EDUCATIONAL RESOURCES OPEN IN LIBRARIES IN PUBLIC HIGHER EDUCATION
Maria da Graça Gomes Almeida
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2863-8693
Doutora em Documentação: Arquivos e Bibliotecas no Entorno Digital pela Universidad Carlos III de Madrid (UC3M), Espanha.
Bibliotecária e Professora Substituta da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Brasil.
E-mail: mggomesster@gmail.com
Flávia Catarino Conceição Ferreira
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3429-4791
Doutora em Ciência da Informação pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), Brasil.
Bibliotecária e Documentalista da Biblioteca Universitária de Saúde do Sistema de Bibliotecas e Informação (BUS/SiBi) da UFBA, Brasil.
E-mail: flaviaferreira@ufba.br
RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS EM BIBLIOTECAS NO ENSINO SUPERIOR PÚBLICO
Marcos Antônio Nascimento Ferreira
ORCID: https://orcid.org/0009-0001-6005-3986
Graduado em Biblioteconomia e Documentação pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), Brasil. Graduado em Arquivologia pela UFBA, Brasil.
Bibliotecário da UFBA, Brasil.
E-mail: marcos.a.nferreira@gmail.com
Nidia Maria Lienert Lubisco
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5008-8878
Doutora em Documentação pela Universidad Carlos III de Madrid (UC3M), Espanha. Pós-doutorado pela Universidad de Salamanca (USAL), Espanha.
Professora Vinculada do Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal da Bahia (PPGCI/UFBA), Brasil.
E-mail: nidialubisco@gmail.com
RESUMO: Este artigo trata dos Recursos Educacionais Abertos (REA), que tiveram seu surgimento em 2002 no âmbito da Unesco, com o intuito de trazer à educação instrumentos inovadores e de fácil compartilhamento pela internet. Estabeleceu-se como objetivo geral: analisar a existência de iniciativas de REA nas instituições de educação superior brasileiras (universidades e institutos federais) e suas bibliotecas. Quanto ao método, trata-se de uma pesquisa aplicada, do tipo qualiquantitativa e, quanto aos objetivos, caracteriza-se como exploratório-descritiva, tendo como população, mediante estudo de caso, bibliotecários de universidades públicas e de institutos federais registrados no e-MEC. A literatura especializada em Educação e em Ciência da Informação apoiou o que se encontrou nos resultados, os quais revelaram que, dos 162 bibliotecários que participaram da pesquisa, 71 (43,83%) conheciam a definição do termo REA, enquanto 91 (56,17%) ainda não tinham conhecimento; 50% das instituições participantes contam com alguma iniciativa de REA e, quanto à existência de políticas específicas para a produção de REA, 67,3% dos respondentes desconhecem; 17,3% afirmam que têm conhecimento, enquanto 15,4% informam não existir. As conclusões evidenciaram que as universidades pesquisadas estão produzindo e/ou coletando diferentes tipos de REA, porém estão armazenando esses recursos de forma dispersa. O conhecimento sobre o termo REA ainda é incipiente nas bibliotecas dessas instituições. O engajamento da comunidade universitária é fundamental para mobilizar conhecimentos e consolidar ações concretas para o desenvolvimento de REA.
PALAVRAS-CHAVE: bibliotecas universitárias públicas; recursos educacionais abertos; políticas de REA.
ABSTRACT: This article deals with Open Educational Resources (OER), which were born in 2002 under the scope of UNESCO, with the aim at bringing to education innovative tools and easy sharing over the Internet. General objective was to analyze the existence of OER initiatives in Brazilian higher education institutions (universities and federal institutes) and their libraries. This is an qualiquantitative applied research, and regarding objectives, it is characterized as exploratory-descriptive, having as population, through case study, librarians of public universities and federal institutes registered in e-MEC. From 162 librarians who participated in the research, 71 (43.83%) knew OER term definition, while 91 (56.17%) were still unaware it; 50% of the institutions have some OER initiative and regarding the existence of specific policies for OER production, 67.3% of respondents unaware it, 17.3% think they aware them, while 15.4% say they do not exist. Universities surveyed are producing and/or collecting different types of OER, but they are storing these resources in a dispersed way, in different institutional repositories, educational platforms and websites. Knowledge about OER term is still incipient in these institutions. Engagement of university community is essential to mobilize knowledge and consolidate concrete actions for OER development.
Keywords: public university libraries; open educational resources; OER policies.
1 INTRODUÇÃO
A cultura digital trouxe para a educação a possibilidade da produção de materiais e recursos educacionais inovadores e de fácil compartilhamento por meio da internet, os denominados Recursos Educacionais Abertos (REA) tradução do inglês Open Educational Resources (OER). O movimento de REA, iniciado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), em 2002, advoga a necessidade de se desenvolver ações mais eficazes para integrar conteúdos abertos e de qualidade ao processo educacional.
Além de promover a democratização do acesso ao conhecimento e ajudar na transformação do processo de ensino e aprendizagem, com a produção de materiais educativos de qualidade e de baixo custo, o movimento REA defende também princípios que se vinculam à inclusão, à acessibilidade, à equidade e à ubiquidade, estando em consonância com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU), promovendo uma educação de qualidade, igualitária, democrática, inclusiva, equitativa e aberta.
A educação aberta está relacionada à produção e ao uso de recursos educacionais licenciados de forma que possam ser usados e reutilizados, com opções de escolha em relação aos conteúdos e metodologias. Para tanto, é necessário o desprendimento de concepções restritivas de produção do conhecimento, uma vez que a reusabilidade tem como finalidade incentivar a colaboração e a melhoria da qualidade dos REA.
Para facilitar o reuso, é muito importante que o recurso educacional informe o tipo de licença concedida e seja arquivado em repositórios institucionais com mecanismos de busca eficientes, para facilitar a recuperação e o acesso. A integração de REA nas instituições de ensino depende do acesso a esse tipo de conteúdo, uma vez que o reuso é uma de suas principais características.
