A Imagem de Austerlitz

Autor/innen

  • Mariana Quadros Pinheiro UFRJ

Abstract

Acostumamo-nos, sujeitos do século XX e XXI, a conviver com as imagens da dor. Fotografias dos mutilados de diversas guerras, registros sonoros do horror em diferentes línguas, documentários dos sobreviventes da miséria lançam luz sobre o sofrimento humano. Estamos cada vez mais “diante da dor dos outros”, poderíamos afirmar com Susan Sontag.2 Com a autora, poderíamos também questionar em que medida o registro luminoso da barbárie participa do processo de embotamento de nossas capacidades perceptivas e da corrosão de nossos laços comunitários. A dor dos outros torna-se invisível. Austerlitz, de Sebald, registra o sofrimento humano infligido de forma vária pelo avanço técnico moderno. As dores coletivas e individuais perpassam o relato descontínuo, fraturado pela invisibilidade, pela incognoscibilidade da difusão da violência. Os animais estão sob as trevas do Nocturama, os objetos obscurecidos por um utilitarismo esterilizante, os homens sob a escuridão do avançar do imperialismo, do capitalismo, da tecnologia mortífera. Há pouca luz em Austerlitz. No entanto, o relato é pontuado por fotografias. Trata-se de um livro ilustrado, poderíamos pensar, levando adiante a proximidade do registro fotográfico com a luminosidade que lhe é indissociável. Trata-se de um livro da Ilustração, poderíamos supor de modo ainda mais grave, suspeitando encontrar na associação entre palavra e imagens os princípios de uma narrativa que pretende dar a ver uma história monumental, iluminadora, um relato pleno do sofrimento humano. Estaríamos enganados.

Literaturhinweise

ADORNO, Theodor W.; HORHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos. Tradução de Guido Antonio de Almeida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985.

AGAMBEN, Giorgio. Estâncias: a palavra e o fantasma na cultura ocidental. Tradução de Selvino José Assmann. Belo Horizonte: UFMG, 2007.

ARGAN, Giulio Carlo. História da arte como história da cidade. Tradução de Píer Luigi Cabra. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

BARTHES, Roland. O efeito de real. In: ______. O rumor da língua. Tradução de Mario Laranjeira. São Paulo: Martins Fontes, 2004, p. 181-190.

______. A câmara clara: nota sobre a fotografia. Tradução de Júlio Castañon Guimarães. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.

BENJAMIN, Walter. A imagem de Proust. In: ______. Magia e técnica, arte e política. Tradução de Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense: 1994a, p. 36-49.

______. Pequena história da fotografia. In: ______. Magia e técnica, arte e política:ensaios sobre literatura e história da cultura. Trad.: Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 1994b, p. 91-107.

BERMAN, Marshall. Tudo que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. Tradução de Carlos Felipe Moisés e Ana Maria L. Ioratti. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.

CADAVA, Eduardo. Words of light: theses on the photography of history. Princeton: Princeton University Press, 1997.

ELIAS, Norbert. Sobre o tempo. Tradução de Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.

FREUD, Sigmund. Luto e melancolia. In: ______. Ensaios de metapsicologia e outros textos. Tradução de Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. (Obras completas, v. 12)

GAGNEBIN, Jeanne Marie. História e narração em Walter Benjamin. São Paulo:Perspectiva: 2009. (Coleção Estudos; 142)

HILLMAN, James. Cidade & alma. Tradução de Gustavo Barcellos e Lúcia Rosenberg. São Paulo: Studio Nobel, 1993. (Coleção Cidade aberta)

HOBSBAWN, Eric J. A era das revoluções: 1789-1848. Tradução de Maria Tereza Lopes e Marcos Penchel. 24ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.

JEUDY, Henri-Pierre. A crítica da estética urbana. In: ______. O espelho das cidades. Tradução de Rejane Janowitzer. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2005. p. 79-154.

SEBALD, W. G. Austerlitz. Tradução de José Marcos Macedo. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

Veröffentlicht

2010-12-15