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v. 3 (2019)
Nas últimas duas décadas, a diversidade do campo dos estudos curriculares foi ampliada, especialmente após a incorporação de novas perspectivas conceituais, como as teorias de currículo pós-estruturalistas, multiculturais, fenomenológicas e decoloniais. Muitos são os autores que discutem o conceito de currículo sob diferentes prismas. Enquanto Roberto Sidnei Macedo compreende currículo escolar como “um artefato socioeducacional que se configura nas ações de conceber/selecionar/produzir, organizar, institucionalizar, implementar/dinamizar saberes, conhecimento, atividades, competências e valores visando uma ‘dada’ formação (MACEDO, 2007, p. 24)”; Alice Casimiro Lopes lembra que “o currículo é fruto de uma seleção da cultura e é um campo conflituoso de produção de cultura, de embate entre sujeitos, concepções de conhecimento, formas de entender e construir o mundo” (LOPES, 2004, p. 111). Já José Augusto Pacheco, a partir das reflexões de Garcia e Moreira, defende que “o conhecimento curricular não é de natureza puramente técnica e generalizável, a identidade daí resultante é algo em construção e a sua natureza epistemológica é interdisciplinar, de fronteiras porosas e, inclusive, indefinidas e incertas” (GARCIA;MOREIRA, 2003 apud PACHECO, 2013, p. 449).
Independentemente da abordagem, é inegável a centralidade do currículo nas políticas educacionais no mundo globalizado. Como enfatiza Lopes (2004, p. 110), diversas ações constituem as reformas educacionais como: mudanças em legislações, formas de financiamento, relações entre os poderes oficiais, gestão das escolas, formação profissional – em especial a de professores – e seus dispositivos de controle e os processos de avaliação centrados em resultados.
Nesse sentido, cabem as perguntas: qual é o espaço da autonomia docente na construção do currículo escolar? Como podemos protagonizar mudanças curriculares que efetivamente atendam à realidade dos estudantes da Educação Básica? É possível normatizar algo tão plural quanto o currículo? Em que contextos e de que maneira ele se efetiva?
Sendo assim, convidamos autores a apresentar pesquisas, experiências e reflexões sobre o seu ensinar e aprender à luz das perguntas acima. Nas palavras de Miguel Gonzáles Arroyo, “é urgente recuperar o conhecimento como núcleo fundante do currículo e o direito ao conhecimento como ponto de partida para indagar os currículos” (GONZÁLES ARROYO, 2007, p. 26).
REFERÊNCIAS
GARCIA, R. L.; MOREIRA, A. F. Currículo na contemporaneidade: incertezas e desafios. São Paulo: Cortez Editora, 2003.GONZÁLES ARROYO, Miguel. Indagações sobre currículo: educandos e educadores: seus direitos e o currículo / [Miguel Gonzáles Arroyo]; organização do documento Jeanete Beauchamp, Sandra Denise Pagel, Aricélia Ribeiro do Nascimento. – Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2007.
LOPES, Alice Casimiro. Políticas curriculares: continuidade ou mudança de rumos? In: Revista Brasileira de Educação. Maio /Jun /Jul /Ago 2004 N. 26.
MACEDO, Roberto Sidnei. Currículo: campo, conceito e pesquisa. Petrópolis: Vozes,
2007.PACHECO, José Augusto. Estudos curriculares: desafios teóricos e metodológicos. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v. 21, n. 80, p. 449-472, jul./set. 2013.
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v. 2 (2018)
Temos assistido recentemente a um constante silenciamento de vozes, uma ausência de representatividade nas instâncias de poder, e espaços cada vez menos dialógicos e democráticos de debate no Brasil. Diante disso, as instituições de ensino, espaços primordiais de trocas de saberes, têm sua função social ainda mais evidente na formação de sujeitos críticos, afetivos e que respeitem as diferenças. De ambiente de controle a espaço de construção coletiva, a escola pode desenvolver tanto práticas voltadas para a alteridade quanto privilegiar o caminho inverso, sendo a competitividade seu objetivo maior. Então, qual escola é possível para a desconstrução de desigualdades sociais tão fortemente estabelecidas? De forma específica, qual o papel da escola pública, espaço aberto e comprometido com a sociedade?
