Daniel da Silva Moreira1
Université de Paris 13
moreiradsm@gmail.com
Por que eleger para a própria escrita um gênero que “(...) já há um século e meio, é soterrado sob epítetos difamatórios, tratado sucessivamente de nocivo, hipócrita, sem valor, artificial, estéril, feminino, pueril, entediante, onanista, preguiçoso, neurótico, prolixo, narcísico, fracassado, etc.”2 (STIÉNON, 2009, p. 130, tradução minha). Minha proposta é que o diário seria muitas vezes escolhido por tratar-se de um gênero que, embora historicamente praticado por todo tipo de pessoa, sempre possuiu uma identificação, uma aceitação e uma longa tradição de emprego por discursos da margem3, sendo frequentemente acolhido por grupos colocados fora do centro da sociedade, como as mulheres e os homossexuais, por exemplo. Isso porque, a meu ver, o gênero oferece àquele que o mantém um terreno hospitaleiro ao registro e à discussão de temas que em outros gêneros literários seriam impraticáveis, ou porque haja rejeição aos temas caros ao diarista, ou porque o próprio acesso à escrita e, sobretudo, à publicação, seja privilégio de um determinado grupo social. O conceito de auto-hospitalidade no diário, de que fala Philippe Lejeune, e que explorarei mais adiante, fornece um caminho para a compreensão da dinâmica de apropriação do gênero como uma escrita da margem, ele mesmo um gênero colocado às margens da literatura.
Uma das acusações que aparece com maior constância é, certamente, a de ser o diário um gênero “feminino”, pois ao mesmo tempo em que são as mulheres tidas como as maiores adeptas à prática, há nessa adjetivação uma clara intenção de rebaixar os diários ao mesmo estatuto inferior ao qual a mulher sempre foi relegada em nossa sociedade. Ele seria, então, algo de segunda classe quando comparado ao relevante e central, aos grandes gêneros “masculinos”. Deborah Rosenfeldt observa, num ensaio sobre políticas de gênero no mundo editorial, que mesmo nos gêneros considerados inferiores há uma preferência pela produção masculina:
Memórias, diários, ensaios e cartas – formas nas quais as mulheres escritoras se destacaram – foram crescentemente considerados gêneros subliterários, exceto para aquelas obras que tinham sido reconhecidas como literárias por tanto tempo que seu status era seguro. Consequentemente, a Autobiografia de Franklin, mas não as de Linda Brent, de Elizabeth Cady Stanton, ou de Mary Hunter Austin; os ensaios de Emerson ou Thoureau, mas não os de Margaret Fuller4(ROSENFELDT, 1982, p. 21, tradução minha).
O que a autora diz está em acordo com a constatação que Philippe Lejeune faz em Journaux personnels, les femmes écrivent, les hommes publient [Diários pessoais, as mulheres escrevem, os homens publicam], de que apesar do lugar-comum de que o diário seria um gênero “feminino” – o que pode até ser verdadeiro no plano da prática, pois as mulheres são mais constantes e prolíficas em seus escritos –, são majoritariamente os homens a serem vistos com interesse pelo mercado editorial (Cf. LEJEUNE, 2000, p. 45-46).
Cinthia Gannett, em Gender and the journal: Diaries and academic discourse [Gênero e diário: os diários e o discurso acadêmico], faz um estudo sobre a utilização de diários em sala de aula e sobre a relação destes com a escrita acadêmica, tendo sempre uma problemática de gênero em vista. A autora se ocupa dessas questões de gênero relacionadas às tradições de manutenção de diários, mostrando que, desde o início dessa prática, homens e mulheres o fizeram de modo distinto. Ela teoriza que, em inglês, essa diferença estaria expressa até mesmo na palavra usada para se referir ao gênero, enquanto as mulheres praticariam o “diary”, uma forma privada, pessoal e diária de narração, os homens teriam para si o “journal”, uma forma pública e prestigiosa de escrita. Ela mostra ainda como professores e alunos, ao empregarem o diário em seus cursos, continuam a pagar tributo a essa divisão entre práticas femininas e masculinas. Gannett não deixa de abordar o preconceito contra o diário – a multiplicidade de nomes seria apenas mais uma expressão da tensão existente – e, para compreendê-lo, elabora um cuidadoso histórico das razões que propiciaram que o diário se tornasse um meio de expressão para as mulheres, uma saída para o silêncio que lhes foi socialmente imposto durante a maior parte da história do Ocidente.