Nesse cenário, as bibliotecas universitárias podem atuar como promotoras dos objetivos dos REA, subsidiando as atividades acadêmicas, bem como as iniciativas de produção de recursos didáticos de acesso aberto, por meio da consolidação do estabelecimento de repositórios de REA, oriundos de políticas estabelecidas e bem delimitadas no âmbito do ensino superior público brasileiro. Porém, de maneira geral, observa-se que os REA são um tema insuficientemente conhecido no âmbito das bibliotecas das instituições públicas de educação superior e que os REA produzidos por essas instituições encontram-se dispersos em diferentes repositórios institucionais, plataformas educacionais e sites.
Assim sendo, busca-se resposta para o seguinte questionamento: – Quais as possíveis causas do desconhecimento sobre REA, por parte dos bibliotecários, e de sua dispersão no âmbito das instituições públicas brasileiras de ensino superior?
Com base na contextualização apresentada, esta pesquisa tem como objetivo geral analisar a existência de iniciativas de REA nas instituições de educação superior brasileiras (universidades e institutos federais) e suas bibliotecas, procurando, mais especificamente, procurando: (1) conhecer as políticas e as práticas de REA no ensino superior público brasileiro; (2) identificar as percepções dos bibliotecários dessas instituições em relação aos REA; e (3) caracterizar as condições de acesso, de seleção e de armazenamento/preservação dos REA, com a finalidade de conhecer a realidade empírica e contribuir com o processo educacional nessas instituições.
Neste artigo, a designação “biblioteca universitária” refere-se tanto às bibliotecas das universidades públicas (federal, estadual e municipal) quanto às dos Institutos Federais de Educação Superior (IFES).
2 OS RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS
A educação aberta vem experimentando em todo o mundo um processo de crescimento e essa expansão leva as instituições de ensino a repensarem a maneira pela qual são conduzidos os processos educacionais. Parte dessa expansão se deve ao desenvolvimento das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC), pois, por meio de seu desenvolvimento, surgem novas formas de acesso à informação, as quais provocam mudanças nas formas tradicionais de disseminação do conhecimento e da cultura nas instituições. Esse fato pode ser observado na grande quantidade de materiais disponibilizados por meio da internet. Em paralelo à utilidade que isso representa, a facilidade de disseminar conteúdos em rede pode resultar também na utilização imprópria de itens ou informações, quando, por exemplo, omite-se a devida menção ou permissão de uso por parte dos produtores.
Assim, por intermédio das TIC, surgem novas possibilidades para que o conhecimento flua dinamicamente em uma escala cada vez maior: são construídos novos modelos de acesso a recursos educacionais, tendo como fundamento a produção sem fins lucrativos, baseada na colaboração. No contexto tecnológico, a colaboração e o compartilhamento de itens tornam-se uma realidade. Reforçando esse pensamento, para Sebriam, Markun e Gonsales (2017), no contexto da “cultura digital” ou “cibercultura”, mais ideias são geradas à medida que são compartilhadas.
Nesse contexto, o movimento de acesso aberto (tradução do inglês open access) surge como um de seus objetivos o de satisfazer a demanda educativa, compreendendo a importância da disponibilização aberta de materiais de cunho técnico e científico. Essa possibilidade de disseminar materiais educacionais abertos ocorre pelo fato de esses itens possuírem licenças livres e/ou flexíveis, tornando acessível ao usuário não apenas a leitura do material, mas também a capacidade de baixar o arquivo, distribuir o item, alterar seu conteúdo, entre outras vantagens. Com isso, percebe-se que a acessibilidade a uma informação ou a um objeto, em muitos casos, torna-se mais desejável do que a sua posse em si.
A proposta do acesso aberto é a garantia da liberdade de acesso aos dados, sempre que as especificações técnicas, o tipo de licença e as liberdades e condições de uso sejam conhecidas. Somente com o conhecimento das liberdades e condições para uso, o recurso poderá ser compartilhado sem necessidade de permissão por parte do autor. Assim sendo, é possível inferir que os REA se aproximam da proposta voltada à aprendizagem aberta e colaborativa, fazendo uso das TIC e respeitando os termos da licença ou as restrições de acesso e uso especificadas no próprio recurso, o que proporciona maior independência por parte dos usuários no uso e reutilização de recursos digitais.
Os REA surgem como uma importante ferramenta para a democratização do conhecimento, por possibilitar acesso livre a conteúdos educacionais de qualidade em diversas mídias, e propõem, como fundamento, a possibilidade de que os recursos de aprendizagem publicados possam ser utilizados e transformados, visando à socialização do conhecimento.
Apesar da praticidade do uso dos REA na educação, é importante não confundir REA com aprendizado on-line. Para Sebriam, Markun e Gonsales (2017, p. 34):
Os REA têm potencial para aumentar o acesso a uma educação inclusiva, equitativa e de qualidade, ao ressaltar competências importantes do século XXI, como colaboração, autoria compartilhada e revisão por pares, chamando a atenção para a flexibilização do direito autoral, especialmente para uso educativo.
REA são “[...] materiais de ensino, aprendizagem e investigação em quaisquer suportes, digitais ou outros, que se situem no domínio público ou que tenham sido divulgados sob licença aberta, permitindo acesso, uso, adaptação e redistribuição gratuitos por terceiros [...]” (Declaração..., 2012, p. 1). Na visão de Butcher (2015, p. 5, tradução nossa), os REA podem ser compreendidos como sendo “[...] simplesmente recursos educacionais acompanhados de uma licença que facilita a sua reutilização, e possivelmente sua adaptação, sem a necessidade de pedir permissão ao detentor dos direitos autorais”. Sobre as questões relativas aos direitos autoriais, Zanin (2017, p. 5) entende que
Todas as informações do recurso de aprendizagem devem estar disponíveis, de forma acessível, para que o usuário esteja consciente tanto das potencialidades do REA como da licença de uso, e o utilize adequadamente para que seja atingido o objetivo educacional sem violação dos direitos do autor.
