As potências da ficção: uma clínico-política social dos afetos a tramar cestos
Abstract
Partindo da problematização efetuada por Ursula K. Le Guin acerca das nossas políticas do narrar moderno-coloniais, marcadas por uma estilística do heroísmo a contagiar nossos campos micropolíticos, os quais modulam nossos modos de afetarmos e sermos afetados, o presente artigo pretende efetuar uma problematização acerca das políticas do narrar presentes nos fazeres e pensares do campo da psicologia. Partindo de uma ética ficcional, tomamos as práticas da psicologia enquanto imanentes às das artes e letras como campos voltados à modulação estética de experiências, assim, a provocação de pensar a ficção enquanto cesto nos leva a tensionar alguns regimes de sensibilidade-pensabilidade instituídos nas perspectivas clínico-políticas que reiteram a narrativa do herói e colonizam nossos modos de existência a partir de perspectivas meritocratas e culpocratas. Como cultivar outras políticas do narrar baseadas em uma ética do cuidado e responsabilidades coletivas e não nas práticas individualizantes que dão a sentir e pensar os acontecimentos do mundo enquanto conquistas ou derrotas, desenvolvimentos ou regressões de pessoas recortadas e isoladas da trama que lhes constitui? Essa é a questão que nos move na presente investigação: inventar outras modulações micropolíticas dos afetos e produzir outros territórios comuns, questionando nossas políticas narrativas presentes nas práticas da psicologia e das políticas públicas para fomentar outras estilísticas de cerzir cestos para além do heroísmo bélico.
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