A autora começa esse histórico lembrando que, desde os anos de 1970, a crítica – incluindo os pós-estruturalistas, a crítica psicanalítica, a crítica feminista e a estética da recepção – começou a trabalhar no sentido de expor como as ideologias de gêneros literários e de cânone são criadas de e para a elite, europeia, branca, heterossexual e masculina. Os estudos literários reabriram, assim, o questionamento sobre os limites entre público e privado, entre literatura e letramento e entre formas de discurso tradicionais e não-tradicionais. Esses questionamentos, de acordo com Gannett, ajudaram a evidenciar o diário como um conjunto de discursos marginalizados, sendo a tradição de diários de mulheres marginalizada mesmo dentro desse grupo (GANNETT, 1992, p. 120).
Gannett prossegue afirmando que, ao longo da história – ela fala sobretudo nos EUA, após o fim do século XVIII –, havia um número consideravelmente menor de mulheres alfabetizadas que de homens, o que certamente impediu um grande número delas de escrever um diário. Mas acrescenta que, ao longo do tempo, houve um aumento do número de mulheres alfabetizadas, muitas das quais quiseram dar forma a seu mundo e ao mundo de suas mentes em alguma forma de escrita. Para elas, a escrita privada de um diário seria certamente melhor tolerada socialmente que formas de escrita mais públicas, prestigiosas e masculinas (GANNETT, 1992, p. 120-121).
Sendo assim, o que é possível constatar é que, em situações desfavoráveis, de marginalização e precariedade de poder, a forma que historicamente se afigurou como uma alternativa de expressão, nesse caso para as mulheres, foi a do diário, especialmente adequado a isso por seu caráter privado. Cinthia Gannett faz eco às proposições de Rosenfeldt e Lejeune sobre a situação paradoxal de, mesmo quando muitos críticos dizem ser o diário um “(...) gênero para o qual as mulheres sentiram-se especialmente atraídas”5 (MALLON apud GANNETT, 1992, p. 125, tradução minha), a verdade é que, olhando para as obras de fato saídas a público, poder-se-ia ter a impressão de que são os homens seus maiores praticantes. A autora, citando Brian Dobbs, fala em como, através dos tempos, o diário forneceu um “ouvido solidário às mulheres para confidenciarem opiniões que teriam sido consideradas demasiado ultrajantes para a sociedade em que elas viviam”6 e, ainda, uma saída para as “qualidades humanas tais como inteligência, percepção e sensibilidade”7 (DOBBS apud GANNETT, 1992, p. 125, tradução minha). É interessante notar, e acho que esse ponto seja extremamente valioso para a minha reflexão, que há a atestação da existência de um certo sentido transgressor naquilo que se registra no diário. Mais adiante, Gannett encontra ainda outras características positivas do diário, responsáveis por sua adoção plena na vida de inúmeras mulheres ao longo do tempo, segundo a autora, diários “(...) foram um tipo de prática de escrita que permitiu a expressão de um senso de identidade relacional organizado, sendo flexíveis o suficiente para permitir a descontinuidade, lacunas e silêncios, que eram uma parcela inevitável da vida feminina”8 (GANNETT, 1992, p. 148, tradução minha). Assim, o diário proporcionaria a quem o mantém uma forma de estar no mundo e de se inserir na sociedade mesmo numa situação em que esse espaço fosse comumente negado, uma vez que, através dele, a identidade é construída também em seu caráter relacional, ou seja, construída em relação às outras identidades do grupo social. Quem mantém um diário reflete sobre o mundo que o rodeia e constrói a si mesmo de acordo com os seus interesses e finalidades, mas também em relação com as representações simbólicas de seu grupo. Além disso, a prática diarística permitiria, por sua fragmentação e flexibilidade características, ser um meio de expressão em sintonia com os tipos de vivências aos quais as mulheres sempre foram condicionadas.
