Dependência estrutural e reprimarização da América Latina: aportes de Ruy Mauro Marini


Rubens Sawaya*


Resumo: O processo de industrialização dos países da América Latina com capital transnacional implicou complexas relações de dependência com relação às economias centrais. Essa forma de industrialização torna a dependência estrutural. Isso implica em que os países que lograram se industrializar passam a integrar o processo de acumulação mundial de capital dominado pelo capital transnacional de forma subordinada, como local de extração constante de valor excedente produzido, transferido para os países centrais. Marini demonstra como esse processo se materializa no ciclo de acumulação capitalista, de um lado, na dependência de importação de máquinas, equipamentos, tecnologia e conhecimento; de outro, pela concentração de valor nas mãos das corporações transnacionais que detêm o controle dos nódulos centrais das cadeias de valor, via filiais localizadas na periferia ou não, e que, portanto, têm poder de se apropriar de valor criado na cadeia produtiva da periferia. O artigo busca relacionar essa dependência estrutural, a partir das contradições dinâmicas que cria para a acumulação na periferia, com a adoção do neoliberalismo a partir dos anos 1990, que acaba por desindustrializar a periferia.

Palavras-chave: Desenvolvimento. Dependência. América Latina. Acumulação de capital


Abstract: The process of industrialisation of Latin American countries with transnational capital implied complex dependency relations with respect to the central economies. It makes dependence structural, and implies that the countries that managed to industrialize began to integrate the process of global accumulation of capital dominated by transnational capital in a subordinate way, as a place of constant extraction of surplus value produced, that is transferred to the central countries. Marini demonstrates how this process materializes in the capitalist accumulation cycle, on the one hand, in the dependence on imported machinery, equipment, technology and knowledge; on the other hand, through the concentration of value in the hands of transnational corporations located in the periphery (via subsidiaries) or not, which have control over the central nodes of the value chains, and therefore have the power to appropriate the value created in the production chain of the periphery. This article seeks to relate this structural dependency, from the dynamic contradictions that it creates for accumulation in the periphery, to the adoption of neoliberalism from the 1990s, which ends up deindustrializing the periphery.

Keywords: Development. Dependency. Latin America. Capital Accumulation


Resumen: El proceso de industrialización de los países latinoamericanos con capital transnacional implicó


* Doutor em Ciência Política (2003) pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Atualmente é professor do Depto. de Economia da PUC-SP e vice-coordenador da pós-graduação (strictu sensu) em economia política na mesma instituição. É Diretor do IIPPE (International Initiative for Promoting Political Economy), ex-presidente da ANGE (Associação Nacional de Cursos de Graduação em Ciências Econômicas), ex-vice-presidente da SEP (Sociedade Brasileira de Economia Política). Autor do livro “Subordinated Development: Transnational Capital in the Process of Accumulation of Latin America and Brazil, Brill - Leiden/Boston 2018.

complejas relaciones de dependencia con respecto a las economías centrales. Esta forma de industrialización convierte la dependencia en estructural. Esto implica que los países que han conseguido industrializarse pasan a formar parte del proceso de acumulación mundial de capital dominado por el capital transnacional de forma subordinada, como lugar de extracción constante de plusvalía producida, transferida a los países centrales. Marini demuestra cómo este proceso se materializa en el ciclo de acumulación capitalista, por un lado, en la dependencia de maquinaria, equipos, tecnología y conocimientos importados; por otro, a través de la concentración de valor en manos de empresas transnacionales que tienen el control de los nodos centrales de las cadenas de valor, a través de filiales situadas o no en la periferia, y, por lo tanto, tienen el poder de apropiarse del valor creado en la cadena de producción de la periferia. El artículo trata de relacionar esta dependencia estructural, a partir de las contradicciones dinámicas que crea para la acumulación en la periferia, con la adopción del neoliberalismo a partir de los años 1990, que acaba desindustrializando la periferia.

Resumen: Desarrollo. Dependencia. América Latina. Acumulación de capital

Introdução


O Brasil e a Argentina, dentre outros países latino-americanos, já foram um dia chamados de “new industrialized countries”. A expressão referia-se ao aparente sucesso em seu processo de industrialização dos anos 1950 e 1970, dentro da ideia de superação do subdesenvolvimento rumo a uma sociedade civilizada, a exemplo dos países centrais desenvolvidos.


Em geral, as teorias do desenvolvimento, como sinônimo de industrialização, de-fendiam o processo, qualquer que fosse a forma ou o comando sobre a dinâmica de acumulação de capital e as formas de apropriação do valor criado nessa dinâmica. Os próprios termos “comando” ou “poder” não tinham sentido na lógica dessas teorias tradicionais sobre o desenvolvimento (AGARWALA; SINGH, 1969), ainda de base rostowiana (MEIER, 1984), que pautavam o debate no pós-II Guerra sobre o que era e como se dava o desenvolvimento, vendo-o como a passagem de uma sociedade agrária para uma sociedade industrializada de consumo de massas (ROSTOW, 1978), em uma tipificação pouco atenta às realidades concretas das economias pri-mário-exportadoras da América Latina.


A lógica do processo de desenvolvimento latino-americano da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) superava a análise das etapas do desenvolvimento de Rostow baseadas na lógica imaginária do processo de desenvolvimento dos países centrais. Apontava que não seria possível sair da armadilha primário-exportadora sem uma ação específica, planejada pelo Estado, situação que em pouco se igualava à evolução hipotética fundada em uma ideia de desenvolvimento dos países centrais, mesmo considerando que em Rostow (1978) o Estado tinha importância para o processo muito além do neoliberalismo atual.


A Cepal construiu a base teórica para o processo de industrialização adotado por parte dos países da América Latina. Apesar do sucesso aparente, a industrialização criou novas formas de dependência, percebidas no final dos anos 1960 e início dos anos 1970. Uma das questões centrais estava na não diferenciação da origem do capital no controle do processo, se nacional ou estrangeiro. Não tinha como foco as relações de poder e controle que determinam a dinâmica do processo de acumulação capitalista, dinâmica centrada em uma lógica imperialista materializada na industrialização por meio de grandes grupos transnacionais no controle dos setores mais dinâmicos localizados nos nódulos das cadeias de valor que se constituíram interna-

mente, dinâmica fortemente conectada ao processo mundial de acumulação de capital. Prebisch (2000), ao apontar que o capital transnacional era bem-vindo e permitia à periferia “pular etapas”, não percebe as relações de poder econômico e político que implicava a atração desse capital na subordinação das economias periféricas.


Nas teorias do desenvolvimento tradicionais – mesmo no âmbito da Cepal – que embasaram o processo de industrialização, o capital transnacional era visto apenas como um conjunto de empresas sem pátria, desconectadas das relações de poder mundial e de suas formas de apropriação sobre o valor criado. Demonstravam, assim, desconhecimento sobre quais seriam os resultados da industrialização quando essa ocorria como apêndice do processo de acumulação mundial do capital sob hegemonia dos países centrais, em sua fase expansiva do pós-guerra, por meio de investimento direto estrangeiro – o que acabou por criar, na periferia, estruturas produtivas filiais subordinadas, incorporando essa periferia ao processo de acumulação do centro como uma nova fonte de criação e extração de valor.