A diferença básica entre um REA e os demais recursos educacionais é a sua licença. Assim sendo, os REA podem ser publicados mediante licenças abertas, que são mecanismos legais baseados em leis de proteção autoral vigentes, possibilitando ao autor do material disponibilizar sua obra com poucas restrições. As licenças abertas se originam da necessidade de resguardar os direitos autorais aos seus detentores e buscam proporcionar acesso legal aos itens sob sua licença, independentemente de seu formato ou suporte, estabelecendo critérios quanto ao seu uso, reutilização, distribuição e outros fins.
Tratando de licença aberta no âmbito educacional, Zanin (2017, p. 4) apresenta a seguinte contribuição: “[...] a licença aberta pressupõe que o material de ensino está disponibilizado de forma gratuita, com pouca ou nenhuma restrição de direitos autorais, seja técnica ou legal, e que é livre para ser utilizado, adaptado e distribuído [...]”.
Além de informar o tipo de licença, Furniel, Mendonça e Silva ([201-], p. 12) entendem que os REA precisam ser disponibilizados em arquivos de formatos editáveis, para assegurar a possibilidade de recombinar/remixar os conteúdos. A abertura técnica de software, visando facilitar a modificação de programas, é outro princípio importante. Na visão de Zanin (2017, p. 4), para a utilização dos REA, é preciso atender a dois critérios: 1) ser utilizado em conformidade com a licença de uso fornecida pelo autor do item; e 2) “[...] em segundo lugar, a utilização do objeto de aprendizagem implica o conhecimento de suas características, potencialidades e deficiências, para que seja aplicado de forma apropriada para atingir o objetivo de aprendizagem requerido”.
Ainda com relação à utilização de REA, o pesquisador americano David Wiley ampliou e sistematizou os chamados 5Rs, que seriam as liberdades mínimas de um REA.

Um dos fatores mais relevantes dos REA encontra-se no auxílio que essa atividade proporciona aos usuários no momento da escolha do recurso, pois permite que selecionem o recurso mais adequado ao uso a que se destina, além da garantia da qualidade do material.
A qualidade do REA pode ser examinada a partir dos seguintes aspectos: precisão, reputação do autor/instituição, padrão de produção técnica, acessibilidade e aptidão para o propósito (McGill, 2013). Entretanto, esse processo de qualidade é complexo porque depende do propósito e do público a que se destina. Nesse sentido, é importante citar o Learning Object Review Instrument (LORI) – Instrumento para Avaliação de Objetos de Aprendizagem, em sua versão 2.0, ferramenta destinada a avaliar a qualidade de um recurso educacional digital. Por meio do LORI, é possível avaliar os objetos de forma comparativa, já que ele fornece um padrão comum de avaliação.
Ao se avaliar um objeto com o LORI, conforme Nesbit, Belfer e Leacock (2009, p. 3), oito aspectos podem ser avaliados e comentados pelos revisores: 1) qualidade do conteúdo; 2) alinhamento dos objetivos de aprendizagem; 3) feedback e adaptação; 4) motivação; 5) concepção de apresentação; 6) utilização interativa; 7) acessibilidade; e 8) conformidade com os padrões.
Em suma, os formatos abertos buscam garantir a livre disseminação do conhecimento e assegurar o compartilhamento e a qualidade dos recursos educacionais. Por isso, os REA representam grande potencial no processo de ensino-aprendizagem, tanto da educação tradicional presencial, quanto no ensino on-line.
3 A BIBLIOTECA UNIVERSITÁRIA E OS RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS
A biblioteca universitária pública, imbuída de sua missão de integração e assessoria às atividades de ensino, pesquisa, extensão e inovação no âmbito da universidade, tem como aliados os REA, desde que a interface entre ela e esses recursos se estabeleça justamente por conta dos princípios destes últimos, no que tange à adoção de formatos e práticas pedagógicas abertas e compartilhadas e, sem dúvida, pelo vínculo aos princípios de inclusão, acessibilidade, equidade e ubiquidade.
Conforme os bibliotecários acadêmicos aprofundam seu envolvimento com a comunidade REA, eles aprendem que REA autênticos não são apenas acessíveis gratuitamente, mas também estendem a seus usuários um conjunto de permissões para reutilização, adaptações, redistribuição e outros direitos. Um vídeo do YouTube pode ser de acesso gratuito, mas, ao contrário dos REA verdadeiros, ele pode não oferecer tais permissões para aqueles que desejam reutilizar ou modificar o conteúdo (Bell; Salem, 2017, p. 78, tradução nossa).
A partir do exemplo dos vídeos disponibilizados no YouTube, é notório que eles se encontram sob a égide dos direitos autorais tradicionais, então com possibilidades muito mais restritas de criação, edição e reutilização do conteúdo, se comparados aos REA. É preciso atenção à legislação que rege cada um dos recursos mencionados. Desse modo, o bibliotecário atuará como ente que promoverá a educação e a capacitação de seus usuários, disponibilizando um leque de opções para que estes concretizem suas pesquisas e demandas informacionais sobre REA. Todavia, conforme argumentam Hannon, Huggard, Orchard e Stone (2014), a mudança educacional, na prática, continua sendo um desafio, e a adoção de REA, uma ruptura radical com as práticas institucionais até então adotadas.
Os REA anunciam uma ruptura com o tradicional, com os direitos autorais convencionais e com a cultura de produção científica. Justamente por conta desses argumentos e do propósito das universidades públicas e, mais precisamente, da biblioteca universitária pública, é que a busca por delimitar ações de transformação da cultura de produção científica precisa ser repensada. São os REA que possibilitam essa mudança, no momento em que os profissionais da informação percebem a importância deles para a produção/seleção e o acesso a esses recursos, bem como para o aprimoramento da competência em informação da comunidade acadêmica usuária.