Cinthia Gannett termina por dizer que, ainda que as mulheres tenham conquistado acesso a gêneros textuais anteriormente reservados aos homens, principalmente nos meios acadêmicos e públicos, a importância dos gêneros marginais, aos quais elas foram historicamente direcionadas, é indiscutível:
(...) mesmo nos domínios discursivos não-acadêmicos e não-públicos aos quais as mulheres foram frequentemente relegadas, muitas delas encontraram caminhos para utilizar o diário para conectar empoderamento pessoal e intelectual. No que algumas vezes é chamado de “zona selvagem” do diário, as mulheres têm sido capazes de explorar seus próprios mundos e o mundo com menos interrupção ou julgamento. Elas puderam descobrir elas mesmas como sujeitos, aprender como trabalhar através da linguagem e inscrever a si mesmas textualmente no mundo e aprender a ouvir suas próprias vozes e sua experiência9 (GANNETT, 1992, p. 149, tradução minha).
Desse modo, pode-se ver que o diário pode constituir-se numa ferramenta de empoderamento para grupos marginalizados pela sociedade. Se uma das grandes estratégias de marginalização é o silenciamento, a interdição de discurso e de representações simbólicas, o diário permite, como Gannett coloca muito adequadamente, que o sujeito se veja como tal e, ainda mais importante, que se inscreva textualmente no mundo, adquirindo justamente aquilo que lhe é normalmente negado: a voz e a existência simbólica.
A partir disso, minha proposta é pensar o diário como uma escrita da margem, um estatuto que sua marginalidade em relação ao cânone dos “grandes” gêneros literários e seu emprego secular pelas mulheres como estratégia de expressão num mundo que lhes nega poder e visibilidade ajudam a confirmar. Assim, da mesma maneira como se afigurou às mulheres como uma alternativa, ouso dizer que o mesmo pode ter ocorrido a outros grupos, que podem ter visto na prática diarística um modo de utilizar uma forma escritural de cunho privado para romperem o silêncio imposto, tudo isso feito na relativa segurança proporcionada pelo gênero. A negação de voz e de visibilidade a esses outros possíveis grupos colocados à margem, se não igual a das mulheres, vai ser muito próxima ou ter muitos pontos de contato. E o diário vai aparecer igualmente como uma resposta de empoderamento e marcação de espaço simbólico na sociedade.
Um componente fundamental para a utilização do diário por grupos colocados à margem da sociedade para nele exprimir aquilo que é considerado interdito ou polêmico é a possibilidade da auto-hospitalidade presente no gênero. Philippe Lejeune fala um pouco sobre como o diarista se sente livre das possíveis opressões que poderiam existir, por exemplo, em gêneros mais públicos:
Um diário é um lugar onde não se tem medo de fazer erros de ortografia, nem de ser burro. É claro que desde que criaram o péssimo hábito de publicar diários, muitas pessoas mostram sua intimidade vestida de paletó e gravata. Mas vocês e eu calçamos nossas velhas pantufas e não damos a menor bola para isso (LEJEUNE, 2008, p. 291-292).
Dessa feita, no diário, seu autor vai experimentar uma sensação de liberdade e segurança, ou ao menos pode fazê-lo se assim o desejar. Lejeune prevê ainda a possibilidade das posturas artificiais ou controladas, justamente porque se pensa na futura publicação das entradas, o que creio que seja importante de se levar em conta no caso de diários de escritores, nos quais quase sempre há a ideia de uma possível edição. Contudo, o principal ensaio do autor sobre a questão da auto-hospitalidade é Luculus vem jantar com Luculus, em que Lejeune fala mais detalhadamente sobre a forma como o diário se constitui num terreno seguro para aquele que o mantém, o que, a meu ver, é justamente o que possibilita seu emprego para desenvolver identidades e discursos da margem:
O universo do papel é, como uma casa aonde somos convidados, um espaço protegido, onde as leis do mundo exterior estão suspensas: os atos não têm as sanções e consequências que teriam do lado de fora (...). Isso não quer dizer que tudo é permitido: o convidado respeita o anfitrião, observa as regras e usos da casa. Não se trata de um espaço sem lei. Mas o anfitrião que é seu próprio convidado pode decretar uma lei mais ou menos rigorosa. Há casas nas quais nos obrigam a usar pantufas. A auto-hospitalidade não significa necessariamente displicência. Trata-se, em geral, de uma mistura original de regras e liberdades (LEJEUNE, 2008, p. 310).
