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Reoriente • vol.1, n.1 jan/jun 2021
O início do século XXI foi marcado também por um retorno de movimentos tra-
balhistas, mas em novos locais industriais e geográficos. Houve grandes ondas de gre-
ves acarretadas por novas classes de trabalhadores – particularmente no Leste e no
Sul da Ásia – que tinham sido “formadas” no processo de reestruturação neoliberal da
economia mundial (KARATASLI et al., 2015, p. 191). A China, especialmente, emer-
giu como um novo epicentro dos movimentos trabalhistas mundiais. Como observa
Friedman (2012): “Embora não haja estatísticas oficiais, é certo que milhares, se não
dezenas de milhares, de greves acontecem a cada ano... com muitos grevistas obtendo
significativos aumentos salariais acima e além de quaisquer exigências legais” (veja
também SILVER; ZHANG, 2009).
Mesmo no Norte global, temos visto um aumento da militância trabalhista entre os
setores da classe trabalhadora que cresceram em tamanho e centralidade no decorrer
das últimas décadas, mais notadamente os trabalhadores imigrantes e os de mino-
rias étnicas. A maioria desses trabalhadores está “concentrada em trabalhos precários
e de baixos salários em indústrias como serviço doméstico, agricultura, manufatura
de alimentos e vestuário, hotelaria e restaurantes, e construção civil”. No processo, a
luta pelos direitos de imigrantes está entrelaçada com a luta pelos direitos trabalhistas
(MILKMAN, 2011); por exemplo, com os sindicatos americanos sendo levados a lutar
em nome de seus membros contra as batidas de deportação na era Trump (ELK, 2018).
A ascensão de novas classes trabalhadoras no Norte global e no Sul global foi
acompanhada pelo “desmonte” das classes trabalhadoras industriais sindicalizadas,
bem remuneradas e esmagadoramente brancas, que foram sócias juniores na ordem
hegemônica mundial do século XX. Abandonadas pelo capital por locais mais baratos
ou, no caso dos trabalhadores do setor público, vendo seu bem-estar corroído pelo
esvaziamento das funções governamentais, esses trabalhadores têm travado lutas de-
fensivas. Os protestos pós-2008 contra a austeridade na Europa são particularmente
dignos de atenção, mas longe de serem os únicos exemplos de tais lutas defensivas
(KARATASLI et al., 2015, p. 190-191). Ao mesmo tempo, temos visto um aumento dos
protestos dos desempregados e dos empregados irregulares (ou, para usar o termo de
Marx, a “população excedente relativa permanente”). Essa parte da classe trabalhadora
desempenhou um papel proeminente (e frequentemente minimizado) no Egito, na
Tunísia, no Bahrein e no Iêmen durante a primavera árabe de 2011 (veja KARATASLI
et al., 2015, p. 192-3) e mais além.
Uma nova visão radical para o século XXI é necessária para enfrentar esses desa-
fios vindos das camadas inferiores. A promessa hegemônica americana de consumo
em massa e desenvolvimento nunca foi viável dentro do contexto do capitalismo histó-
rico. A afirmação de Wallerstein (1995) de que o capitalismo não poderia acomodar as
“demandas combinadas do Terceiro Mundo (por relativamente pouco por pessoa, mas
para muitas pessoas) e [da] classe trabalhadora ocidental (para relativamente poucas
pessoas, mas muito por pessoa)”, permanece verdadeira hoje. O desafio para o século
XXI é incorporar, com credibilidade, a crescente e profunda variedade de classes e
movimentos de trabalhadores que exigem maior igualdade, tanto entre como dentro
dos países. É desnecessário dizer que esses fatores impedem um simples retorno ao
modelo hegemônico mundial dos Estados Unidos do século XX.