As novas teorias da dependência de Furtado, Cardoso e Marini percebem, no final dos anos 1960 e anos 1970, que o processo de industrialização de economias periféricas tais como a do Brasil ocorreu de forma estruturalmente subordinada ao capital transnacional, ao processo de acumulação de capital mundial sob a hegemonia dos países centrais, principalmente os EUA, dentro de uma lógica hierarquizada que recoloca o imperialismo clássico em novas bases, com novas formas de controle por sua penetração nas estruturas produtiva e de poder internas das economias dependentes.


Furtado, um dos principais mentores da estratégia de desenvolvimento cepalina, apenas se dá conta do problema das novas formas de dependência que são criadas a partir da industrialização com capital transnacional em meados dos anos 1960, após o golpe de Estado no Brasil, durante seu exílio (SAWAYA, 2020). Percebe as relações de poder que resultam do processo a partir de como se materializam no próprio golpe de 1964 no Brasil. De qualquer forma, seu foco central foi a dependência tecnológica, relacionada à não internalização de setores de bens capital, ou, de certa forma, à não construção do “edifício” completo, para tomar as palavras de Tavares (1998).


Também Cardoso percebeu as novas formas de dependência ao capital transnacional após a industrialização. Mas, ao contrário de entender a fundo o problema, de-fendeu o aprofundamento do “desenvolvimento associado” ao capital transnacional (CARDOSO; FALETTO, 1981). Para ele, a periferia deveria seguir com a industria-

lização subordinada ao processo mundial de acumulação, ao grande capital transnacional, abrindo-se para sua entrada. Por interessante que possa parecer, com base em sua leitura da clássica teoria do imperialismo de Lenin, Cardoso via esse movimento como próprio da natureza do capital, por isso imaginava que o desenvolvimento da periferia ocorreria pela maior abertura aos investimentos estrangeiros. Imaginava que isso levaria a uma convergência crescente da periferia ao centro em seu processo de desenvolvimento (TRASPADINI, 1999).


Para os adeptos do “desenvolvimento associado” de Cardoso, bastava deixar as coisas caminharem conforme a lógica expansiva do processo de acumulação mundial de capital o que levaria o “capitalismo” – quase sinônimo de “civilização” – a todos os cantos do planeta. Tal pensamento ganhou o poder nos anos 1990 e acabou, sem nada entender, por destruir a estrutura industrial criada pelo processo de industrialização induzido dos anos 1950-70. Confundia desenvolvimento com aprofundamento do processo de acumulação de capital mundial, concepção defendida pela ideologia da globalização que invade o mundo a partir da década de 1980.


Marini (2000), discordando e apontando as falhas na discussão, se aprofundou nas raízes da dependência, sobre como suas novas formas se materializam na periferia após o processo de industrialização com capital transnacional. Por isso, vai além da dependência tecnológica reconhecida que, para o autor, aparece como uma consequência de relações mais profundas. Marini mostra tecnicamente como a estrutura industrial criada se subordina ao capital transnacional instalado nos setores de média e alta tecnologia e por que esse fato impede a superação do subdesenvolvimento dentro da lógica capitalista ao não criar um fluxo dinâmico capitalista autônomo, ou mesmo impedir a construção do “edifício” completo imaginado por Tavares. Marini (1977) demonstra que se trata de uma “integración imperialista de los sistemas de producción”, na qual o grande capital monopolista do centro ocupa os espaços de acumulação na periferia a partir de seus investimentos diretos e passa a controlar a dinâmica do ciclo de acumulação nessa periferia recém industrializada.


El resultado ha sido un reescalonamiento, una jerarquización de los países capitalistas en forma piramidal y, por consiguiente, el surgimiento de centros medianos de acumulación —que son también potencias capitalistas medianas—, lo que nos ha llevado a hablar de la emergencia de un subimperialismo. (MARINI, 1977).


O objetivo deste artigo é demonstrar como Marini explica o aprofundamento e a sofisticação das novas formas de dependência que se constituem a partir da indus-

trialização de parte da periferia com capital transnacional. Suas análises permitem a compreensão de como essa periferia se vê amarrada a uma lógica do processo de acumulação de capital mundial, o que a impede de promover o desenvolvimento econômico e social, atuando sempre como extensão subordinada às grandes corporações transnacionais, como fonte de extração de valor e com sua dinâmica definida a partir das estratégias desse capital transnacional.


Essa subordinação dinâmica que está enraizada no ciclo do capital na periferia, também permite compreender o processo de desindustrialização e reprimarização da estrutura produtiva que os países latino-americanos sofrem a partir do neoliberalismo dos anos 1990, percebido por Marini naquela década. Nas relações de dependência e subordinação estruturalmente constituídas, o capital transnacional, segundo suas estratégias de acumulação, determina a dinâmica industrial da periferia. A adoção do neoliberalismo nos anos 1990 pela América Latina, com a liberalização financeira e comercial, com a privatização, leva essa região a ser praticamente excluída do processo dinâmico global, levando-a de volta à agricultura e mineração como atividades centrais, retornando à condição primário-exportadora sob novas condições, subvertendo até a lógica do desenvolvimento imaginária de Rostow.


A construção da dependência: industrialização com capital transnacional

O processo de industrialização no pós-II Guerra abriu a América Latina para o capital estrangeiro, principalmente nos setores de média e alta tecnologia, bens de consumo duráveis. As grandes corporações transnacionais se posicionaram nos nódulos centrais de controle das cadeias de valor, então internalizadas, como, por exemplo, as grandes montadoras de veículos automotores no Brasil e Argentina. “Os grupos econômicos internacionais viram crescer sua influência na sociedade política brasileira” (MARINI, 2000, p. 21) enquanto enraizavam-se na estrutura produtiva, ocupando os espaços via investimento direto estrangeiro. A problemática do subdesenvolvimento e do desenvolvimento passa a ser então analisada a partir do “[...] processo de evolução do sistema econômico mundial”, no qual “[...] persiste a divisão entre centro econômico, tecnológico e cultural, e uma periferia subordinada e dependente [...]” (DOS SANTOS, 2000, p. 41).


A entrada do capital estrangeiro na estrutura econômica da periferia foi uma consequência da expansão do capital a partir do centro, com o objetivo de ampliar seus braços de acumulação (BAMBIRRA, 2012; SAWAYA, 2018) no mundo. Tal proces-

so ultrapassa os problemas de realização do valor que era central no imperialismo clássico de Luxemburg e Lênin, modificando sua forma. Assim, o capital estrangeiro montou estruturas produtivas na periferia com o seu excedente de capital fixo produzido no centro e que necessitava de novos espaços, para além dos problemas clássicos de realização do valor, agora para instalar suas estruturas produtivas a fim de ocupar novos espaços de extração de valor na América Latina (MARINI, 1977).


Neste sentido, o imperialismo, em sua corrida expansionista e integradora, não irá se orientar, a partir de então, somente para o domínio das fontes de matérias-primas e mercados, pois, já tendo assegurado um nível fundamental de controle sobre estas fontes, pode dirigir sua atuação para a busca de investimentos [...] nos setores manufatureiros. (BAMBIRRA, 2012, p. 125).