Precisamente o bibliotecário que atua na biblioteca universitária tem o desafio de ser um agente multiplicador dos objetivos e da importância dos REA para subsidiar as atividades acadêmicas, uma vez que o acesso aberto confere ao trabalho dos educadores/investigadores maior visibilidade e a possibilidade de medir essa visibilidade, como também o que é mais lido e conhecido e, portanto, o que produz maior impacto (Pisté-Beltrán; García-Quismondo, 2018, p. 280).
Institucionalmente, no âmbito das universidades, um passo inicial para o estabelecimento de uma iniciativa de REA consistiria na revisão dos programas e políticas existentes e na determinação de metas e estratégias para a formação de parcerias com consórcios de bibliotecas. Esse seria um dos esforços para apoiar estrategicamente a educação aberta e as iniciativas de acesso aberto (Bell; Salem, 2017).
Uma segunda ação de importância para as bibliotecas universitárias consiste no fortalecimento das iniciativas de acesso aberto a partir da consolidação de repositórios de REA, oriundos de políticas bem delimitadas e estabelecidas no âmbito da instituição, visando “[...] construir capacidades para lançar e sustentar atividades, projetos e políticas de Acesso Aberto (REA) e OD (Dados Abertos) na região, especialmente nos níveis nacional e local” (Salvo, 2015, p. 2).
O tema assume relevância no debate mundial, pois o simples uso e a criação de REA não garantem que eles estejam acessíveis. Nesse quesito, o repositório de REA na biblioteca universitária é imprescindível, para concretizar iniciativas politicamente estruturadas e apoiadas por ações de curadoria e preservação digitais de conteúdos, voltadas ao compartilhamento e à criação de novos recursos para a educação e a aprendizagem.
Os REA, por suas características, estão diretamente ligados à inovação e têm um efetivo potencial de colocar em prática um modelo conceitual crítico de inovação curricular. Assim, a sala de aula se transforma em um local privilegiado, onde acontecem mudanças e onde as inovações curriculares e tecnológicas estão orientadas para a melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem (Costa, 2012). Tanto para professores e bibliotecários, como para alunos e/ou usuários da biblioteca, o REA é um insumo que fortalece o estabelecimento de novas relações de ensino-aprendizagem.
Nessa perspectiva, a promoção de REA é uma oportunidade para o bibliotecário desempenhar um papel ativo no processo de ensino-aprendizagem, ajudando os estudantes a se envolverem com ferramentas inovadoras de ensino (Crozier, 2018). Para Woodward (2017), os bibliotecários estão fortemente posicionados para serem líderes do movimento de adoção de REA em suas instituições. No entanto, esses profissionais precisam demonstrar o potencial da biblioteca na descoberta e na preservação de recursos educacionais em suas instituições, uma vez que, como mostra o estudo de Bell e Salem (2017), os bibliotecários raramente são identificados pelos docentes como sendo potenciais promotores de REA.
A European Network of Open Education Librarians (ENOEL) defende que as bibliotecas das Instituições de Ensino Superior (IES) sejam peças-chave para tornar os recursos e as práticas educacionais abertas e reutilizáveis e que os bibliotecários tenham um papel importante no avanço da educação aberta (ENOEL, 2021). É notório que, no contexto educacional internacional, o tema REA está inserido nas atribuições dos bibliotecários.
Francis (2021) coletou informações sobre iniciativas de REA em bibliotecas de instituições de ensino públicas e privadas e detectou que, dos 204 bibliotecários participantes da pesquisa, 44% responderam que sua biblioteca já havia participado de alguma iniciativa de REA na universidade, 19% responderam que uma iniciativa estava em desenvolvimento naquele momento e 16% responderam que não havia, mas que tinham planos para uma iniciativa. Colson, Scott e Donaldson (2017) destacaram as principais objeções citadas pelos docentes para a promoção de REA no ensino superior: 1) falta de informação sobre REA; 2) falta de descoberta de repositórios; 3) falta de uma distinção clara entre REA e recursos digitais; 4) tempo e esforço para usar REA; 5) disponibilidade desses recursos ao longo do tempo; e 6) questões relativas à qualidade.
Portanto, em relação ao fornecimento de informação, a promoção da descoberta, ao depósito adequado e permanente, a oferta de REA de qualidade, a biblioteca tem muito a colaborar com o corpo docente e com o movimento de educação aberta. As bibliotecas universitárias e seus profissionais, com capacitação e experiência na organização, preservação e recuperação da informação e no desenvolvimento da competência em informação, podem ajudar a universidade a responder às novas exigências do ensino superior híbrido e a tornar a educação mais acessível e de qualidade para todos.
4 METODOLOGIA
O cenário delineado teoricamente sobre REA neste estudo baseou-se na identificação dos seguintes problemas: 1) REA é um tema insuficientemente conhecido no âmbito das bibliotecas das instituições públicas de ensino superior; e 2) os REA produzidos por essas instituições públicas brasileiras encontram-se dispersos em repositórios institucionais, plataformas educacionais e sites.
Os problemas delineados suscitaram o estabelecimento dos seguintes objetivos: conhecer as políticas e práticas de REA no ensino superior público brasileiro; identificar as percepções dos bibliotecários dessas instituições em relação aos REA; e caracterizar as condições de acesso, de seleção, de reuso e de armazenamento/preservação dos REA.
Assim, para dar cumprimento aos objetivos, os procedimentos metodológicos consideraram os seguintes aspectos: quanto à natureza, trata-se de uma pesquisa aplicada, porque pretende gerar conhecimento, visando a uma aplicação de ordem prática; quanto à abordagem, será do tipo qualiquantitativa, partindo do entendimento de que esse procedimento é o melhor para aprofundar o conhecimento sobre o fenômeno REA nas IES públicas brasileiras e que a representação numérica obtida subsidiará a análise da situação. Quanto aos objetivos, trata-se de uma pesquisa exploratório-descritiva, porque busca, de um lado, familiarizar-se com o problema para torná-lo explícito e, de outro, pretende descrever os fenômenos que envolvem essa realidade; quanto aos procedimentos, será um estudo de caso, com técnica de levantamento de dados da população-foco, qual seja, os bibliotecários de universidades públicas e institutos federais registrados no e-MEC, sistema eletrônico de acompanhamento dos processos que regulam a educação superior no Brasil, do Ministério da Educação. Após a obtenção dos nomes das universidades e dos institutos federais, iniciou-se a pesquisa nas páginas web das bibliotecas para obtenção dos contatos (correios eletrônicos) dos bibliotecários.