Nesse sentido, a presente chamada de contribuições para o segundo número da Revista Perspectivas em Educação Básica do Colégio de aplicação da UFRJ tem como tema a “Função social da escola pública e suas potências.” Em comemoração aos 70 anos do CAp UFRJ, e sua histórica atuação e luta por uma educação e formação docente críticas, o objetivo é repensar as práticas político-pedagógicas que destaquem a importância da escola pública, laica, gratuita e de qualidade.
Pretende-se, nessa edição, realizar a reflexão sobre a construção do conhecimento, entendendo-a como permeada por relações de luta, poder e dominação (FOUCAULT, 2005, p. 23). Assim, possibilidades de uma sociedade mais justa podem ser discutidas quando nos voltamos para os distintos saberes presentes e desenvolvidos na escola e sua potência de atuação um espaço tão diverso e rico. Desse modo, é importante lembrar das famosas palavras de Boaventura Sousa Santos de que “temos o direito de ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza; e temos o direito de ser diferentes quando a nossa igualdade nos descaracteriza. Daí a necessidade de uma igualdade que reconheça as diferenças e de uma diferença que não produza, alimente ou reproduza as desigualdades.” (SANTOS, 2003, p. 56)
No atual cenário de elaboração de leis que ferem a autonomia dos professores em sala e atingem diretamente o ensino público, torna-se premente inserir a escola num contexto onde a prática pedagógica está fortemente atrelada a aspectos políticos e sociais. Portanto, vemos a escola pública como uma “instituição socialmente produzida, em um espaço de luta entre a reprodução das desigualdades sociais e a produção de possibilidades mais democráticas.” (ESTEBAN, 2007, p. 12).
REFERÊNCIAS
ESTEBAN, Maria Teresa. Educação popular: desafio à democratização da escola pública. In: Cad. Cedes, Campinas, vol. 27, n. 71, p. 9-17, jan./abr. 2007. Disponível em http://www.cedes.unicamp.br.
FOUCAULT, Michel. As verdades e as formas jurídicas. Rio de Janeiro: NAU Editora, 2005.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopolitismo multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003: 56.
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v. 1 (2017)
O objetivo deste número é explorar o conceito de experiência no campo pedagógico aplicado à Educação Básica e as conexões, relações e articulações com poéticas e resistências presentes no cotidiano escolar. Num momento em que a educação pública vem sendo seriamente ameaçada, vê-se um enfraquecimento de práticas pedagógicas que valorizam o sujeito na sua complexidade. Faz-se relevante, nesse contexto, pensar o papel da valorização da experiência, da poética e da resistência no ambiente escolar como elementos fundamentais para a formação de sujeitos abertos ao outro, críticos e propositivos frente o contexto em que se vive.
Entendemos, a partir do viés de Larossa (2014), o sujeito da experiência “como um território de passagem, algo como uma superfície sensível que aquilo que acontece afeta de algum modo, produz alguns afetos, inscreve algumas marcas, deixa alguns vestígios, alguns efeitos” (p.25). Assim, o sujeito, ao transpor espaços indeterminados, posta-se à prova, aberto à sua própria transformação e à reflexão em si. Dessa forma, a experiência, seja ela social, cultural, pedagógica ou histórica pode ser vista como a matéria-prima essencial para os processos de formação de identidades, sejam elas de classe, de gênero, de geração ou de etnias. Nesse sentido, discutir tal conceito em sua multiplicidade nos permite também despir-nos de preconceitos sobre variados assuntos na escola.
Aliada à noção de experiência, a pesquisa em educação como poética nasce da relação entre a teoria e a prática, nas mais diversas possibilidades de criação de realidades e caminhos. Como resistência, ainda, a experiência nasce da possibilidade de instituir ou consolidar um projeto de construção de conhecimento coletivo, que compreenda a diversidade de elementos que compõem o ambiente escolar.
Esta edição pretende, portanto, pensar um sujeito da experiência que afeta todo o contexto em que está inserido, criando atos de enunciação e ação que poeticamente encarnem corpos resistentes ao sistema autoritário e opressor que promove desigualdade e diferenciação com seus ideais.
Referências:
Larrosa, Jorge. Tremores: escritos sobre experiência. Belo Horizonte: Autêntica, 2014.