Assim, no final dos anos 1970, por esse movimento, a

[...] economia brasileira tinha [...] um dos maiores graus de internacionalização da produção do mundo. [...] O Brasil ocupou a sexta posição no ranking mundial [...] do grau de desnacionalização da indústria de transformação. As empresas estrangeiras ocupavam 32% da produção industrial. (GONÇALVES 1999, p. 61-63).


Como apontam Marini e Bambirra, tratava-se de uma nova configuração da economia mundial capitalista, de uma nova divisão internacional do trabalho, distinta daquela que caracterizava a relação da periferia como exportadora de matérias-pri-mas que garantem a acumulação pela elevação da mais valia relativa no centro, ao baratear as mercadorias que compõem a cesta básica dos trabalhadores, diminuindo o valor da força de trabalho, bem como pelo barateamento de matérias-primas que elevavam o lucro nos países centrais.


Esse processo de industrialização por investimento direto torna a América Latina um braço anexo do capital transnacional sob o controle do centro, uma extensão da base de acumulação do centro, nova região fonte de extração de valor, por isso Marini o denomina de subimperialismo.


Pasó el tiempo del modelo simple centro-periferia, caracterizado por el intercambio de ma-nufacturas por alimentos y materias primas. Nos encontramos ante una realidad económica en que la industria asume un papel cada vez más decisivo. Esto es cierto aun cuando el capital industrial se amplía y fortalece en áreas extractivas y agrícolas; lo que es todavía más, cuando consideramos la extensión y diversificación a escala mundial de la industria manufacturera. El resultado ha sido un reescalonamiento, una jerarquización de los países capitalistas en forma piramidal y, por consiguiente, el surgimiento de centros medianos de acumulación — que son también potencias capitalistas medianas —, lo que nos ha llevado a hablar de la emergencia de

un subimperialismo … que implica dos componentes básicos: por un lado, una composición orgánica media en la escala mundial de los aparatos productivos nacionales y, por otro lado, el ejercicio de una política expansionista relativamente autónoma, que no sólo se acompaña de una mayor integración al sistema productivo imperialista sino que se mantiene en el marco de la hegemonía ejercida por el imperialismo a escala internacional. (MARINI, 1977).


Na periferia, o capital privado nacional entra nesse processo, participa do ciclo de acumulação de forma subordinada, como “sócio menor” do capital transnacional, nas partes inferiores das cadeias de produção, ou cadeias de valor, como fornecedor para a estrutura produtiva transnacional que ocupa os espaços na periferia. Essa forma de inserção no capitalismo mundial foi o resultado objetivo do projeto de industrialização cepalino, que talvez não imaginasse nos anos 1950 as novas formas de dependência estruturais que estava criando.


O Estado nacional dos países dependentes atua nesse processo de maneira contraditória. De um lado, com suas políticas estratégicas, se subordina, assegura e fornece as bases para o desenvolvimento integrado das forças produtivas locais com o capital transnacional (MARINI, 1977), “[...] criando inclusive as premissas para um poderio militar próprio” (MARINI, 2000, p. 67), como no Brasil. De outro, ao capitanear o processo de industrialização, permite, em parte, a superação da forma de subordinação que caracterizava a economia primário-exportadora, que se integra de uma nova forma no processo de acumulação de capital mundial.


A burguesia nacional, se tinha algum resquício de nacionalismo como imaginava Bambirra (2012), se integra estruturalmente ao processo de produção ocupando as partes menos nobres das cadeias de valor, agora como fornecedora de partes, peças e componentes, dentro da estrutura produtiva dominada pelo capital transnacional. O resultado foi o aprofundamento das relações de dependência (DOS SANTOS, 2000). Como aponta Marini (1977), “[…] precisamente por asumir conscientemente la de-cisión de someterse a la tendencia integradora que le imponen los centros imperia-listas, la burguesía de los países dependientes necesita concentrar y organizar sus fuerzas para hacerlo con provecho”.


Se o processo de industrialização da periferia permitiu a superação da forma da dependência primário-exportadora clássica, a tradicional forma do imperialismo clássico, acabou por criar novas formas de controle estruturalmente mais enraizadas, tanto na esfera da economia como da política, com o controle sobre o Estado nacional exercido pela aliança da burguesia nacional “compradora” (para usar o conceito

de Poulantzas) com os interesses transnacionais que adentram, pelas mãos dessa burguesia, os aparelhos de Estado. Vale lembrar que esse processo ocorreu com apoio dessa mesma burguesia que tomou o Estado em 1964 e substituiu as formas clássicas do imperialismo, no qual o controle militar era externo.


Se essa lógica possibilitou um avanço industrial na periferia, aprofundou a subordinação ao centro, tornando-a estrutural. Esse aprofundamento mostrará sua face concreta quando os países latino-americanos que lograram avançar na industrialização se submeterem ao neoliberalismo dos anos 1990 e, talvez, sem perceber, acabarão por destruir sua própria estrutura industrial sob o comando dos interesses de reestruturação global do capital transnacional que toma corpo na globalização. Isso coloca os países de volta à sua condição primário-exportadora, embora sob novas características.


A dinâmica da economia subordinada de Marini

A forma de inserção da periferia latino-americana que se industrializou no capitalismo mundial define sua dependência estrutural e seu lugar na economia mundial como provedora de valor excedente para a acumulação de capital no centro, e tem como resultado a perpetuação do subdesenvolvimento sobre novas bases, não mais fundadas exclusivamente na dependência primário-exportadora.


Marini se destaca por sua demonstração clara de como esse processo de extração e apropriação de valor da periferia se organiza. O autor demonstra os problemas dinâmicos do processo de acumulação dos países latino-americanos que resultam da industrialização subordinada e que se materializam em crises cambiais e de realização recorrentes. Além disso, esse processo de industrialização dependente não apenas não desmonta as antigas relações primário-exportadoras como as modifica e as mantêm. Como diz Marini (2000, p. 100), “O desenvolvimento industrial capitalista foi, na realidade, o que prolongou no Brasil a vida do velho sistema semicolonial de exportação. Seu desenvolvimento, em lugar de libertar o país do imperialismo, vinculou-o a este ainda muito mais estreitamente [...]”.


O fluxo dinâmico das economias periféricas torna-se subordinado ao processo de acumulação nos países centrais, sob a liderança das grandes corporações transnacionais em aliança com seus Estados nacionais em um novo mecanismo de “partilha do mundo”, para utilizar o conceito de Lenin (1987). Na periferia, essa dominação

ocorre pelo poder econômico enraizado na estrutura produtiva, o que permite captar e transferir mais valia produzida para as corporações transnacionais que estão nos nódulos de controle das cadeias de valor, localizados nos países centrais ou mesmo na periferia, como filiais, mas sempre atreladas ao processo global de acumulação de capital.


Após a industrialização da periferia, como demonstra Marini, a dependência passa a ocorrer por dentro das estruturas produtivas, com a subordinação do capital nacional, da burguesia nacional, ao capital transnacional. O capital nacional, como fornecedor do capital transnacional nas partes menos nobres das cadeias de produção, passa a depender da dinâmica dada pela produção transnacional, de suas filiais em território nacional conectadas às estratégias de suas matrizes nos países centrais, principalmente no caso do Brasil, a exemplo do setor automobilístico.