No diário, o diarista encontra um ambiente em que cessam todas as regras exteriores e, assim, ele não está mais em desvantagem perante leis ou padrões criados à sua revelia, não há mais assuntos e comportamentos proibidos ou questionáveis. Na verdade, como detentor de todo o poder em seu mundo de papel, ele é livre para criar novas regras que lhe sejam adequadas, que lhe permitam criar e se exprimir do modo exato que deseja, ainda que observe e mantenha, talvez até inconscientemente, algumas normas existentes. Segundo Lejeune, houve na história do diário dois momentos distintos em que o autor se voltou para o texto em busca de apoio:
Façamos agora um grande salto dentro da História do diário. Existiram dois grandes movimentos de interiorização. O mais antigo foi o da autovigilância. Instalar um juiz no interior de cada indivíduo. (...) Encontraremos esse lugar-comum educativo ao longo de toda a história do diário. (...) A outra interiorização, em voga hoje e inversa à anterior, é a do olhar amigo. Essa é tardia: quase não há vestígios dela antes da segunda metade do século 18. Não se trata mais de incorporar um confessor, mas um confidente. O amigo a quem se pode dizer tudo, que não julgará, compreenderá e se calará (LEJEUNE, 2008, p. 312).
Houve, então, um primeiro momento em que o diário guardava um sentido confessional, mas com o conceito de “confissão” herdado da tradição religiosa e, portanto, o intuito da escrita seria de, a partir do exercício de autoavaliação, descobrir seus erros, corrigir-se e adequar a si mesmo aos padrões do mundo, ou de um deus. Surgida mais tarde, a vertente contrária à anterior faz do diário um ombro amigo, um repositório de tudo aquilo que não se pode dizer a mais ninguém, mas com a segurança e a garantia de que esse amigo vai aceitar, entender e permanecer em silêncio. Se o diário é um gênero adequado para quando se está só, como se vê ao desempenhar a função de “desabafar” (Cf. LEJEUNE, 2008, p. 262), também cumpre seu papel quando, ainda que rodeado de pessoas, o diarista se vê sem interlocutores adequados, capazes de compreender integralmente e benevolentemente sua mensagem. Mesmo longe do olhar do outro, o diarista pode muito bem permanecer inseguro de si ou ter o pensamento turbulento e, mais uma vez, o diário permite a possibilidade de olhar para si. Assim, quando nem nós mesmos nos reconhecemos como um interlocutor possível “(...) o diário oferece o simples apoio de um compromisso; é um testemunho fiel, estável, diferentemente da mente do autor (…)”10 (PACHET, 2001, p. 105, tradução minha), como diz Pierre Pachet, em Les baromètres de l’âme [Os barômetros da alma]. Tudo isso somado, imagino que, quer seja para mulheres, quer seja para homossexuais, enfim, para aquele que lida com o silêncio e com a situação de estar relegado à margem da sociedade, o diário passa a representar uma resposta, um caminho possível para a elaboração de si. É desse modo que o diário supera os muitos séculos de detração que pesam sobre ele e torna-se uma opção concreta para o sujeito, especialmente para aqueles pertencentes às minorias.
