As estratégias discursivas de Foucault como explicação para a sistematização da incompatibilidade na leitura da autoficção
Résumé
Michel Foucault tratou das “escritas de si” em um estudo diacrônico. O eu pode se manifestar através de inúmeras modalidades de escrita ou gêneros textuais, como a autobiografia e o diário. Beatriz Sarlo, ao criar a expressão “guinada subjetiva”, referia-se a uma tendência atual de olhar para si através do passado, que faz da memória uma ancoragem na realidade. Atualmente, os teóricos da autobiografia, continuadores de Philippe Lejeune, também atentam para a autoficção como uma modalidade literária exemplar desse olhar interior ou dessa guinada subjetiva. Em A arqueologia do saber, Foucault trata do que chama de “estratégias discursivas” e, entre elas, dos “pontos de incompatibilidade” e dos “pontos de convergência”, elementos que explicam a razão de dois tipos de enunciação, ou dois conceitos, conviverem em uma formação discursiva. Aquilo que chama de “ou bem isso... ou bem aquilo” pode ser enxergado como um modo discursivo de se explicar a natureza dupla e ambígua da autoficção: ser autobiografia e ficção ao mesmo tempo, em uma configuração que corresponde a uma modalidade literária marcada por uma alternância que a personaliza. A guinada subjetiva, manifestada na autoficção, pode encontrar nas estratégias discursivas de Foucault um modo de explicitação: chega-se aos tais “pontos de ligação de uma sistematização”, onde elementos incompatíveis ficam sendo equivalentes. Objetiva-se, portanto, aqui, um modo de aplicar tais conceitos ao que se tem definido como pacto de leitura ambíguo da autoficção. A transformação da incompatibilidade em convergência permanece como estratégia discursiva, que remete ora à memória, ora à invenção.
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