Partindo da lógica da expressão D-M-D’ de Marx, que define a dinâmica do processo de acumulação de capital e descreve o ciclo do capital1, Marini mostra como a extração de valor se materializa nas duas pontas da circulação. De um lado, D-M pela dependência da aquisição de tecnologia na forma de máquinas e equipamentos importados. Na outra ponta, M-D’ pela forma de apropriação sobre o valor criado na periferia, seja pelo capital nacional subordinado na cadeia de valor, seja como remessas de lucros das transnacionais filiais na periferia para as suas matrizes no centro.


O valor excedente é criado na produção por cada capital individual, cada empresa, mas é na circulação que os capitalistas disputam entre si a massa de mais valia extraída do conjunto de trabalhadores empregados pelos diferentes capitais individuais no processo de produção. Como aponta Marx (1983), a massa de mais valia global é igual à massa de lucros da economia a ser dividida e disputada pelos capitalistas individuais. Essa disputa depende do poder de controle sobre preços que se relaciona à composição do capital, tecnologia, tamanho da empresa, fatores interrelacionados entre si. Esses fatores são determinados pelo lugar que cada capital individual ocupa na estrutura produtiva, o que define seu poder de apropriação sobre o valor criado por outros capitais individuais. “Ao vender-se uma mercadoria acima ou abaixo de seu valor, a mais valia apenas se reparte de maneira diferente” (MARX, 1983, p. 47) entre os capitais individuais.


As diferentes composições do capital dentro de uma mesma cadeia de valor ou


1 Ver também Osório (2012).

mesmo entre capitalistas fora dela é um dos determinantes na disputa pelo valor excedente. Como apontado em Marx e seguido por Marini, as diferentes composições de capital individual definem diferentes preços de produção. As empresas de maior composição de capital conseguem produzir com preços mais baixos em relação às de menor composição de capital, normalmente menos produtivas. Assim, enquanto as mais produtivas podem elevar seus preços acima do valor individual, as menos produtivas são obrigadas a baixá-los para se manterem no mercado. Por esse mecanismo de preços, é transferida a mais valia ou lucro dos setores (empresas) intensivos em trabalho, de baixa composição do capital, para os setores (empresas) intensivos em capital2.


Essas diferenças na estrutura produtiva implicam relações de poder de monopólio ou monopsônio e de oligopólio ou oligopsônio. As empresas intensivas em capital, mais produtivas, detentoras de tecnologia, normalmente grandes corporações, e por isso com elevado poder de controle sobre os nódulos das cadeias de valor, possuem poder de determinação de seus preços com base em suas estratégias. Assim, têm o poder de se apropriar do valor criado dentro das cadeias ou das relações comerciais. “O preço de monopólio de certas mercadorias apenas transferiria para elas parte do lucro de outros produtores” (MARX, 1983, p. 987).


A transferência de valor, por essa lógica, já estava presente nas relações de dependência das economias primário-exportadoras que exportavam produtos de baixa tecnologia e intensivos em trabalho e importavam produtos industrializados do centro, intensivos em capital de elevada tecnologia. Com o processo de industrialização da periferia, essas relações se colocam de novas formas. O capital transnacional ocupa e tem o poder de controle sobre a cadeia de valor por deter a tecnologia e localizar-se em setores de elevada composição de capital e produtividade. Esse é o caso das corporações transnacionais nos setores de bens de consumo duráveis que agora se instalam dentro dos países periféricos. Isso lhes permite determinar os preços dentro da cadeia na relação com seus fornecedores ou revendedores, formados por capitais nacionais. Assim conseguem se apropriar do valor excedente criado nos setores de baixa produtividade e composição do capital, subordinados na cadeia de valor ao capital transnacional em seu nódulo de controle. O exemplo clássico são as montadoras de veículos nos nódulos e o setor de autopeças como empresas subordinadas, satélites.

Esse fato pressiona constantemente para baixo os lucros dos capitais localizados nas partes inferiores das cadeias de valor, aqueles que têm menos poder sobre elas, uma vez que transferem mais valia por eles produzida para as corporações que estão


2 Ver também Amaral e Carcanholo (2012).

nos nódulos de controle. Por isso, acabam por procurar garantir seus lucros baixando os salários dos trabalhadores (MARTINS, 2009), o que acaba por rebaixar os níveis gerais de salários e elevar as taxas gerais de lucro na periferia.


As formas de transferência de valor

A dinâmica de industrialização brasileira por substituição de importações nos anos 1950, com investimento direto estrangeiro, dependia das exportações de produtos primários. Para além da troca desigual (PREBISCH, 2000), já nesse contexto, como aponta Marini (2000), havia transferência de valor da periferia para o centro nos moldes referidos anteriormente. O valor criado internamente no setor primário-ex-portador, o valor excedente, era transferido ao exterior pela importação de meios de produção, capital fixo, necessário ao processo de industrialização (DOS SANTOS, 2000). Quem se apropria do valor excedente criado na periferia pelo setor primário-

-exportador são as empresas do centro, que vendem para a periferia suas máquinas, equipamentos e tecnologia, tanto para as instalações das corporações transnacionais como para a criação do parque industrial de fornecedores nacionais conectados, ou mesmo para equipar os setores de bens de consumo não duráveis que também de-pendiam de importações para sua modernização. Esse mecanismo garantia transferência do valor criado no setor primário-exportador para as empresas transnacionais no exterior (MARINI, 2000).


Essa forma da dependência se sofistica e se modifica a partir da industrialização, com a criação de um parque industrial sob o controle do capital transnacional localizado nos nódulos centrais das cadeias de valor. Cada onda de modernização industrial que exige novos investimentos em equipamentos e tecnologia, puxada pela corporação transnacional que controla o nódulo da cadeia de valor, obriga o capital nacional fornecedor a se modernizar para ser capaz de prover novas partes, peças e componentes dos novos modelos de produtos criados nos países centrais. A indústria nacional em geral se moderniza pela importação de novas máquinas, equipamentos e tecnologia do centro. Assim, a partir da industrialização subordinada, é recons-truída a lógica da dependência de importações em um novo patamar, que implica na transferência de valor e mais valia criada localmente para o exterior a cada onda de modernização.


Ao contrário de livrar-se da dependência clássica, ela se recoloca nos países que não são exportadores de produtos industrializados, como a maioria dos países lati-

no-americanos que lograram se industrializar com capital transnacional interessado em ocupar seu mercado interno. Isso é claro no caso do Brasil. As transnacionais no setor de bens de consumo duráveis não se instalaram aqui para exportar, mas para ocupar o mercado local e regional (outros países da América Latina). A dependência de importação de máquinas, equipamentos e tecnologia passa a definir as necessidades de geração de divisas pelo setor primário-exportador, renovando as relações de dependência sobre novas bases estruturais.


