Podem os personagens secundários falar? Posição feminina no documentário autobiográfico face à memória da ditadura militar no Brasil

Autores

  • Ilana Feldman Universidade de São Paulo, São Paulo -- SP

DOI:

https://doi.org/10.1590/1517-106x/2018202228243

Resumo

Diante do campo da autobiografia e de seu cruzamento com o cinema, no contexto da experiência legada pela ditadura civil-militar brasileira, este artigo pretende investigar certos modos políticos de enunciação e subjetivação, aqui postos em cena pelos documentários autobiográficos “Os dias com ele” (Brasil, 2012), de Maria Clara Escobar, e “Diário de uma busca”, de Flávia Castro (Brasil, 2011). Nessas obras, realizadas por filhas de exilados e presos políticos, estão em jogo duas formas distintas de posição feminina e de busca pela figura paterna, nas quais coexistem exílio, memória, testemunho e até mesmo a disputa pelo filme que está sendo feito. Face ao problema do lugar secundário das filhas diante das utopias políticas dos pais, no contexto da experiência do fracasso das esquerdas no Brasil, “Os dias com ele” e “Diário de uma busca” propõem uma passagem do privado ao político, do pai ao país, a partir de uma ética da precariedade.

Biografia do Autor

Ilana Feldman, Universidade de São Paulo, São Paulo -- SP

Ilana Feldman é pós-doutora em Teoria Literária pelo Instituto de Estudos da Linguagem da UNICAMP e doutora em Cinema pela Escola de Comunicações      e Artes da USP,  com passagem pelo Departamento de Filosofia, Artes e Estética  da Universidade Paris 8, tendo desenvolvido a tese “Jogos de cena: ensaios sobre o documentário brasileiro contemporâneo”. Atualmente, realiza pós-doutorado no Programa d e Pós-graduação em Meios e Processos Audiovisuais da ECA-USP, com pesquisa sobre cinema, autobiografia, testemunho e luto.

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Publicado

2018-07-06

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Artigos