Por fim, destaco uma fala do historiador brasileiro José Carlos Sebe Bom Meihy que, ao ser questionado numa entrevista sobre as razões de escolha do diário por Carolina Maria de Jesus, sendo que à época de publicação ela já produzira em inúmeros outros gêneros, nos diz algo que pode ser de grande interesse para o argumento que venho desenvolvendo:
Há ainda mais um aspecto a ser revelado em favor da aceitação dos diários. Afora grandes figuras do universo da política e da cultura, tipos sempre masculinos, a produção literária brasileira virava as costas às biografias e diários. No âmbito da contracultura, porém, tivemos alguns diários – puxados pelo de Carolina – que vieram à luz. Um deles foi O inferno é Deus, de Maura Lopes Cançado; outro, de Walmir Ayala (em dois volumes) sob os títulos Difícil é o reino (1962) e O visível amor (1963). Cabia nesse cenário a vida de loucos, pobres, homossexuais. Com isso, garante-se que também o fato de ser um “gênero novo” ajudou (MEIHY, 2014, p. 01).
Meihy lembra a rejeição brasileira às escritas de si, capaz de cessar apenas quando o autor fosse homem (obviamente heterossexual) e detentor de posição política ou cultural de relevo. Porém identifica, ao mesmo tempo, a presença de uma corrente de contracultura11no início dos anos de 1960 que, impulsionada pela publicação dos diários de Carolina, um acontecimento literário e editorial sem precedentes até então, proporcionou que outros textos viessem a público. O autor dá como exemplo o diário de Maura Lopes Cançado, cujo título cita erradamente, pois na verdade o volume se chama Hospício é Deus, e em que ela trata de suas experiências em diversas internações em instituições psiquiátricas. E também os dois volumes dos diários de Walmir Ayala (o autor possui ainda um terceiro volume que só viria a ser publicado em 1976) em que o autor toca, de um modo claro como nunca havia ocorrido na literatura brasileira até então, em suas vivências homossexuais. O que se pode concluir é que, de fato, houve a partir daquele momento um espaço para a expressão de grupos minoritários dentro do ambiente cultural predominantemente conservador e elitista brasileiro e, ainda, que foi através de diários que, talvez pela primeira vez, pobres, mulheres, doentes mentais e homossexuais tomaram a palavra para si e foram protagonistas de suas próprias representações e narrativas. A novidade do diário, ao menos no Brasil, também procede, uma vez que foi apenas por volta da segunda metade do século XX que as escritas de si começaram a tomar corpo no país. Nesse sentido, talvez a “ajuda” dessa “novidade” fique por conta do fato de que, numa apropriação feita a um gênero que não conta com uma longa tradição numa determinada literatura, as possibilidades de moldar esse gênero são mais amplas, não há grandes mestres do passado ou do presente a quem pagar tributo, não há formas e temas engessados a que seguir, enfim, há um decisivo componente de liberdade que permite inventar de acordo com seus desejos e necessidades.
Referências bibliográficas
GANNETT, Cinthia. Gender and the journal. Diaries and academic discourse. Albany: State University of New York Press, 1992.
KENDALL, Diana. Sociology in our times: The Essentials. 10. ed. Boston (USA): Cengage Learning, 2014.
LEJEUNE, Philippe. Journaux personnels, les femmes écrivent, les hommes publient. La Faute à Rousseau: publicação da Association pour l’autobiographie et le patrimoine autobiographique, Ambérieu-en-Bugey, n° 24, p. 45-46, jun. 2000.
––––––. O pacto autobiográfico – de Rousseau à internet. Tradução de Jovita Maria Gerheim Noronha e Maria Inês Coimbra Guedes. Belo Horizonte: UFMG, 2008.
MEIHY, José Carlos Sebe Bom. Entrevista com José Carlos Sebe Bom Meihy. Estado de Minas, Caderno Pensar, Belo Horizonte, p. 01-02, 17 maio 2014. Disponível em: <http://150.164.100.248/literafro/data1/autores/40/entrevistabommeihy1.pdf>. Acesso em: 25 out. 2016. Entrevista concedida aos pesquisadores do NEIA – Núcleo de Estudos Interdisciplinares da Alteridade (UFMG).
PACHET, Pierre. Les baromètres de l’âme, naissance du journal intime. Paris: Hachette, 2001.