Após a industrialização, a captura de valor pelo diferencial de preços também se manifesta de forma mais clara. De um lado, a periferia continua a exportar produtos comuns de baixo valor agregado e menor composição do capital, e a importar produtos de setores que detêm o monopólio da tecnologia incorporada e de produtos de elevado valor agregado e composição do capital. Os fornecedores de bens capital do exterior detêm o poder de impor preços de monopólio, o que “[...] permite que [...] vendam seus produtos a preços superiores ao seu valor” (MARINI, 2000, p. 121), obrigando, assim, à transferência de valor produzido na periferia para o centro. A novidade está em que o produtor nacional não tem como escapar, uma vez que normalmente a tecnologia a ser importada é definida pela corporação transnacional (instalada ou não na periferia), que encomenda ao produtor nacional as novas partes, peças e componentes. Por seu poder de monopsônio, impõe a tecnologia incorporada nas encomendas que compra do fabricante nacional, deixando clara a nova relação de subordinação estrutural do produtor nacional à estratégia global da corporação transnacional. A transferência de valor ocorre sobre novas bases.


[...] sem contar com um setor dinâmico de bens de capital [...] a indústria manufatureira dos países dependentes se apoia em boa parte no setor de bens de capital dos países capitalistas avançados, por meio do mercado mundial. Por consequência essa indústria manufatureira é dependente não só em termos materiais no que se refere a equipamentos e maquinaria [...] mas tecnologicamente [...] na medida em que deve importar também conhecimento. (MARINI, 2012, p. 28).


Além disso, não apenas o valor internamente criado na periferia vai para o centro pela aquisição de bens de capital, como também é transferido na forma de pagamento por assistência técnica e royalties, ou mesmo como aluguel de equipamento. E não é só a empresa nacional que realiza essa transferência, mas a própria filial transnacional que atua na periferia, também permanentemente importadora de tecnologia, máquinas e equipamentos de sua matriz a cada nova onda de modernização.

Essa dependência estrutural pressiona o tempo todo as contas externas do país pela necessidade de importações de bens de alto valor agregado, fornecidos em base de monopólio, frente às exportações de produtos primários de baixo valor agregado de setores em que a concorrência internacional é bem maior. O resultado aparece no acúmulo de dívida externa a cada onda de modernização do setor manufatureiro, como ocorrido nas décadas de 1970-80 no Brasil e em outros países latino-america-nos. Cabe acrescentar que a transferência de valor criado na periferia ocorre ainda pelo pagamento de juros sobre a dívida externa, o maior peso sobre as economias periféricas nos anos 1980.


Na outra ponta do ciclo do capital, o valor criado pela produção internamente realizada pelo capital nacional é apropriado pelo capital transnacional localizado no nódulo de controle da cadeia de valor, tanto pelo poder de monopsônio na definição dos preços das partes, peças e componentes que compra do fornecedor nacional por um preço abaixo do valor, como pela diferença de composição do capital, produtividade e controle sobre a tecnologia. Assim, há uma tendência à transferência de lucros no interior da cadeia de valor, na cadeia de fornecimento, esteja a transnacional produzindo no país ou no exterior.


Adicionalmente, como a empresa transnacional que produz no país é uma subsidiária, por propriedade ou contrato, de uma corporação que tem sua sede no centro do sistema, a transferência do valor se amplia pela remessa de lucros, pagamentos de juros e aluguéis de equipamentos, royalties sobre a tecnologia.


Na prática, se observam diferentes mecanismos que permitem realizar a transferência de valor [...] que se expressam na maneira como se fixam os preços de mercado e os preços de produção das mercadorias. [...] Esses mecanismos de transferência de valor [são] fundados seja na produtividade, seja no monopólio de produção. (MARINI, 2000, p. 120-121).


Essas relações de dependência garantem, assim, que parte importante do valor criado na periferia não seja apropriada por ela, mas transferida para o centro, de modo a dar continuidade ao processo de acumulação e renovação tecnológica no centro, o que garante a continuidade do sistema de apropriação de valor da periferia e sua condição de subdesenvolvida.


A dinâmica capitalista da economia periférica torna-se, assim, totalmente dependente da dinâmica e dos interesses das corporações transnacionais em seu objetivo de maximizar o valor excedente que extraem do processo. Ao concentrar o excedente

extraído no centro, o grande capital transnacional garante seu contínuo poder sobre o processo de acumulação mundial de capital. A economia periférica industrializada dentro dessas condições é sempre espremida pela transferência de valor e mantida na condição de periferia subimperialista, nos termos de Marini, um caso em que mais se encaixava a economia brasileira na época.


A transferência constante de valor eleva ainda a dependência estrutural sobre as exportações do setor primário como fonte da moeda forte a ser transferida para o exterior. Isso cria uma constante fragilidade que se materializa em crises do balanço de pagamentos, crescimento da dívida externa e escassez de divisas para pagar os compromissos externos estruturalmente determinados. Obriga os países periféricos a promover desvalorizações cambiais para elevar suas exportações ou, como alternativa, os obriga a elevar suas taxas de juros internas para atrair capitais especulativos a fim de resolver os problemas de falta de divisas. O tradicional resultado é a instabilidade de preços, a inflação crônica.


Essa condição de dependência estrutural é alimentada pela própria dinâmica capitalista que o processo cria na periferia. O valor excedente criado na periferia, bem como os efeitos dinâmicos da acumulação capitalista, são constantemente transferidos para fora do subsistema periférico, impedindo a constituição de um fluxo circulatório (para usar a linguagem do equilíbrio geral), a criação do fluxo de acumulação capitalista no local.


Essa situação se agrava pela tendência à baixa de salários na periferia. A pressão sobre os lucros dos setores subordinados que são transferidos para os nódulos de controle das cadeias de valor acaba por pressionar os salários para baixo como forma de recom-por parte desses lucros. Isso dificulta a criação de um mercado interno de bens de consumo, mercado que acaba por se restringir à diminuta classe abastada da periferia. Os empresários nacionais só conseguem manter suas taxas de lucro pelo corte constante de custos. Como os gastos com os investimentos em máquinas, equipamentos e tecnologia estão definidos pela relação de dependência de importações, só resta às empresas pressionar constantemente os salários para baixo, muitas vezes abaixo do valor da força de trabalho, como diz Marini (2000), longe de seguir os ganhos de produtividade3. Esse rebaixamento dos salários também beneficia a filial da corporação transnacional instalada na periferia, permitindo a elevação de sua taxa de mais valia.


3 Ver também Carcanholo (2009).

Esses fatos impedem a periferia de criar um mercado dinâmico que permita a realização do valor localmente. Essa falta é administrada em parte pela concentração de renda nas camadas mais abastadas. Os salários baixos das classes de trabalhadores contribuem para garantir salários e ordenados mais elevados nas classes de proprietários e de funcionários em postos hierarquicamente mais elevados, resultando em uma cisão radical entre esses dois grupos pela elevada concentração de renda. Constituiu-se uma classe daqueles que se integram nessas relações de produção nos níveis mais altos, ou como pequenos e médios empresários, ou como uma elite de administradores e finan-cistas que garantem uma parte maior da renda, ao lado daqueles, a grande maioria, que vive em níveis de subsistência ou até abaixo dela. Assim, em parte, a contradição da falta de mercado interno é compensada pela concentração de renda.


A integração ao imperialismo sublinha, assim, a tendência do capitalismo industrial brasileiro que o torna incapaz de criar mercados na proporção do seu desenvolvimento. [...] O desenvolvimento dessa contradição essencial do capitalismo brasileiro leva à total irracionalidade, isto é, expandir a produção restringindo cada vez mais a possibilidade de criar para ela um mercado nacional. (MARINI, 2000, p. 97).