O instrumento de coleta de dados adotado foi um formulário, estruturado em duas partes: na primeira, constava uma pergunta em relação à declaração de aceite em participar da pesquisa e, na segunda, 21 perguntas (fechadas e abertas), sendo 19 perguntas temáticas e, por último, 2 perguntas de caráter opcional, sobre o nome da instituição e correio eletrônico de contato dos participantes.
O formulário foi enviado aos bibliotecários das instituições selecionadas por e-mail institucional (individual e/ou de setor), no período de 29 novembro de 2021 a 30 de março de 2022. Como recurso de divulgação e sensibilização dos profissionais dessas instituições, utilizou-se também a lista de discussão da Comissão Brasileira de Bibliotecas Universitárias (CBBU) da Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários (Febab). A seguir, são apresentados os resultados obtidos nesse levantamento.
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Visando atender aos objetivos propostos neste estudo, tais como: conhecer as políticas e práticas de REA nas universidades públicas brasileiras; identificar as percepções dos bibliotecários em relação aos REA no âmbito das instituições públicas brasileiras; e caracterizar as condições de acesso, de seleção, de reuso e de armazenamento/preservação dos REA nessas instituições, foram analisadas as questões temáticas coletadas nos 162 formulários.
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Região |
N |
% |
|
Norte |
19 |
11,7 |
|
Nordeste |
39 |
24,1 |
|
Centro-Oeste |
12 |
7,4 |
|
Sudeste |
51 |
31,5 |
|
Sul |
41 |
25,3 |
|
Total |
162 |
100 |
Os bibliotecários que acolheram a pesquisa provêm de universidades e de institutos federais das cinco regiões brasileiras, sendo 130 (90,2%) de instituições públicas federais, 31 (19,1%) de instituições públicas estaduais e 1 (0,6%) de instituição municipal. Dos 162 bibliotecários que participaram da pesquisa, 87 (53,70%) são bibliotecários de setor e, entre eles, 14 são bibliotecários de referência; 47 (29,01%) são gestores de biblioteca setoriais; 14 (8,64%) são diretores de biblioteca central; 5 (3,10%), coordenadores de SIBI/rede de bibliotecas; e 9 (5,55%) assinalaram outras funções.
Em relação à definição do termo REA, constata-se que 71 participantes (43,83%) já conheciam a definição desse termo, conforme apresentado na pergunta 4 do instrumento de coleta de dados, enquanto 91 (56,17%) ainda não tinham conhecimento. Esse resultado, por um lado, justifica-se pelo fato de que REA é um movimento relativamente recente, iniciado em 2002, pela Unesco, visando promover uma educação igualitária por meio da colaboração e do compartilhamento de conteúdos gratuitos de qualidade. Por outro lado, ratifica a observação inicial dos autores deste estudo de que REA ainda é um tema insuficientemente conhecido por parte dos bibliotecários, dado que mais da metade dos participantes desconhecem o conceito de REA de forma mais abrangente.
Quanto às políticas e práticas de REA nas universidades públicas brasileiras, os dados do Gráfico 2 mostram que, na maioria das instituições participantes da pesquisa, existe alguma iniciativa para a produção, coleta ou uso de REA, porém, uma quantidade significativa de profissionais (41,36%) informa desconhecer qualquer iniciativa de REA em sua instituição.

Os dados levantados ainda permitem verificar que o percentual de bibliotecários que participam ou já participaram de ações relacionadas a REA é de 29,63%, ou seja, dos 162 participantes da pesquisa, 48 estão ou já estiveram envolvidos em ações relacionadas a REA.
Quanto à função que os bibliotecários ocupam no processo de REA, a opção “deposita recursos no catálogo da biblioteca” foi marcada 31 vezes e “orienta os professores/pesquisadores para adicionar seu próprio conteúdo REA no RI”, 24 vezes. Foram registradas 13 marcações em “elabora metadados para representação dos conteúdos em repositórios”, 11 em “seleciona REA para o acervo da biblioteca mediante um conjunto de critérios de qualidade previamente definidos”, 10 em “oferece capacitação para os docentes sobre direitos autorais e licenças abertas”, 4 em “faz avaliação de uso da coleção de REA da sua universidade” e 3 em “trabalha com o corpo docente para produzir ou selecionar REA de fontes externas”. A opção “outros” foi assinalada 11 vezes. (Os percentuais extrapolam 100% porque os participantes podiam marcar mais de uma opção).
Observa-se a participação do bibliotecário no processo de REA em serviços mais tradicionais da biblioteca, ou seja, a maioria dos participantes deposita os REA produzidos na instituição no catálogo da biblioteca e/ou orienta professores/pesquisadores a adicionar seu próprio conteúdo REA no Repositório Institucional (RI). Contudo, conforme visto na revisão de literatura, o bibliotecário pode ir além e colaborar de forma ativa com todo o processo de REA e, principalmente, atuar na capacitação de usuários e na curadoria de recursos educacionais de qualidade (busca, seleção, organização, ...) para indexá-los e torná-los acessíveis aos usuários, além de orientar a criação/uso de repositório específico.
