Reoriente • vol.2, n.1 jan/jun 2022 • DOI: 10.54833/issn2764-104X.v2i1p81-96 89
índios jamais estabeleceram uma paz estável com o invasor, exigindo dele um esforço conti-
nuado, ao longo de décadas, para dominar cada região. (Ribeiro. 1995, p. 30)
A análise do antropólogo acentua dois fatores importantes: a ausência de uma
organização política estruturada e o papel da religião aliado ao expansionismo mer-
cantilista europeu, como traços característicos da formação do povo brasileiro.
A matriz lusitana
A estrutura administrativa mandatária do poderio português sobre o Brasil com-
preendia um conglomerado de instituições, segundo Darcy “interativas”, “equivalen-
tes” e “competitivas” entre si. (Cf. Ribeiro 1995, p.33)
Destacava-se o Conselho Ultramarino, em Lisboa, com as funções de planejar,
ordenar, aparelhar, incrementar os mecanismos do empreendimento mercantil com
novas tecnologias: a “nau oceânica, com suas novas velas de mar alto, leme xo, bús-
sola, astrolábio, e os canhões de guerra.” (Ribeiro, 1995, p. 35). Essa produção de no-
vas tecnologias, proveniente de uma junção dos saberes de experiências acumuladas
e da ciência, cumpria o objetivo para conquistar o mundo, sob a regência da Europa,
e das normas básicas estabelecidas pelo Vaticano, “era a humanidade mesma que en-
trava noutra instância de sua existência”, sublinha Darcy. E acrescenta que, para isso,
“se extinguiriam milhares de povos, com suas línguas e culturas próprias singulares,
para dar nascimento às macroetnias maiores e mais abrangentes”. E completa: “O
motor dessa expansão era o processo civilizatório que deu surgimento a dois Estados
nacionais: Portugal e Espanha.” (Op. cit, p. 35).
O Vaticano se constituiu como a entidade que se apropria do privilégio exclusivo
do uso legítimo da força moral e física sobre as populações das colônias portuguesas
e espanholas. Se a força não produz nenhum direito sobre os homens, as bulas papais
o fazem para controlar o Novo Mundo. Os estudos de Darcy citam duas bulas: a Ro-
manos Pontifex, 08-02-1454, e a Inter Coetera, de 04-05-1493.
A Romanos Pontix “concede ao rei Afonso a plena e livre faculdade, entre outras,
de invadir, conquistar, subjugar, a quaisquer sarracenos pagãos, inimigos de Cristo,
suas terras e bens, a todos reduzir a servidão e tudo praticar em utilidade própria e
dos seus descentes.” (Ribeiro, 1995, p. 36). Já as cláusulas em direito perpetuum - as-
seguradas pela “autoridade do Deus onipotente a nós concedida em S. Pedro, assim
como do vicariato de Jesus Cristo, a qual exercemos na terra, para sempre” - doavam,
concediam e entregavam aos herdeiros e sucessores dos monarcas “em todos os seus
domínios cidades, fortalezas, lugares, vilas, direitos, jurisdições, e todas as pertenças”.
Outorgam “a vós e aos sobreditos herdeiros e sucessores”, direito com pleno, livre e