Portanto, é uma dinâmica que cria uma contradição fatal, que leva a economia a uma crise permanente como resultado do crescimento econômico subordinado, que, como aponta Marini, quanto mais se desenvolve, mais arraigadas tornam-se as contradições que interferem na própria dinâmica. De um lado, as corporações transnacionais se instalaram na periferia em busca de ocupar os mercados locais na América Latina. Ao final, a própria dinâmica em que se sustenta a extração de valor não permite a constituição desse mercado, ao contrário, aprofunda sua destruição, contradição apenas amenizada pela concentração de renda, mas em mãos de um volume diminuto de pessoas, o que dificulta a produção para o mercado interno em escala capitalista e a reprodução do próprio sistema.


Trata-se, como aponta Marini, de uma forma de dependência estrutural na qual a industrialização sob controle do capital transnacional só agrava os problemas, eleva a dependência, a pobreza e a transferência de valor, sem criar uma dinâmica capitalista na periferia. Esse desenvolvimento está muito longe do de uma economia capitalista clássica. “A industrialização não cria, como nas econômicas clássicas, sua própria demanda” (MARINI, 2000, p. 140).


Resumindo, poderíamos dizer que o ciclo do capital na economia dependente se caracteriza por um conjunto de particularidades. Entre elas, o papel que joga o capital estrangeiro na

primeira fase da circulação, tanto sob a forma dinheiro como sob a de mercadoria, assim como o fato de que a produção determina transferências de mais valia (que se farão visíveis na segunda fase da circulação), fixa a mais valia extraordinária e se desenvolve sobre a base da superexploração do trabalho [...]. (MARINI, 2012, p. 35).


Essa lógica contraditória dos sistemas latino-americanos dependentes só conseguiu sobreviver com elevada proteção do mercado interno por barreiras alfandegá-rias que garantiam às grandes corporações aqui instaladas o controle sobre o mercado, com poder de determinação de preços sob relações de monopólio e oligopólio e pela elevada concentração de renda. Quando as medidas de proteção que garantiam a produção na periferia são suspensas pelo neoliberalismo dos anos 1990, parte das corporações transnacionais deixam de lado seus fornecedores locais nacionais ou abandonam a periferia. O resultado é a desindustrialização, escancarando as contradições trazidas à luz pelos estudos de Marini.


Desindustrialização: o retorno à estrutura primário-exportadora

A partir do final da década de 1980, precisamente no caso brasileiro na década de 1990, a periferia latino-americana mergulha no mais radical neoliberalismo. Sem nada entender sobre como o processo mundial de acumulação se modificava, inclusive imaginando que no mundo globalizado o capital se espalharia pelos países menos desenvolvidos naturalmente, resultando em um “mundo plano” (FRIEDMAN, 2005) em que todos poderiam participar de forma igual nesse processo, a periferia latino-americana, envolvida por essa nova ideologia, liberaliza os fluxos financeiros e comerciais e realiza um radical programa de privatização que retira do Estado os setores nacionais dinâmicos, intensivos em capital e detentores de tecnologia, imaginado que essas eram condições necessárias para participar do novo mundo globalizado.


Essa lógica se encaixa perfeitamente na teoria do desenvolvimento que defendia o aprofundamento da associação com o capital transnacional, de Cardoso e Faletto, exposta no livro escrito em 1970 por eles, além de ter servido como justificativa para a ideia de que agora cada país se integraria na globalização, participando apenas de uma parte da cadeia de valor, qualquer que fosse, inclusive primário-exportadora.


Em união com o imperialismo, a burguesia acabou por conseguir seu objetivo. A hegemonia dessa aliança se traduziu na implementação do projeto democrático-liberal, [...] com o fim de adequar a economia latino-americana aos interesses dos grandes centros, [...] privatizar, limitar a capacidade de intervenção na economia [...]. (MARINI, 2005, p. 227).

Isso significa que não faria mais sentido o velho projeto de industrialização clássico de construção completa do “edifício”, com todos os departamentos, de bens de consumo e bens de produção. Portanto, não faria mais sentido a adoção de políticas industriais autônomas, no sentido de diminuir a dependência estrutural detalhadamente explicada por Marini. A política industrial foi abandonada. E, diante do total desconhecimento sobre a diferença crucial de um país que participa da globalização a partir de setores intensivos em capital e tecnologia, de elevada composição, fatores que lhe dão poder de apropriação sobre a mais valia e poder de monopólio, e um país que participa do processo a partir de setores intensivos em trabalho, de baixo valor agregado.


Como afirma Marini em artigo de 1996, “[...] neoliberalismo não é um incidente, mas a alavanca por excelência de que se valem os grandes centros capitalistas para solapar as fronteiras nacionais a fim de liberar o caminho para a circulação de mercadorias e capitais” (MARINI, 2000, p. 292).


Hoje está claro que a chamada “globalização” foi um processo de liberalização que permitiu a reestruturação global do capital transnacional como resposta à crise de acumulação dos anos 1970, e que resultou na mais ampla reestruturação mundial do capital (SAWAYA, 2018). Tratou-se de uma reengenharia global dos grandes grupos transnacionais que redefiniram seus espaços de acumulação mundial num amplo processo internacional de centralização do capital por fusões, aquisições e joint ventures, como revelam relatórios da United Nations Conference on Trade and Development (UNCTAD, 2000) ao qualificar o tipo do investimento direto estrangeiro nos anos 1990. Nesse movimento, o capital transnacional reorganiza de forma radical suas estruturas produtivas no mundo, sob seu controle. Fecha instalações em determinados países, refaz sua rede de fornecedores mundiais, elevando os mecanismos de controle sobre as cadeias de valor (CHESNAIS, 2016).


O resultado foi a desindustrialização da América Latina e seu retorno à condição primário-exportadora, como previa Marini em 1996:


[...] o regresso de países (claro que sob métodos de gestão plenamente capitalistas, à diferença do que acontecia antes) à forma simples de divisão internacional do trabalho que primava no século XIX e que implicava na troca de bens primários por bens manufaturados [...]. (MARINI, 2000, p. 283).


Cabe lembrar que esse retrocesso também leva esses países às formas tradicionais de transferência de valor da periferia para o centro, detalhadas por Marini, mas com

algumas importantes diferenças. No século XIX o Brasil era exportador, quase monopolista, de café. Detinha sob seu controle a produção e a comercialização. O setor era ainda intensivo em trabalho assalariado. Isso significa que, mesmo como primário exportador de café, o Brasil, por controlar a cadeia de produção e comercialização desse produto, detinha um maior poder de apropriação sobre o valor criado e um controle parcial sobre os fatores dinâmicos que na época permitiram a criação de uma indústria básica antes dos anos 1950.


