Fenomenismo, realismo e as "coisas fora de nós": Kant contra o idealista material
Palavras-chave:
Kant, refutação, idealismo, mundo externo, sentido interno, sentido externo, refutation, idealism, external world, nner sense, outer senseResumo
Neste artigo, dedico-me a uma análise da refutação do idealismo contida no Quarto Paralogismo da primeira edição da Crítica da Razão Pura, comentando cada uma das linhas argumentativas pelas quais Kant procura eliminar a dúvida cética sobre a existência das "coisas fora de nós". Nesse contexto, procuro mostrar, em primeiro lugar, como Kant distingue resolutamente o ceticismo epistemológico de sua versão ontológica, elege o primeiro como único adversário idealista do projeto refutativo e se dá o direito de desqualificar a desconfiança proposta pelo último, que, paradoxalmente, expressa a posição do idealista chamado cartesiano, autor do silogismo da idealidade. Em seguida, defendo que, desqualificando o problema ontológico propriamente dito, a Refutação de 81 acaba se tornando, na melhor das hipóteses, uma explicação de por que um idealista kantiano não pode ser cético em matéria de fenômenos externos, em vez de uma prova de que um idealista cartesiano não pode ser cético em matéria de mundo externo. Finalmente, proponho um argumento interno ao sistema kantiano para tentar justificar a necessidade de uma refutação do idealismo menos "fenomenista" do que parece ter sido a de 1781, mostrando que o idealismo transcendental perde sua consistência se aceitar a possibilidade de que a existência das coisas fora de nós em sentido forte, vale dizer, em sentido extra-representacional, permaneça um mero pressuposto conceitual ou intelectual, em vez de um fato real.
Abstract
In this paper I shall survey the refutation of idealism set out in the Fourth Paralogism of the first edition of the Critique of Pure Reason commenting upon each line of argumentation through which Kant attempts to rule out the skeptical doubt regarding the existence of the "things outside us". In this context, I shall firstly argue that Kant clearly distinguishes in this section between epistemological and ontological skepticism, elects the former as his unique opponent in the refuting project and disenfranchises the challenge raised by the latter, which paradoxically characterizes the position of the genuine author of the syllogism of ideality - the Cartesian skeptic. Secondly, I shall defend that by so doing, the refutation of 81 turns out to be, at best, an explanation of why a Kantian idealist cannot be a skeptic regarding external appearances, rather than a demonstration of why a Cartesian idealist cannot be a skeptic regarding external world. Lastly, I shall propose a systematic argument in order to justify the necessity of a less phenomenistic refutation than what turned out to be that of 81, defending that transcendental idealism loses its consistency if it accepts the possibility that the existence of the "things outside us" stricto sensu (i.e., in an ontological sense) remains a mere conceptual or intellectual presupposition, even though a necessary one, instead of a real fact.
Recebido em 07/014
Aprovado em 08/014
Referências
ALLISON, H. E. (1983). Kant's Transcendental Idealism: an interpretation and defense. New Haven and London: Yale University Press.
ALLISON, H. E. (2004). Kant's Transcendental Idealism: an interpretation and defense. (revised & enlarged edition). New Haven and London: Yale University Press.
ALMEIDA, G. (1999). CriÌtica, Dedução e Facto da Razão. Analytica, 4(1), 57-84.
Guyer, P. (1987). Kant and the Claims of Knowledge. Cambridge, Cambridge University Press. doi:10.1017/cbo9780511624766
GUYER, P. (1989). Psychology and the transcendental deduction. In: Eckart Förster (Ed.). Kant's Transcendental Deductions: The three ‘Critiques' and the ‘Opus postumum'. Stanford: Stanford University Press, 47-68.
KANT, I. (1900). Gesammelte Schriften. Hrsg.: Bd. 1-: Preussische Akademie der Wissenschaften, Bd : Deutsche Akademie der Wissenschaften zu Berlin, ab Bd. 4: Akademie der Wissenschaften zu Göttingen. Berlin.
KANT, I. (1990). Kritik der Reinen Venunft. Hamburg: Felix Meiner.
KANT, I. (2008). Crítica da Razão Pura. trad. de Santos e Morujão. Lisboa: Calouste Gulbenkian.
PRAUSS, G. (1971). Erscheinung bei Kant. Berlin: de Gruyter. doi:10.1515/9783110838824
REGO, P. C. (2011). Apercepção subjetiva e conhecimento objetivo: uma leitura sobre o lugar do §18 na estrateÌgia da Dedução B da CriÌtica da Razão Pura. Manuscrito, 34 523-554.
Downloads
Publicado
Edição
Seção
Licença
Os autores que publicam nesta revista concordam com os seguintes termos:
- Os autores mantêm os direitos autorais e concedem à revista o direito de primeira publicação, com o trabalho simultaneamente licenciado sob a Licença Creative Commons Atribuição-SemDerivações 4.0 Internacional (CC BY-ND 4.0), que permite a redistribuição, comercial ou não comercial, desde que a obra original não seja modificada e que seja atribuído o crédito ao autor.
- Os autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente para distribuição não-exclusiva da versão do trabalho publicada nesta revista (ex.: publicar em repositório institucional ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial nesta revista.
- Os autores têm permissão e são estimulados a publicar e distribuir seu trabalho online (ex.: em repositórios institucionais ou na sua página pessoal) a qualquer ponto antes ou durante o processo editorial, já que isso pode gerar alterações produtivas, bem como aumentar o impacto e a citação do trabalho publicado (Veja O Efeito do Acesso Livre).