A economia do crime 40 anos depois do Nascimento da Biopolítica
DOI:
https://doi.org/10.36482/1809-5267.ARBP-2022v75spe.0006Resumo
No final dos anos 1970, Michel Foucault analisou como a economia se lançava à explicação de relações sociais que não são estrita ou propriamente econômicas, dentre as quais, o crime e a criminalidade. Para fazer esta operação, dizia Foucault, os economistas neoliberais recorreram, por um lado, ao esvaziamento dos conteúdos sócio-antropológicos do crime e, por outro, a intervenções ambientais que têm por finalidade criar uma demanda negativa para uma oferta de crime que existe como um dado da realidade. Mais de 40 anos depois, presenciamos a consolidação de uma área do saber e de uma disciplina acadêmica chamada “economia do crime”, cujas análises avalizam políticas de segurança pública baseadas no incremento das guardas municipais e na aplicação de toques de recolher, entre outras. A incursão neoliberal nas análises sobre crime e criminalidade investiu contra os acúmulos científicos e políticos, na academia e nos movimentos sociais, que propugnam por medidas como desencarceramento e fim das polícias, mas também se mostrou hábil em operar com termos descriminalizantes para afirmar uma etiologia racista do crime, como é o caso da defesa da legalização do aborto como forma de combater a criminalidade. É a partir dessa lógica estratégica que opera termos díspares e contraditórios para que reajam uns sobre os outros produzindo governo, que a economia do crime se qualifica para uma gestão ambiental que ultrapassa os próprios processos de criminalização. Este artigo faz uma leitura do bestseller neoliberal "Freakonomics", numa tentativa de explicitar como a genealogia da economia do crime, iniciada por Foucault há 40 anos, permanece atual.
Palavras-chave: neoliberalismo; economia do crime; racismo; aborto.
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