A diferença do café em relação aos setores primário-exportadores de hoje é relativamente importante. O Brasil controla apenas a produção de soja, sendo que a tecnologia da semente e dos insumos é importada de grandes corporações transnacionais, que geram pagamento de royalties e assistência técnica. Também a produção de máquinas e equipamentos para o setor, embora suas partes menos sofisticadas sejam produzidas localmente, é dominada pelo capital transnacional. Finalmente, a comercialização dos produtos é controlada por grandes traders transnacionais, que determinam os preços e, portanto, se apropriam do valor criado. No caso da mineração, o Brasil não controla nenhuma das etapas da cadeia de valor, não produz os equipamentos pesados nem a tecnologia de extração presente nos equipamentos, e os preços são definidos externamente. Para complicar, ambos os setores são hoje intensivos em capital, possuem, portanto, baixo efeito multiplicador via empregos. Se por esse último aspecto se poderia imaginar que os setores têm o poder de se apropriar do valor excedente, são as outras relações de controle que pesam. Dessa forma, a apropriação de valor nas duas pontas do processo de circulação de capital, como detalhado por Marini, não apenas está garantida ao capital transnacional como é fortalecida.


As políticas de liberalização no Brasil reduziram a participação da indústria no PIB de 48%, em 1989, seu pico, para 23% em 2021, e a indústria de transformação para cerca de 11% do PIB. Nesse processo, o parque de autopeças – majoritariamente constituído por capital nacional, com base nas políticas de industrialização por substituição de importações desde a década de 1950 – foi reduzido a menos de um terço e localiza-se nas partes menos nobres das cadeias de valor internas, fundamentalmente na produção de peças e componentes de baixa tecnologia e baixa composição do capital. O Brasil passou a ser importador de partes, peças e componentes mais sofisticados, e o próprio tamanho da cadeia de valor interna do setor de produção de veículos foi reduzido. Algo muito parecido ocorreu com a economia da Argentina, onde o processo de desindustrialização foi muito mais radical e atingiu inclusive sua

tradicional indústria de vestuário.


Pode-se concluir que a maior parte das filiais instaladas no Brasil ajustaram suas estratégias a um ambiente mais aberto com elevada compra de insumos e alguns produtos mais sofisticados tecnologicamente da matriz com o objetivo de atender o mercado interno [...] e em menor medida [...] o Mercosul. (SARTI; HIRATUKA, 2010, p. 13).


Assim, no início da década de 2000, o Brasil deixou de ser exportador de produtos manufaturados (compunham 60% das exportações nos anos 1980) para se tornar exportador de commodities, principalmente para a China, participando da parte menos nobre dessa cadeia de valor em atividades de baixo valor agregado e com baixo poder de controle sobre o valor nela criado, portanto, com efeito dinâmico interno mínimo.


A região [América Latina] permanece um grande abastecedor de matérias-primas e alimentos para o mercado mundial. [...] A especialização produtiva exportadora encontra-se associada a uma espécie de reedição de novos enclaves [que] operam sem estabelecer relações orgânicas com o restante da produção local ao demandar do exterior equipamentos, bens intermediários, [...] tecnologia [...]. Esses novos eixos produtivos constituem, em geral, segmentos de grandes cadeias produtivas globais sob a direção do capital transnacional, que já não obedecem a projetos nacionais de desenvolvimento, sendo o capital mundial o que define que nichos privilegiar e impulsionar nas economias específicas. Nas novas condições [...] a industrialização em torno da produção sob direção local e com resposta às necessidades nacionais acabou por ser derrubado. (OSÓRIO, 2009, p. 113).


Esse processo demonstra que a industrialização criada de forma subordinada à acumulação mundial de capital fundada no capital transnacional, sempre foi extremamente frágil, mantida com políticas de proteção ao capital transnacional e ao mercado interno, justificando a produção em território nacional. Como antes explicado, a própria dinâmica já era debilitada pelo fraco mercado interno. Dessa forma, uma vez suspensas as barreiras que protegiam a estrutura produtiva criada, o resultado é a desindustrialização e o retorno, sobre novas bases, à condição de economias primá-rio-exportadoras na América Latina.


Seguindo Ceceña (2005) talvez se possa dizer que, com a desindustrialização e o retorno à condição primário-exportadora da periferia a partir do neoliberalismo, nem a condição de subimperialismo, que, segundo Marini, só foi alcançada pelo Brasil, se sustentaria. O crescimento da extrema direita incontrolável na América Latina

parece ser a materialização dessa contradição, para desespero da própria burguesia que entregou os países a uma lógica que não pode controlar e que implica apenas o crescimento da pobreza e das tradicionais contradições com novas características.


Conclusão

Buscou-se demonstrar a atualidade da análise de Ruy Mauro Marini para a compreensão das relações profundas de dependência enraizadas nas estruturas produtivas que engessam a periferia, em particular os países da América Latina que, desde o início, criaram uma estrutura produtiva industrial subordinada ao capital transnacional. Essa subordinação funda-se, ainda, nas relações políticas, pela submissão da classe que talvez se possa denominar burguesia “nacional” ao modo de operação do capital transnacional. Por isso, adentra os aparelhos de Estado, em um primeiro momento, com um golpe militar na década de 1960 e, posteriormente, pela formação de uma classe de dirigentes conectados intelectual e ideologicamente aos países centrais, principalmente os economistas com seus Ph.Ds. nos Estados Unidos, que tomaram o poder na década de 1990 e continuam ativos como representantes das frações de classe dominantes em contínua defesa do aprofundamento das relações de subordinação e dependência ao capital transnacional na periferia.


As contribuições de Marini permitem compreender as condições de dependência e a “armadilha do subdesenvolvimento” que se constrói na América Latina, fundamentalmente na Argentina e no Brasil. É interessante notar que, até a década de 1980, as relações de dependência estudadas em A Dialética da Dependência, de 1973, ainda se fundavam em uma economia periférica relativamente industrializada e suas contradições naquele momento. Hoje, com a desindustrialização crescente, aquelas condições não estão mais presentes da mesma forma. O próprio Marini percebe essa mudança em 1996, quando aponta as tendências de esses países voltarem às condições de dependência do século XIX, embora sobre novas bases.


A partir de suas análises sobre como a dependência se materializa no ciclo do capital que permite a apropriação da mais valia produzida na periferia, torna-se claro também como alguns teóricos da dependência dos anos 1970 não percebiam a já clara manifestação da armadilha que se punha ao desenvolvimento. Pior, quem toma o poder nos anos 1990 são justamente aqueles que nada compreendem sobre a profundidade das relações de dependência e que, por isso, agravam a situação, jogando os países de volta à situação primário-exportadora de produtos com baixíssimo efeito

dinâmico para a economia nacional.


Nos anos 1990 ainda não estava claro o papel que a China viria a ocupar no processo de mundialização de capital ao construir uma forma de inserção na globalização totalmente diferente da América Latina, mantendo o capital transnacional sob seu total controle (SAWAYA, 2011). Por isso ela consegue galgar e controlar as partes mais nobres das cadeias de valor globais, enquanto a América Latina se torna subordinada à própria China.


