Relações de cuidado em situação de vulnerabilidade social: uma experiência cínico-institucional

Autores

  • Beatriz Sernache de Castro Neves Faculdade Ari de Sá
  • Érika Teles Dauer Centro Universitário Estácio do Ceará
  • Karla Patrícia Holanda Martins Universidade Federal do Ceará

DOI:

https://doi.org/10.54948/desidades.v0i35.51038

Palavras-chave:

vulnerabilidade social, psicanálise, saúde materno-infantil, infância

Resumo

O trabalho é resultado da articulação de duas teses de doutorado que tiveram o Instituto da Primeira Infância (IPREDE) como campo de pesquisa. Historicamente, comprometida com o enfrentamento a desnutrição infantil, a instituição com o tempo passa a contemplar a noção de desenvolvimento infantil de uma forma mais geral incluindo a família nas suas intervenções bem como estratégias de quebra de ciclos intergeracionais de pobreza. Dessa forma, a instituição passa a trabalhar com a noção de que os cuidados parentais são fundamentais no desenvolvimento infantil e na constituição subjetiva desses sujeitos. No entanto, essa tarefa é complexificada nas situações em que as famílias estão constantemente envolvidas em questões cruciais para a garantia da própria sobrevivência, sendo necessário pensar nas trocas intersubjetivas incluindo questões como gênero, racialidade e vulnerabilidade psicossocial. Através de uma vinheta clínica pretendemos mostrar como com frequência, o conhecimento técnico e especializado delimita as razões explicativas dos fenômenos que envolvem a infância sob uma lógica de responsabilização individual que recai na figura materna. Quando se responsabiliza a mãe pela condição do filho, promove-se, por vezes, uma experiência de desautorização, podendo provocar a negação de suas vivências e na perda do sentimento de si. Nesse cenário, circunscreve-se a urgência de pensar práticas de cuidado que se distanciem da avaliação da capacidade materna de cuidar e a ampliem a idéia de um olhar de acolhimento, apontando para uma responsabilização coletiva que permitam a vivência de uma experiência compartilhada.

Referências

BRAZELTON, B.; CRAMER, B. The earliest relationship: parents, infants and the drama of early attachment. London: Karnac, 1991.

CIDADE, E.; MOURA JR., J.; XIMENES, V. Implicações psicológicas da pobreza na vida do povo latino-americano. Psicologia Argumento, Curitiba, v. 30, n. 68, p. 87-98, jan./mar. 2012.

DAUER, E. A desnutrição e o transitivismo: considerações psicanalíticas. 2015. Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2015.

DAUER, E. Uma compreensão psicanalítica da relação entre a mãe o bebê em situação de pobreza e vulnerabilidade social: um estudo a partir dos indicadores clínicos de risco para o desenvolvimento infantil. 2021. Tese (Doutorado em Psicologia) – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2021.

DAUER, E. T.; MARTINS, K. P. H. Desamparo materno e recusas alimentares na primeira infância. Cadernos de Psicanálise-CPRJ, Rio de Janeiro, v. 37, n. 32, p. 43-60, jan./jun. 2015.

FERENCZI, S. Elasticidade da técnica psicanalítica. In: ______. (Org.). Obras completas, vol. IV. São Paulo: Martins Fontes, 1992a (Original de 1928). p. 29-42.

FERENCZI, S. Criança mal acolhida e sua pulsão de morte. In: ______. Obras completas, vol. IV. São Paulo: Martins Fontes, 1992b (Original de 1929). p. 55-60.

FERENCZI, S. Confusão de língua entre o adulto e a criança. In: ______. (Org.). Obras completas, vol. IV. São Paulo: Martins Fontes, 1992c (Original de 1933). p. 111-121.

FERRAZ, I. Morbidade mental materna e desenvolvimento de síndromes psiquiátricas na primeira infância. 2018. Dissertação (Mestrado Profissional em Saúde da Mulher e da Criança) – Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2018.

FIGUEIREDO, L. As diversas faces do cuidar: novos ensaios de psicanálise contemporânea. São Paulo: Escuta, 2012.

GERHARDT, S. Por que o amor é importante: como o afeto molda o cérebro do bebê. Porto Alegre: Artmed, 2017.

GOMES, J. Percepção materna de vínculo, crenças e práticas em situação de vulnerabilidade social. 2018. Dissertação (Mestrado Profissional em Saúde da Mulher e da Criança) – Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2018.

HALPERN, R.; FIGUEIRAS, A. Influências ambientais na saúde mental da criança. Jornal de Pediatria, v. 80, n. 2, p. 104-110, 2004.

IACONELLI, V. Sobre as origens: muito além da mãe. In: TEPERMAN, D.; GARRAFA, T.; IACONELLI, V. (Org.). Parentalidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2020. p. 11- 22.

IPREDE. Instituto de Prevenção à Desnutrição e Excepcionalidade. Relatório institucional 2010. Fortaleza, 2010.

