TRABALHO PRETO, INSTITUIÇÕES BRANCAS: A PESSOALIDADE RACIALIZADA NA RELAÇÃO DE EMPREGO NO BRASIL

Autores

DOI:

https://doi.org/10.21875/tjc.v6i0.41631

Palavras-chave:

Direito do Trabalho brasileiro. Relação de emprego. Pessoalidade. Afropessimismo. Decolonialidade.

Resumo

RESUMO: Este artigo jurídico-descritivo visa demonstrar que os trabalhadores pretos não possuem o atributo da humanidade em uma perspectiva ontológica da relação de emprego, não se enquadrando, portanto, no elemento fático-jurídico da pessoalidade. Juridicamente, o sujeito negro não é mais escravizado, mas a relação formativa colonial de violência ontológica que construiu a anti-humanidade preta permaneceu, sustentada por instuições brancas que são fruto da modernidade eurocêntrica, inclusive a relação de emprego. Nesse sentido, pretende-se investigar a não humanidade de pessoas pretas sob o marco teórico do afropessimismo e dos estudos decoloniais, discutindo-se conceitos centrais como trabalho ontológico e a ficção do progresso racial. Em seguida, examina-se a relação entre a anti-humanidade das pessoas pretas e o elemento fático-jurídico da pessoalidade na relação de emprego. Por fim, breves trajetórias dissidentes na epistemologia do direito do trabalho são consideradas sob o método jurídico-especulativo.

Biografia do Autor

Marco Túlio Corraide, Universidade Federal de Ouro Preto

Mestrando em Direito pelo programa de pós-graduação Novos Direitos, Novos Sujeitos da Universidade Federal de Ouro Preto. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Ouro Preto. Membro do grupo RESSABER - Grupo de estudos em saberes decoloniais. Advogado.

Flávia Souza Máximo Pereira, Universidade Federal de Ouro Preto

Doutora em Direito do Trabalho em Co-tutela entre a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Università degli Studi di Roma Tor Vergata. Professora Adjunta de Direito Pro-cessual do Trabalho e Direito Previdenciário na Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Membra permanente do Programa de Pós-graduação em Direito da UFOP. Coordenadora do Grupo de Pesquisa Ressaber – Estudos em Saberes Decoloniais da UFOP. Coordenadora do Projeto de Extensão Ouvidoria Feminina na UFOP. Pesquisadora do Grupo Trabalho e Re-sistências na UFMG.

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Publicado

2021-06-30

Edição

Seção

Seção Especial: Dossiê "Um novo Direito do Trabalho para o mundo de hoje: ampliar a base e expandir a imaginação"