Mas, no artigo de 1996 sobre a globalização capitalista, Marini termina com uma sugestão para essa situação:


Os trabalhadores não poderão reverter a situação se, depois de assegurarem sua unidade de classe, não se colocarem firmemente no terreno da luta pela democratização do Estado, a fim de retirar das classes dominantes o controle da economia e, sobre a base de uma mobilização lúcida e perseverante, estabelecer um projeto de desenvolvimento econômico compatível com a nova configuração do mercado mundial. Só uma intervenção ativa da formulação e implementação das políticas públicas e a ampla utilização de instrumentos da democracia direta, da participação popular e da vigilância cidadã podem proporcionar aos povos latino-americanos condições adequadas para ganhar um lugar ao sol no mundo no século XXI. É neste sentido que a questão econômica se tornou hoje, mais do que nunca, uma questão política, ou, o que dá no mesmo, que a luta contra a dependência não pode se divorciar da luta pela democracia. (MARINI, 2000, p. 294).


É interessante notar a extrema atualidade da proposta de Marini. Como já se sabe, não é um caminho que tem sido fácil, dada a força das frações de classe defensoras do neoliberalismo radical, tanto no Brasil como na Argentina, as quais, para retomarem o poder, jogaram os países nas mãos da mais radical extrema direita, destruindo ins-titucionalmente os países. No Brasil essas classes retomaram o Estado com um golpe em 2016 e instalaram a direita mais destrutiva da estrutura política, social e produtiva no país, levando ao extremo as políticas de liberalização, privatização e destruição do Estado nacional, principalmente de suas instituições. A onda foi tão radical que assustou até os defensores do projeto, talvez com isso abrindo novas portas para uma nova reação organizada, como aponta Marini.


Referências

AGARWALA, Amar Narain; SINGH, S. P. (Orgs.). A economia do subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Forense, 1969.

AMARAL, Maria Silvia; CARCANHOLO, Marcelo D. Superexploração da força de trabalho e transferência de valor: fundamentos da reprodução do capitalismo dependente. In: FERREIRA, Carla; OSÓRIO, Jaime; LUCE, Mathias. Padrão de Reprodução do capital. São Paulo: Boitempo, 2012. p. 87-102. BAMBIRRA, Vânia. O capitalismo dependente latino-americano. Trad. Fernando Correa Prado e Marina Machado Gouvêa. Florianópolis: Insular; IELA, 2012.

CARCANHOLO, Marcelo D. Dependência e superexploração da força de trabalho no desenvolvimento periférico. In: SADER, Emir; DOS SANTOS, Theotonio. América Latina e os desafios da globalização: ensaios dedicados a Ruy Mauro Marini. São Paulo: PUC-Rio; Boitempo, 2009. p. 251-265.

CARDOSO, Fernando Henrique; FALETTO, Enzo. Dependência e desenvolvimento na América Latina: ensaios de interpretação sociológica. Rio de Janeiro: Zahar, 1981.

CECEÑA, Ana Esther. Ruy Mauro Marini, um construtor de caminhos. In: TRASPADINI, Roberta; STEDILE, João Pedro (Orgs). Ruy Mauro Marini: vida e obra. São Paulo: Expressão Popular, 2005. p. 289-302.

CHESNAIS, François. Finance capital today: corporations and banks in the lasting global slump. Chicago: Haymarket Books, 2016.

DOS SANTOS, Theotonio. Teoria de dependência: balanço e perspectivas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.

FRIEDMAN, Thomas L. O mundo é plano: uma breve história do século XXI. São Paulo: Objetiva, 2005.

GONÇALVES, Reinaldo. Globalização e desnacionalização. São Paulo: Paz e Terra, 1999. LENIN, Vladimir I. Imperialismo, fase superior do capitalismo. São Paulo: Global, 1987.

MARINI, Ruy Mauro. O ciclo do capital na economia dependente. In: FERREIRA, Carla; OSÓRIO, Jaime; LUCE, Mathias (Orgs.). Padrão de reprodução do capital. São Paulo: Boitempo, 2012. p. 21-35. MARINI, Ruy Mauro. Sobre o Estado na América Latina. In: TRASPADINI, Roberta; STEDILE, João Pedro (Orgs.). Ruy Mauro Marini: vida e obra. São Paulo: Expressão Popular, 2005. p. 225-236.

MARINI, Ruy Mauro. Dialética da dependência: uma antologia da obra de Ruy Mauro Marini. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2000.

MARINI, Ruy Mauro. La acumulación capitalista mundial y el subimperialismo. Cuadernos Políticos,

n. 12, abr./jun. 1977.

MARTINS, Carlos Eduardo. A superexploração do trabalho e a economia política da dependência. In: SADER, Emir; DOS SANTOS, Theotonio. América Latina e os desafios da globalização: ensaios dedicados a Ruy Mauro Marini. São Paulo: PUC-Rio; Boitempo, 2009. p. 189-216.

MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política. São Paulo: Diefel, 1983. Livro III.

MEIER, Gerald M. Leading issues in economic development fourth edition. New York: Oxford University Press, 1984.

OSÓRIO, Jaime. Padrão de reprodução do capital: uma proposta teórica. In: FERREIRA, Carla; OSÓRIO, Jaime; LUCE, Mathias. Padrão de Reprodução do capital. São Paulo: Boitempo, 2012. p. 37-86. OSÓRIO, Jaime. Dependência e superexploração. In: SADER, Emir; DOS SANTOS, Theotonio. América Latina e os desafios da globalização: ensaios dedicados a Ruy Mauro Marini. São Paulo: PUC-Rio; Boitempo, 2009. p. 167-188.

PREBISCH, Raul. O desenvolvimento econômico da América Latina e alguns de seus problemas principais. In: BIELSCHOWSKY, Ricardo (Org.). Cinquenta anos de pensamento na Cepal. Rio de Janeiro: Record; Cofecon; Cepal, 2000. v. 1. p. 69-136.

ROSTOW, Walt W. Etapas do desenvolvimento econômico (um manifesto não-comunista). Rio de Janeiro: Zahar, 1978.

SARTI, Fernando; HIRATUKA, Célio. Notas sobre a internacionalização produtiva brasileira no período recente e impactos sobre a integração regional. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA POLÍTICA, 15., 2010, São Luiz. Anais do XV Encontro Nacional de Economia Política. São Luiz/MA, 2010.

SAWAYA, Rubens. Celso Furtado, capital transnacional e controle sobre a periferia. In: QUINTELA, Adroaldo et al. (Org). Celso Furtado: os combates de um economista. São Paulo: Expressão Popular;

ABED, 2020. p. 176-190.

SAWAYA, Rubens. Subordinated development, transnational capital in the process of accumulation of Latin America and Brazil. Studies in Critical Social Sciences, v. 124, p. 1877-2110, 2018.

SAWAYA, Rubens. China: uma estratégia de inserção no capitalismo mundial. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, v. 1, n. 28, p. 5-36, fev. 2011. Disponível em: https://revistasep.org.br/ index.php/SEP/article/view/895. Acesso em: 17 maio 2023.

TAVARES, Maria da Conceição. Acumulação de capital e industrialização no Brasil. Campinas/SP: Editora da Unicamp, 1998.

TRASPADINI, Roberta. A teoria da (inter)dependência de Fernando Henrique Cardoso. Rio de Janeiro: Topbooks, 1999.

UNITED NATIONS CONFERENCE ON TRADE AND DEVELOPMENT (UNCTAD). World devel-

opment report: cross-border mergers and acquisitions and development. United Nations, 2000. Disponível em: https://unctad.org/system/files/official-document/wir2000overview_en.pdf. Acesso em: 17 maio 2023