transmitir a mesma informação produzida pelo autor para inúmeras pessoas.
Como consequência da sinergia entre esses fatores, ocorreu a criação das primeiras associações científicas. O surgimento de uma cultura urbana possibilita a cientistas, a oportunidade de criação de espaços para discussão e compartilhamento de suas ideias.
Nesse contexto, foi constituída a primeira rede social científica formal, os Colégios Invisíveis, pois, além das trocas informacionais presenciais, criou-se uma rede de comunicação através de cartas, em que estudiosos/pesquisadores trocavam ideias e experiências. É importante ressaltar que as cartas foram as sementes dos periódicos científicos, do processo de sistematização e formalização da comunicação entre os pares. Os pesquisadores e cientistas foram a primeira comunidade de usuários de um campo que viria a ser chamado Documentação por Paul Otlet e, depois, Ciência da Informação — e continuam a ter um papel relevante como principal comunidade de usuários da Ciência da Informação.
As associações já tinham os seus canais de comunicação da informação (eventos, reuniões, cartas...), mas sentiram a necessidade de criação de um canal de comunicação de informação mais adequado, confiável e previsível para o compartilhamento de suas ideias e resultados de pesquisas. É nesse sentido surgem os primeiros periódicos científicos.
Podemos observar o primeiro movimento importante, consequência do desenvolvimento dos três fatores supracitados (ciência moderna, cultura urbana e tecnologia da imprensa), em direção à criação de uma nova área no campo da informação.
• relacionada à tecnologia – a criação dos periódicos científicos, potencializados pela tecnologia da imprensa, ocorreu em um ambiente de grande inovação na cadeia produtiva de um periódico, tais como, apresentação dos artigos, corpo de avaliadores, representação da informação visando a recuperação..., o que requer inovação;
• Aspectos sociais – comunidade de usuários que necessitavam de informações organizadas para continuidade de suas pesquisas;
• E a informação científica e tecnológica, que surge e começa sua caminhada até a hegemonia que observamos na sociedade contemporânea. O surgimento desse tipo de informação foi motivado por um novo canal para a sua comunicação, mas também exigiu novas abordagens técnicas para a sua representação e organização.
Esse ambiente, a par da criação das associações científicas, demanda um novo canal para a comunicação da informação, os periódicos científicos, e uma classe emergente, cientistas que necessitam de informações sistematizadas e organizadas para pronta recuperação. Esses fatores concorreram, ainda mais, para a emergência da Ciência da Informação e, também, de uma área de estudos fundamentais nesse campo: a comunicação científica.
Os elementos que fazem parte do processo de comunicação científica, tais como produtores e receptores de informação, canais por onde a informação circulam, processos técnicos que envolvem a organização das informações, foram insumos preciosos para o surgimento de um campo científico, a Ciência da Informação, que tem nos periódicos científicos o principal canal para o compartilhamento das pesquisas.
Prof. Dr, Gustavo Henrique de Araujo Freire
Editor Científico