Entre os tipos de REA coletados de fontes externas, computam-se livros (34), manuais (22), vídeos (20), posts (20), palestras (20), cursos de curta duração (18), treinamentos (17), guias (17), fotos (15), apostilas (15), videoaulas (14), softwares de aprendizagem (14) e cursos de extensão (13) como os mais assinalados pelos participantes; enquanto fotonovelas (1), histórias em quadrinhos (3), infográficos (7), jogos (7), animações (8), mapas conceituais (8) e podcasts (10) foram menos indicados. Já com relação aos tipos de REA produzidos nas instituições, manuais (89), palestras (82), treinamentos (80), vídeos (78), curso de extensão (78), cursos de curta duração (76), guias (75), posts (75), videoaulas (64) e livros (60) foram os mais assinalados; enquanto fotonovelas (1), histórias em quadrinhos (3), jogos (7), fotos (15), animações (23), infográficos (36), mapas conceituais (22), softwares de aprendizagem (40), apostilas (45) e podcasts (46) foram menos indicados. (Os percentuais extrapolam 100% porque os participantes podiam marcar mais de uma opção). Nessa questão, observa-se que muitas instituições estão produzindo e/ou coletando recursos educacionais, embora os dados levantados não permitam verificar se esses recursos são, de fato, REA, de acordo com as características que os definem.
Quanto às condições de acesso, seleção, reuso e armazenamento/preservação dos REA nas universidades e institutos federais, verifica-se que, entre os canais indicados para disponibilizar os recursos educacionais produzidos ou coletados de fontes externas, o RI foi marcado 91 vezes, redes sociais da biblioteca 64 vezes, repositório de REA internos 23 vezes, repositórios de REA externos 12 vezes, repositório temático 8 vezes, blog da biblioteca 10 vezes, sites institucionais 70 vezes, notebook pessoal ou PC/desktop das bibliotecas 8 vezes e o catálogo da biblioteca 40 vezes. (Os percentuais extrapolam 100% porque os participantes podiam marcar mais de uma opção).
|
Canal(is) ou ambiente(s) onde são disponibilizados os REA |
nº |
% |
|
Repositório Institucional (RI) |
91 |
56,20 |
|
Redes sociais da biblioteca |
64 |
39,50 |
|
Repositório de Recursos Educacionais Abertos da universidade |
23 |
14,20 |
|
Repositórios de recursos educacionais abertos externos |
12 |
7,40 |
|
Repositório temático |
8 |
4,90 |
|
Blog da biblioteca |
10 |
6,20 |
|
Site institucional |
71 |
43,80 |
|
Notebook pessoal PC/desktop da biblioteca |
8 |
4,90 |
|
Catálogo da biblioteca |
40 |
24,70 |
|
Não se aplica |
31 |
19,10 |
|
Outros |
15 |
9,00 |
A principal bandeira do movimento REA é que os recursos educacionais produzidos nas instituições de ensino possam ser acessados, reutilizados, modificados e compartilhados livremente. No entanto, os dados da Tabela 2 evidenciam a dispersão do conteúdo REA, dado que esses materiais estão armazenados em diferentes repositórios, plataformas e sites, o que pode dificultar o acesso e a busca desses recursos pelos usuários, tanto da comunidade interna, quanto da externa. Esse é um ponto também preocupante para os sujeitos pesquisados, como revela um participante:
A instituição produz REA, mas não de forma organizada, sistematizada. Os REA ficam perdidos ou esquecidos após a sua produção, sem divulgação, sem disseminação, sem compartilhamento e troca.
O RI é a fonte mais utilizada para disponibilizar REA nas instituições pesquisadas e, quando questionados se esse recurso conta com uma comunidade ou identificador para conteúdo REA, 20, 99% dos participantes marcaram a opção “sim”, 21,60% marcaram a opção “não” e a maioria (47,53%) assinalou desconhecer. Além disso, 9,88% dos participantes informaram que sua universidade não dispõe de RI, conforme o Gráfico 3.

Os dados levantados ainda permitem verificar que apenas 9, 88% dos catálogos das bibliotecas das universidades pesquisadas contam com um identificador para o conteúdo REA.
Conforme explicitado na revisão da literatura, entre as principais objeções citadas pelos docentes para a promoção de REA no ensino superior estão a falta de informação sobre REA e a falta de descoberta de repositórios e disponibilidade desses recursos ao longo do tempo. Assim, facilitar o acesso e a recuperação dos recursos educacionais é de extrema importância para a sua promoção e uso. Quando não for possível contar com um repositório específico de REA, os recursos de informação da instituição (repositórios institucionais, catálogos de bibliotecas, bases de dados especializadas) precisam ser atualizados com etiquetas (tags) ou outros recursos similares, para agrupar esse tipo de recurso e assim permitir a sua recuperação de forma mais célere e eficaz.
Como toda fonte de informação, um REA necessita de mecanismos que possibilitem sua busca e recuperação de forma eficiente. Assim sendo, criar repositórios específicos para recursos educacionais é recomendado, porém, ainda são poucos no Brasil. Quando questionados sobre a importância de a universidade ter um repositório específico de REA, a maioria (52,47%) dos bibliotecários respondeu que era muito importante, seguido de 25,31% que consideram extremamente importante. Porém, 15,43% consideram mais ou menos importante, 5,56% pouco importante e 1,23% nada importante.
O processo de REA pode ser ampliado e dinamizado nas instituições com a criação de repositórios específicos para recursos digitais abertos e acessíveis. Como sinaliza a Unesco (2015, p. 9), “[...] REA não resultam automaticamente em qualidade, eficiência e rentabilidade: muito depende dos processos implementados”, sendo que entre esses processos destaca-se a promoção de uma política de apoio.
Quando questionados sobre a existência de uma política e/ou norma para a produção de REA nas instituições, 67,3% dos participantes indicaram desconhecer, 17,3% indicaram que sim e 15,4 que não.

Quanto à existência de avaliação por pares para REA nas instituições, a maioria dos participantes informa desconhecer (74,7%), enquanto 6,8% informam que existe e 18,5% que não existe. Nessa perspectiva, verifica-se também que apenas 6,2% dos bibliotecários indicaram haver uma política de revisão textual para REA na instituição, 17,9% indicaram não haver e 75,9% desconhecem.