ROSENFELDT, Deborah. The Politics of Bibliography. In: HARTMAN, Joan E.; MESSER-DAVIDOW, Ellen. Women in Print I: Opportunities for Women’s Studies Research in Language and Literature. New York: Modern Language Association, 1982.
STIÉNON, Valérie. Roland Barthes et son Journal: de l’inclination à la délibération. Études françaises. Montréal (Québec), vol. 45, n° 3, jan. 2009, p. 129-150. Disponível em: <http://id.erudit.org/iderudit/038862ar>. Acesso em: 24 out. 2016.
Resumo: A proposta deste texto é pensar o diário como um gênero que, embora historicamente praticado por todo tipo de pessoa, sempre possuiu uma identificação, uma aceitação e uma longa tradição de emprego por discursos da margem, o que se daria porque essa escrita oferece àquele que a mantém um terreno hospitaleiro ao registro e à discussão de temas que em outros gêneros literários seriam impraticáveis.
Palavras-chave: Diário; escritas da margem; auto-hospitalidade; gênero.
DIARY, A MARGINAL GENRE
Abstract: The purpose of this article is to think on the diary as a genre which, even if historically practiced by all sorts of people, had always an identification, an acceptance and a long tradition of usage by discourses of the margin, what happens because this genre is capable of offer to his author a hospitable field to the record and discussion of themes which in other literary genres it would be impossible.
Key-words: Diary; writings of the margin; self-hospitality; gender.
Recebido em: 31/1/2018
Aceito em: 11/2/2019
1 Doutor em Letras: Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora.↩
2 No original: “(...) depuis un siècle et demi déjà, croule sous les épithètes diffamatoires, traité tour à tour de malsain, d’hypocrite, de nul, d’artificiel, de stérile, de féminin, de puéril, d’ennuyeux, d’onaniste, de paresseux, de névrotique, de bavard, de narcissique, de raté, etc.”.↩
3 Em sociologia, o conceito de marginalidade está relacionado ao conceito de subcultura: “Uma subculturaé uma categoria de pessoas que partilham atributos, crenças, valores e/ou normas distintivos que os posicionam à parte de alguma maneira significante da cultura dominante. Este conceito tem sido aplicado a distinções abrangendo desde categorias étnicas, religiosas, regionais e etárias até aquelas categorias que se presumem serem “desviantes” ou marginalizadas em relação à sociedade como um todo” (KENDALL, 2014, p. 58, tradução minha).↩
4 No original: “Memoirs, diaries, personal essays, letters — forms in which women writers have excelled — were increasingly considered subliterary genres, except for those works that had been acknowledged as literature for so long that their status was secure. Hence Franklin’s Autobiography, but not that of Linda Brent, Elizabeth Cady Stanton, or Mary Hunter Austin; Emerson’s or Thoreau's essays, but not those of Margaret Fuller”.↩
5 No original: “(...) genre to which women have always felt especially drawn”.↩
6 No original: “sympathetic ear for women to confide opinions which have been considered too outrageous for the society they lived in”.↩
7 No original: “human qualities of wit, perception, and sensitivity”.↩
8 No original: “(...) were a kind of writing practice that allowed for the expression of a relationally organized sense of self and were flexible enough to allow for the discontinuity, gaps, and silences that were an inevitable part of female life”.↩
9 No original: “(...) even in the nonacademic, nonpublic discursive domains women have often been relegated to, many women have found ways to use the journal to connect personal and intellectual empowerment. In what is some times called the “wild zone” of the journal, women have been able to explore their world and the world with less interruption or judgment. They could discover themselves as subjects, learn how to work through language to inscribe themselves onto the world textually, and learn to listen to their own voices and experience”.↩
10 No original: “(...) le journal fournit le simple support d’un engagement; il est un témoin fidèle, stable, à la différence de l’esprit de l’auteur (…)”.↩
11 Em sociologia, “uma contracultura é um grupo que rejeita fortemente valores e normas dominantes da sociedade e busca estilos de vida alternativos” (KENDALL, 2014, p. 60, tradução minha).↩