O direito abstrato de Hegel: um estudo introdutório (segunda parte)
Resumo
Com a gênese conceitual do contrato na alienação da propriedade Hegel mostra o surgimento da pluralidade das vontades proprietárias e o caráter meramente formal do seu reconhecimento recíproco, e estabelece uma vinculação essencial do contrato ao âmbito da propriedade, que lhe permite subverter a distinção jurídica clássica entre direitos pessoais e direitos reais (7). A contingência contida na possibilidade real de não execução do estipulado implica, na lógica interna do contrato, a passagem conceitual necessária do contrato ao delito ("in-justo"), cujas modalidades se desdobram segundo o agravamento da oposição entre a vontade particular subjetiva e a universalidade objetiva do direito, e culminam no crime, como forma extrema e exemplar da negação do direito (8). A propósito do crime, Hegel critica as teorias penais fundadas em critérios sociais a partir de uma concepção retributiva da pena, que, enquanto "retaliação" (Wiedervergeltung), é concebida como uma segunda negação, que nega a primeira negação do direito, contida no crime, que restabelece, assim, o direito, e justifica a pena como um direito do próprio criminoso (9). Essa retaliação, embora "justa quanto ao seu conteúdo", por ser, quanto à forma, uma "lesão da lesão", pode tornar-se justiça vingativa, a perpetuar-se indefinidamente, uma contradição que só é resolvida pela justiça punitiva, que remete, antecipadamente, à figura ética do juiz judiciário, e que exige, conceitualmente, o surgimento de uma vontade que, na sua particularidade, queira o universal enquanto tal, a qual descreve o sujeito moral como uma nova determinação e figuração da vontade livre, que suspende o "direito abstrato" (10).
Abstract
Through the conceptual genesis of the contract in the alienation of property Hegel shows the appearance of the plurality of the proprietors' wills and the merely formal character of their reciprocal recognition, and establishes an essential link between the contract and the realm of property, which allows him to subvert the classic juridical distinction between personal rights and real rights (7). The contingency contained in the real possibility of non-execution of what was stipulated implicates, according to the logic internal to the contract, the necessary conceptual passage from contract to delict ("un-just"), whose modalities are unfolded according to the aggravation of the opposition between the subjective private will and the objective universality of the right, culminating in crime as an extreme and exemplary form of the denial of right (8). Concerning crime, Hegel criticizes the penal theories founded in social criteria starting from a retributive conception of the punishment that, as "retaliation" (Wiedervergeltung), is conceived as a second negation that denies the first negation of the right contained in the crime, which thereby reestablishes the right, and justifies the punishment as a right of the criminal himself (9). That retaliation, although "just as to its content", since it formally is a "lesion of the lesion", can become revengeful justice, indefinitely perpetuating a contradiction that is only solved by punitive justice, which refers in advance to the ethical role of the judiciary judge, and conceptually demands the appearance of a will that, in its particularity, wills the universal as such, and describes the moral subject as a new determination and shape of the free will, that superseds the "abstract right" (10).
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