Esses resultados, combinados com o baixo percentual de bibliotecários que participam ou já participaram de atividades relacionadas a REA, ratificam dados encontrados em estudos anteriores, a exemplo do que apresenta Francis (2021): as bibliotecas da educação superior já estão envolvidas em ações de REA, porém de forma incipiente. Contudo, ratifica-se que a participação dos bibliotecários em uma equipe multidisciplinar para a produção e disseminação de REA é fundamental, pois esses profissionais podem atuar tanto no processo de elaboração e curadoria, como na orientação dos usuários sobre o acesso, uso e reutilização.
Um percentual significativo de bibliotecários (47,4%) concorda que o termo “REA” não está amplamente utilizado e compreendido em suas instituições. Essa visão dos bibliotecários reafirma o panorama brasileiro, como afirmam Amiel, Gonsales e Sebriam (2018, p. 248) de que “no Brasil, o conhecimento sobre o tema ainda é incipiente, porém crescente [...]”. Para mudar essa realidade, o bibliotecário pode, de forma proativa, atuar como um agente multiplicador dos objetivos e da importância da produção, uso e reutilização de REA em sua instituição, fomentando novas práticas educacionais. Isso já vem ocorrendo em algumas universidades participantes da pesquisa, uma vez que 23 bibliotecários já participaram ou estão participando de iniciativas da biblioteca (workshop, aula, palestra ou cursos) que visam conscientizar e/ou incentivar o corpo docente a adotar REA para o processo de ensino-aprendizagem.
O bibliotecário do ensino superior já atua na disseminação da informação e do conhecimento acadêmico-científico e, como partícipe da rede de comunicação de sua instituição, pode e deve contribuir também com a organização dos fluxos de informação e do conhecimento para promover, melhorar a prática e disseminar REA, favorecendo, assim, o ensino, a aprendizagem e a construção do conhecimento em colaboração nas instituições.
Rosa (2021, p. 839) ressalta que “[...] o aprimoramento dos recursos entre grupos diversos permitirá a inclusão e equidade referentes à criação, acesso, reutilização, adaptação e redistribuição dos REA”. Contudo, é fundamental que os bibliotecários participem de cursos e de capacitações, com o objetivo de desenvolver habilidades quanto às questões de conteúdo, ensino, aprendizagem e conhecimentos técnicos que estão envolvidos em um processo de REA e que são fundamentais para a produção de conteúdos educacionais de qualidade.
Destacam-se as principais iniciativas e/ou medidas necessárias para melhorar o processo de REA nas IES, de acordo com a análise das sugestões indicadas pelos bibliotecários participantes:
•Promoção de capacitação sobre REA para bibliotecários e comunidade usuária;
•Elaboração de normas e formulação de política para regulamentar os REA;
•Criação de RI para REA;
•Criação de uma comunidade de REA no RI;
•Divulgação do conceito, dos benefícios e dos usos de REA;
•Infraestrutura adequada (humana, tecnológica, financeira) adequada para REA;
•Conscientização acerca das licenças abertas, vantagens e importância de utilizá-las;
•Envolvimento da comunidade acadêmica em trabalho colaborativo pelo desenvolvimento de REA;
•Etiquetamento e mineração de dados para uma melhor recuperação de REA;
•Iniciativa e gerenciamento por parte dos bibliotecários de referência;
•Apoio institucional para o desenvolvimento de REA;
•Formação de Grupo de Trabalho (GT) orientado ao planejamento, à gestão e ao acompanhamento dos trabalhos relativos aos REA;
•Trabalho em redes de cooperação interinstitucional;
•Levantamento das necessidades dos usuários, coleta e divulgação dos REA disponíveis;
•Busca de conhecimento sobre o assunto;
•Conscientização para viabilizar a adoção de uma ferramenta de coleta e tratamento dos REA.
Acrescenta-se a essas iniciativas e medidas indicadas pelos bibliotecários a necessidade de se promover, no contexto institucional, a competência informacional, uma vez que para acessar e usar REA de qualidade, as pessoas precisam saber encontrar, avaliar, gerenciar e usar a informação.
Quando questionados se tinham mais alguma questão sobre REA que não havia sido abordada nas questões anteriores do formulário, os bibliotecários fizeram as seguintes considerações:
Por se tratar muitas das vezes de material pessoal, como por exemplo aqueles de uso em aulas, creio que ainda exista muita resistência por parte de alguns envolvidos em disponibilizar esses conteúdos de forma ampla. Creio ser necessário iniciar com uma abordagem de conscientização para então viabilizar a adoção de uma ferramenta de coleta e tratamento dos REA.
Verificamos que existem nas universidades financiamentos para a produção de diferentes materiais que poderiam ser classificados como REA. Havendo uma política sobre REA, estes editais poderiam trazer toda a orientação de como tornar visível e disponível esse material produzido, de forma centralizada [...]
Talvez exista algum movimento sobre REA [...] mas infelizmente as universidades trabalham de modo não integrado, pois existem sempre algum ação que não é buscada a integração com os muitos setores das universidades, digo isso porque já passei por quatro universidades e todas incorrem nesse mesmo erro da falta de integração de um setor com outros. É até um absurdo afirmar isso quando a prática deveria ser o contrário.
Considero importante divulgar melhor o conceito na universidade. Nota-se que ainda está muito difícil apresentar a diferença entre um repositório de dados e um repositório institucional, por exemplo. Que são duas questões cobradas por agências de fomento e amplamente discutidas na ciência aberta. Dessa forma, acredito que será ainda mais difícil implantar o conceito e conscientizar a respeito dos recursos educacionais abertos. Acho que os docentes costumam falar muito sobre ‘materiais didáticos’ e/ou ‘mídias (digitais) didáticas’, mas nunca ouvi ‘REA’ em uma discussão de pesquisadores da matemática.
Vocês estão de parabéns por essa iniciativa. Acho essa pesquisa muito pertinente e estou desenvolvendo uma pesquisa na mesma linha. Vamos unir forças em prol dos REA. As recomendações da Unesco estão aí pra nos ajudar e, claro, as iniciativas e ativistas brasileiros que são importantíssimos para essa construção.