JERUSALINSKY. A. Psicanálise e desenvolvimento infantil. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 2000.

KUPERMANN, D. Trauma, sofrimento psíquico e cuidado na Psicologia Hospitalar. Rev. SBPH, Rio de Janeiro, v. 19, n. 1, pp. 6-20, jun. 2016. Disponível em:<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-08582016000100002&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 4 fev. 2021.

KUPERMANN, D. Por que Ferenczi? São Paulo: Zagodoni, 2019.

KUPERMANN, D.; MARTINS, K. Racismo, fome, testemunho e humor: diário de uma favelada de Carolina Maria de Jesus. In: Anais do VI Congresso Nacional de Direito, Psicanálise e Literatura. Belo Horizonte: Ami Comunicação & Design, 2017. p. 149-158.

KUPFER, M. C. M. et al. Valor preditivo de indicadores clínicos de risco para o desenvolvimento infantil: um estudo a partir da teoria psicanalítica. Lat. Am. Journal of Fund. Psychopath., v. 6, n. 1, p. 48-68, 2009.

KUPFER, M. C. M.; VOLTOLINI, R. Uso de indicadores clínicos em pesquisa de orientação psicanalítica: um debate conceitual. In: KUPFER, M. C.; LERNER, R. (Orgs.), Psicanálise com crianças: clínica e pesquisa. São Paulo: Escuta; 2008.

MARTINS, K. P. H. et al. Infância e privação: a fome, o silêncio e a vontade de viver. In: PINHEIRO, C. V. Q.; CARVALHO, J. Q.; DA SILVA, M. F. V. (Org.). Estudos psicanalíticos na clínica e no social. Fortaleza: Imprensa Universitária, 2011. p. 79-97.

_________. Angústia e vergonha na clínica psicanalítica em situações de pobreza e outras vulnerabilidades. Tempo psicanal., Rio de Janeiro, v. 50, n. 2, p. 265-289, dez. 2018.

MARTINS, K. P. K.; VILHENA, J. Para além da alimentação: um olhar psicanalítico sobre as políticas públicas de saúde na primeira infância. In: WINOGRAD, M.; VILHENA, J. (Org.). Psicanálise e clínica ampliada: multiversos. Curitiba: Appris, 2014. p. 37-56.

MENESCAL, J. Experiências adversas na infância de mães e a correlação com o vínculo materno de crianças assistidas numa instituição de primeira infância. 2018. Dissertação (Mestrado Profissional em Saúde da Mulher e da Criança) – Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Ceará, 2018.

MIRANDA, L.; ONOCKO CAMPOS, R. Contribuições da teoria winnicottiana para um posicionamento clínico nos serviços públicos de saúde. In: WINOGRAD, M.; VILHENA, J. (Org.). Psicanálise e clínica ampliada: multiversos. Curitiba: Appris, 2014. p. 57-86.

MOURA JR., J. F. et al. Concepções de pobreza: um convite a discussão psicossocial. Temas em Psicologia, Ribeirão Preto, v. 22, n. 2, p. 341-352, 2014.

NEVES, B. S.C. Prevenção e Psicanálise: contribuição ao debate a partir da clínica institucional com crianças desnutridas. 2015. Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Universidade de Fortaleza, Fortaleza, 2015.

NEVES, B. S.C. Uma compreensão psicanalítica da relação entre a mãe o bebê em situação de pobreza e vulnerabilidade social: um estudo a partir dos indicadores clínicos de risco para o desenvolvimento infantil. 2021. Tese (Doutorado em Saúde Pública) – Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2021.

ROLIM, L. A percepção vincular materna e o risco de alteração no desenvolvimento socioemocional/comportamento das crianças. 2018. Dissertação (Mestrado Profissional em Saúde da Mulher e da Criança) – Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2018.

ROSA, M. Uma escuta psicanalítica das vidas secas. Revista de Psicanálise Textura, São Paulo, n. 2, p. 1-13, 2002.

ROSA, M. A clínica psicanalítica em face da dimensão sociopolítica do sofrimento. São Paulo: Escuta/Fapesp, 2016.

ROSA, M.; ESTEVÃO, I.; BRAGA, A. Clínica psicanalítica implicada: conexões com a cultura, a sociedade e a política. Psicologia em estudo, v. 22, n. 3, 2017.

TEIXEIRA, I. Trauma, angústia e desautorização nos dispositivos de saúde materno-infantil: contribuições clínico-políticas da psicanálise. 2019. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-graduação em Psicologia, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2019.

WINNICOTT, D. O papel de espelho da mãe e da família no desenvolvimento infantil. In: ______. O brincar e a realidade. São Paulo: Ubu Editora, 2019 (Original de 1967). p. 177-188.

Downloads

Publicado

11-07-2023

Edição

Seção

TEMAS EM DESTAQUE