A ORIGEM DA PRISÃO PREVENTIVA COM FUNDAMENTO NA “GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA” E A SUA (IN)CONVENCIONALIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS

Autores

Palavras-chave:

Garantia da ordem pública, Convenção Americana sobre Direitos Humanos, Convencionalidade.

Resumo

A vagueza do conceito “garantia da ordem pública” permite que prisões cautelares com fins extraprocessuais sejam banalizadas pelo Sistema de Justiça Criminal no Brasil. Isto posto, a presente pesquisa se propõe a investigar a (in)convencionalidade da prisão preventiva com fundamento na “garantia da ordem pública” à luz da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH), principal documento do Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos (SIPDH). Somente a partir disso, orientado pelo método de abordagem indutivo, o trabalho averiguará as origens político-ideológicas do Código de Processo Penal brasileiro (CPPb), afim de verificar como se deu a infiltração do pensamento autoritário no país. Outrossim, com auxílio dos métodos de procedimento explicativo, histórico e comparativo, discutir-se-ão os seguintes tópicos: o transporte do pensamento autoritário do Codice Rocco para o processo penal brasileiro; a inserção da locução “garantia da ordem pública” – vaga e carente de sentido – como ferramenta para ampliação do poder punitivo, no furor da reprodução do autoritarismo italiano no CPPb; a natureza da prisão preventiva para o SIPDH traduzida em três importantes decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) (caso Palamara Iribarne vs. Chile; caso López Álvarez vs. Honduras; e caso Barreto Leiva vs. Venezuela). Como resultado, alcançar-se-á que a prisão preventiva, quando decretada para garantir a ordem pública, é inconvencional, posto que nesse caso não possui natureza cautelar/processual.

Biografia do Autor

Caio José Arruda Amarante de Oliveira, Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

Mestrando em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Pós-Graduando em Direito Penal e Criminologia (CEI/INTROCRIM). Membro dos Grupos de Pesquisa Direito Internacional dos Direitos Humanos e as Pessoas em Situação de Vulnerabilidade (CNPq/UFRN) e Garantismo em Movimento (DGP/CNPq). Bacharel em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4852-3014. CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/8807286273963636. E-mail: caioarruda31@gmail.com.

Ricardo dos Santos Bezerra, Universidade Estadual da Paraíba

Pós-Doutor pela Universidade de Salamanca. Doutor em Direitos Humanos pela Universidade de Salamanca. Mestre em Direito e Cooperação Internacional pela Vrije Universiteit Belgium. Bacharel em Direito pela Universidade Regional do Nordeste – URNe. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8568-6181. CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/0509068469212699. E-mail: ricsantosbz@gmail.com.

Thiago Oliveira Moreira, Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Professor Adjunto IV da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Graduação e Mestrado). Doutor e Mestre em Direito pela Universidade do País Basco (UPV/EHU). Mestre em Direito pela UFRN. Doutorando em Direito pela Universidade de Coimbra. Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFRN. Vice-Chefe do Departamento de Direito Privado da UFRN. Membro do Conselho Nacional da Academia Brasileira de Direito Internacional (ABDI). Professor/Pesquisador Visitante da Universidade Lusófona do Porto (2022). Líder do Grupo de Pesquisa Direito Internacional dos Direitos Humanos e as Pessoas em Situação de Vulnerabilidade (CNPq/UFRN). Integrante do Grupo de Pesquisa Observatório de Direito Internacional do Rio Grande do Norte (OBDI/UFRN). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6010-976X. CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/8030681636075210. E-mail: thiago.moreira@ufrn.br.

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2024-03-09

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ARTIGOS