Considero importante suscitar discussões acerca da produção de REA acessíveis, que apresentam outras peculiaridades de disponibilização e etiquetamento.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao revisar a literatura científica e realizar a pesquisa empírica, infere-se que a cultura do ensino-aprendizagem no âmbito do ensino superior vem se modificando em busca de uma educação aberta, igualitária, colaborativa e de melhor qualidade. Os REA, considerados como recursos educacionais de qualidade que podem ser compartilhados de forma acessível para facilitar a reutilização por outras pessoas, fazem parte dessa nova forma de pensar e praticar a educação.
Os achados deste estudo mostram que REA é um tema insuficientemente conhecido no âmbito das bibliotecas das instituições públicas de educação superior, bem como respondem às perguntas norteadoras definidas inicialmente: – Quais as possíveis causas do desconhecimento sobre REA, por parte dos bibliotecários, e da dispersão desses recursos no âmbito das instituições públicas brasileiras de ensino superior?
Em relação à dispersão, verifica-se que as universidades e os institutos pesquisados estão produzindo e/ou coletando de fontes externas diferentes tipos de REA, mas a maioria das iniciativas analisadas ratifica que os REA produzidos encontram-se dispersos em diferentes recursos de informação (catálogos da biblioteca, repositórios institucionais, repositórios temáticos, redes sociais, blogs, sites etc.), o que pode dificultar o acesso, a seleção, o reuso e o armazenamento/preservação desses recursos nas referidas instituições. A dispersão pode ser uma consequência também da falta de repositórios institucionais específicos para a gestão dos REA. Para que os REA tenham visibilidade e possam ser recuperados de forma eficaz, é importante a criação de repositórios exclusivos, o que é consenso entre a maioria dos bibliotecários participantes do estudo.
Quanto às possíveis causas do desconhecimento de REA por parte dos bibliotecários, por um lado, verifica-se que o conceito REA ainda precisa ser mais bem disseminado no âmbito da biblioteca e de seus profissionais, uma vez que a maioria desconhece a definição do termo de forma mais abrangente. Na percepção dos bibliotecários pesquisados, o termo REA ainda não está amplamente disseminado e compreendido em suas instituições, o que reafirma o panorama encontrado em outros estudos, em que, no Brasil, o conhecimento sobre REA vem crescendo, porém ainda é incipiente. Por outro lado, a falta de envolvimento dos bibliotecários em iniciativas de REA ainda representa um grande desafio a ser alcançado nas universidades e institutos federais pesquisados, uma vez que parte significativa desses profissionais desconhece qualquer iniciativa e/ou política para a produção, coleta ou uso de REA em suas instituições. A falta de envolvimento dos bibliotecários em iniciativas de REA em suas instituições pode ser outra causa para o desconhecimento de REA por parte desses profissionais.
A maioria dos bibliotecários que participa do processo de REA nas instituições pesquisadas atua apenas depositando recursos no catálogo da biblioteca – o que é positivo, porém poderiam ir além e participar de todo o processo. As iniciativas de produção, coleta ou uso de REA no âmbito das instituições participantes deste estudo carecem de um maior envolvimento das bibliotecas, na perspectiva da construção de uma equipe multidisciplinar de REA, ação importante para o avanço dessa altruística prática educacional nas instituições.
Entre as instituições pesquisadas, um grupo de 23 profissionais já participou ou está participando de iniciativas para conscientizar e/ou incentivar a adoção de REA no processo ensino-aprendizagem, ação proativa e muito necessária para a consolidação da educação aberta e dos objetivos dos REA, orientada à equidade e à educação de qualidade e inclusiva no ensino superior público. Os bibliotecários são essenciais para ajudar a tornar os recursos e as práticas educacionais abertas conhecidas e reutilizáveis.
Assim, para evitar a dispersão dos REA no âmbito das instituições públicas brasileiras de ensino superior, bem como para possibilitar um maior desenvolvimento e conhecimento desse conceito nessas instituições e suas bibliotecas, recomenda-se: a formulação de normas e diretrizes para regulamentar o processo de REA; a criação de repositórios institucionais específicos; a criação de equipes multidisciplinares, incluindo os bibliotecários; e a promoção de capacitação para a comunidade acadêmica. O trabalho colaborativo e a promoção da competência em informação serão fundamentais para mobilizar conhecimentos e consolidar interesses comuns em benefício de ações concretas para o desenvolvimento de REA.
Os dados coletados não permitiram verificar se os REA produzidos e/ou coletados nas instituições pesquisadas contavam com as devidas liberdades que devem caracterizar esse tipo de recurso, tais como: liberdade de usar o original em distintos contextos, liberdade de adaptar e melhorar o REA, liberdade de remixar, liberdade de compartilhar, de fazer cópias e de guardar o recurso em qualquer dispositivo pessoal. Isso pode direcionar para novos estudos sobre essa temática, a fim de elaborar futuras diretrizes e recomendações para a implantação de uma política de REA nas instituições públicas de ensino superior no Brasil.
REFERÊNCIAS
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Figura 1 - Os 5Rs dos Recursos Educacionais Abertos (baseado em David Wiley)
Fonte: Sebriam, Markun e Gonsales (2015, p. 35).
Tabela 1 - Distribuição geográfica das universidades participantes da pesquisa
Fonte: dados da pesquisa.
Fonte: dados da pesquisa.
Gráfico 1 - Conhecimento da definição do termo REA
Gráfico 2 - Iniciativa para a produção, coleta ou uso de REA na instituição
Fonte: dados da pesquisa.
Tabela 2 - Canal(is) onde são disponibilizados os REA produzidos na universidade
Fonte: dados da pesquisa.
Fonte: dados da pesquisa.
Gráfico 3 - Comunidade/identificador para o conteúdo REA no RI
Fonte: dados da pesquisa.
Gráfico 4 - Existência de políticas para a produção de REA