A Imagem de Austerlitz
Abstract
Acostumamo-nos, sujeitos do século XX e XXI, a conviver com as imagens da dor. Fotografias dos mutilados de diversas guerras, registros sonoros do horror em diferentes línguas, documentários dos sobreviventes da miséria lançam luz sobre o sofrimento humano. Estamos cada vez mais “diante da dor dos outros”, poderíamos afirmar com Susan Sontag.2 Com a autora, poderíamos também questionar em que medida o registro luminoso da barbárie participa do processo de embotamento de nossas capacidades perceptivas e da corrosão de nossos laços comunitários. A dor dos outros torna-se invisível. Austerlitz, de Sebald, registra o sofrimento humano infligido de forma vária pelo avanço técnico moderno. As dores coletivas e individuais perpassam o relato descontínuo, fraturado pela invisibilidade, pela incognoscibilidade da difusão da violência. Os animais estão sob as trevas do Nocturama, os objetos obscurecidos por um utilitarismo esterilizante, os homens sob a escuridão do avançar do imperialismo, do capitalismo, da tecnologia mortífera. Há pouca luz em Austerlitz. No entanto, o relato é pontuado por fotografias. Trata-se de um livro ilustrado, poderíamos pensar, levando adiante a proximidade do registro fotográfico com a luminosidade que lhe é indissociável. Trata-se de um livro da Ilustração, poderíamos supor de modo ainda mais grave, suspeitando encontrar na associação entre palavra e imagens os princípios de uma narrativa que pretende dar a ver uma história monumental, iluminadora, um relato pleno do sofrimento humano. Estaríamos enganados.Literaturhinweise
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